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Um projeto de lei complementar em tramitação na Câmara dos Deputados pretende transformar os créditos que empresas têm em ICMS num “ativo virtual”, que poderia ser vendido pelo contribuinte credor a outro contribuinte devedor, ou até negociados em bolsa. O objetivo principal é reduzir a carga sobre empresas exportadoras, que acumulam créditos em sua cadeia produtiva. Atualmente, mercadorias vendidas ao exterior deveriam ser livres de ICMS no momento da venda. Mas, durante sua produção elas recolhem o imposto, que aumenta quanto mais componentes são utilizados e mais estados da federação estão envolvidos nessa cadeia.
O PLP 50/22 é de autoria do deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA) e está em análise nas comissões antes de ir a plenário. Ele cria o “Programa de Desoneração da Exportação de Bens e Serviços” e altera o artigo 20 da Lei Complementar nº 87/1986 (Lei Kandir).
Pela nova proposta, os créditos tributários em ICMS seriam convertidos pelas secretarias da fazenda em ativos negociáveis no momento do processamento das notas fiscais. Os governos estaduais poderiam condicionar a utilização desses ativos virtuais a contrapartidas concretas, como a instalação de novas empresas, manutenção de empregos e investimentos.
A necessidade de mexer nessa regulação remete a um velho problema: o emaranhado do sistema tributário brasileiro e a lentidão da máquina fiscal em processar a compensação a contribuintes credores.
Para o deputado, isso eleva os custos financeiros de setores produtivos e reduz a competitividade, tornando as mercadorias brasileiras mais de 20% mais caras que as de outros países, conforme sua justificativa no projeto. Perdem principalmente os produtos de maior valor agregado, como veículos, caminhões e material bélico, embora o país tenha elevado a exportação de commodities agrícolas e minerais.
EVOLUÇÃO
Para o tributarista Tarcísio Tamanini, líder de Pesquisa e Desenvolvimento da LacLaw Consultoria Tributária, a aprovação do PLP seria “uma mudança radical e muito moderna que certamente impactaria muito o mercado e aumentaria as negociações de crédito”. Ele lembra que o estado de São Paulo já tem um sistema mais ágil para negociação de créditos, mesmo assim ainda é um processo muito complexo. Por outro lado, grande parte dos estados não facilita e se aproveita dos entraves existentes para inflar sua arrecadação de forma indireta, por meio da retenção dos créditos.
O tributarista da LacLaw deu a seguinte entrevista por email à Esfera Brasil: A legislação atual já permite negociar créditos de ICMS em alguns casos. Como funciona?
TT - É possível negociar créditos de ICMS a depender de suas condições específicas e do estado da federação em que o contribuinte se encontra. Em São Paulo, por exemplo, existe o “Sistema Eletrônico de Gerenciamento do Crédito Acumulado - e-CredAc”. Nele, o fisco estadual homologa os créditos acumulados dos contribuintes paulistas e possibilita que os créditos sejam cedidos a outros contribuintes, para, por exemplo, o pagamento de fornecedores. A homologação desses créditos pelo e-CredAc de São Paulo é bem complexa e costuma ser um processo bastante demorado, principalmente envolvendo montantes altos. Por isso é possível afirmar que não funciona bem.
Qual a principal mudança proposta pelo PLP 50/22?
TT- O PLP 50/22 promete trazer um caminho mais fácil para as transações com créditos acumulados de ICMS na exportação (principal causa para o acúmulo), criando um verdadeiro balcão de negócios de créditos tributários, com a possibilidade, inclusive, de negociação na bolsa de valores. O que acontece hoje com os contribuintes é injusto. Se o projeto de lei passar será um grande avanço.
Os estados podem perder com essa mudança?
TT - Os Estados podem ter menos arrecadação, uma vez que eles ganham criando entraves para os contribuintes que querem dar vazão aos seus créditos.
A mudança proposta pelo PLP aumentaria o volume de créditos em circulação?
TT - O Brasil vem batendo recordes de exportações (principal causa do acúmulo de crédito) a cada ano que passa. A mudança proposta pelo PLP permite que créditos de ICMS sejam convertidos em ativos virtuais depositados diretamente na conta dos contribuintes. E permite a negociação em instituições financeiras para pagar débitos de ICMS no estado em que foi registrado o crédito. É uma mudança radical e muito moderna que certamente impactaria muito o mercado e aumentaria as negociações de crédito.
Há alguma crítica ao PLP 50/22 como ele foi proposto?
TT - O projeto veda que os créditos de ICMS de um Estado sejam utilizados para pagar o débito de outro e isso cria um problema para os estados com economias menores, pois seu mercado de negociação de crédito pode ser menor e, por isso, pouco atrativo para que grandes exportadores fiquem ou se mantenham nele. Acredito que, a exemplo de São Paulo, um grande avanço seria todos os estados terem regulamentações para a cessão de créditos acumulados e, além disso, que se crie, dentro da legislação atual, formas rápidas e eficientes para a homologação desses créditos, independentemente do valor envolvido.