Gestores recorrem a especialistas para prever impacto do vírus
Previsões de estrategistas de mercado para este ano foram destruídas pelo vírus, mesmo antes de todos os efeitos serem refletidos nos dados econômicos
Guilherme Guilherme
Publicado em 26 de fevereiro de 2020 às 09h33.
Acadêmicos da área de saúde, plataformas de monitoramento de número de mortes e até filmes de zumbi: essas não são fontes normais de informação para investidores que tentam avaliar riscos nos mercados. Mas estes não são tempos normais, pois o surto de coronavírus leva a uma busca não convencional de pistas sobre o que esperar de uma epidemia que se espalha rapidamente.
A maioria dos gestores de fundos simplesmente não tem modelos para rastrear o que ameaça se tornar uma pandemia global, levando investidores a recorrer a universidades, órgãos mundiais de saúde e até obras de ficção, ao mesmo tempo em que buscam segurança investindo em portos seguros como títulos de dívida e ouro.
A miríade de possíveis resultados - de uma pandemia global que matará milhões como a gripe espanhola de 1918 a uma recuperação em forma de V se a doença desaparecer - faz com que seguir fontes de dados tradicionais seja muito lento e limitado, deixando muitos estrategistas presos no caminho errado. Em vez disso, fundos recorrem a especialistas, semelhante à maneira como investidores consultaram pesquisadores e consultores políticos antes da tortuosa série de votações do Brexit no Reino Unido.
Painel da morte
Agora, investidores tentam gerenciar riscos e descobrir quanto da queda das ações e rali do títulos é razoável, dada a escalada decasos do vírus. Essa perspectiva já levou o rendimento dos títulos de longo prazo do Tesouro dos EUA para uma mínima histórica, o franco suíço à cotação mais alta desde 2015 em relação ao euro e o preço do ouro para o maior nível em sete anos.
A Unigestion monitora a propagação do vírus com dados do Centro de Ciência e Engenharia de Sistemas da Universidade John Hopkins, que desenvolveu umpainel de controleinterativo que registra os casos por país, total de mortes e taxa de recuperação.
“Acompanhamos de perto a propagação do vírus fora da China, especialmente em países com alta densidade populacional e sistemas de saúde menos desenvolvidos”, afirmou Salman Baig, gestor de recursos da Unigestion. O modelo “Growth Nowcaster” da empresa de investimento não vê grande impacto no crescimento, pelo menos por enquanto.
E eis o X da questão. As previsões de estrategistas de mercado para este ano foram destruídas pelo vírus, mesmo antes de todos os efeitos serem refletidos nos dados econômicos. Na semana passada, o Société Générale enviou nota aos clientes para revisar as projeções para o euro, dizendo que as visões do banco “não tiveram um bom começo de ano”.
As estimativas para o impacto econômico do vírus variam muito. A Oxford Economics calcula que uma crise internacional da saúde pode ser suficiente para eliminar mais de US$ 1 trilhão do PIB global, enquanto o Fundo Monetário Internacional acredita que o vírus diminuirá em apenas 0,1% sua previsão de crescimento global de 3,3% para 2020.
Reação sem precedentes
A escala das tentativas dos governos de conter o vírus, como com bloqueios de cidades e restrições de viagens, é uma “reação extrema” que parece sem precedentes, dificultando a rapidez com que a economia global poderia se recuperar, disse Richard Lacaille, diretor de investimentos da State Street Global Advisors, em entrevista à Bloomberg Television.
Para o gestor de fundos da M&G, Wolfgang Bauer, que é PhD em química pela Universidade de Cambridge, vale a pena ser cauteloso em relação aos modelos adotados até agora, dada a natureza dispersa das informações disponíveis.
“A situação está evoluindo tão rápido que qualquer tentativa de avaliação precisa das implicações mais amplas é quase impossível, pois as margens de erro são muito altas”, disse.