Exame Logo

Visão urbana

A lógica e a consistência do novo Plano Diretor

EXAME.com (EXAME.com)
DR

Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h42.

O articulista Tadeu Masano confessa sua decepção com o que intitula de "miopia urbana" ("Mapa da Mina", EXAME SP número 10), revelada pelo Plano Diretor de São Paulo ora em debate. Por isso, permito-me retomar os temas criticados, buscando melhor explicá-los.

O primeiro deles trata do coeficiente de aproveitamento para construção e do custo do solo urbano. A nova proposta - coeficiente básico igual a 1, que pode chegar a 2,5 em toda a cidade e a 4 dentro dos perímetros de operações urbanas planejadas, desde que se pague por esse acréscimo - baseia-se na seguinte premissa: em todas as cidades do mundo, o setor público deixou de ter recursos financeiros suficientes para atender ao fenômeno da urbanização. No caso de São Paulo, o problema é mais grave, pois os dez anos contemplados pelo plano ocorrem dentro do período de pagamento da dívida herdada. Já que é limitada a possibilidade de aumento de impostos, o que resta fazer? O plano responde: utilizar com consistência e transparência o planejamento, a iniciativa e a legislação urbana alterando os elementos que compõem as planilhas de rentabilidade de empreendimentos imobiliários, mantendo-a sempre viável de modo a não diminuir a atividade da construção civil, importante gerador de empregos. O coeficiente permitido (2,5 ou 4) não está longe do que hoje se pratica. Mas, dada a necessidade de comprar o aumento de potencial construtivo a um valor anual fixo para subir o coeficiente, o empreendedor procurará negociar a compra do terreno a um preço conveniente. Com o tempo, haverá pressão para a diminuição desse preço, que não resulta de um investimento que o tenha valorizado, e sim de simples expectativa do proprietário e da valorização externa que a cidade e os empreendimentos, públicos ou privados, lhe tenham propiciado.

Veja também

Há proprietários que considerarão "direito" o que é apenas "expectativa". Outros teimarão em não reduzir o preço de seu terreno. Também haverá os que enfrentarão o problema real de não poderem, com o montante da venda, adquirir outra moradia. Se o empreendedor não negociar bem, o produto final, em alguns casos, poderá ficar mais caro. Toda mudança de parâmetro acarreta um período de adaptação. O coeficiente em São Paulo já foi no passado reduzido para 6, para 4, para 2. E toda vez que isso ocorria o protesto era o mesmo: assumia-se erroneamente que o preço do solo era fixo e que a construção civil e o mercado seriam fortemente traumatizados. Esse cataclismo nunca aconteceu... Concordo com o articulista sobre a necessidade de reforma tributária e com sua constatação da saída de indústrias de São Paulo. Mas o plano contempla as mutações globais do modo industrial de produzir: a importância do conhecimento e a pequena escala de muitos empreendimentos de alto valor agregado. Dessas mudanças decorre a hipótese de uma nova fase de industrialização na metrópole.

Quando o plano fala na criação de centros de bairro na periferia carente, trata-se por vezes da mera colocação concentrada de serviços públicos locais ao lado de um ponto de embarque e de uma praça que enseje o encontro informal, induzindo as empresas privadas a se aproveitar da concentração de pessoas. É daí que surgirão as padarias, as bancas de jornais, a agência bancária, o escritório de corretagem, a sede da associação de moradores etc. Finalmente, o articulista expõe, com razão, a importância do chamado anel intermediário de São Paulo, dotado de infra-estrutura e com capacidade ociosa. Talvez ele não tenha percebido que o plano corresponde precisamente a uma série de operações: Diagonal Sul, Centro, Água Branca, Diagonal Norte - reocupando da divisa com São Caetano até Mooca, vale do Tamanduateí, Brás, Centro, Barra Funda e Pirituba.

Em outros termos: o novo Plano Diretor, ora em debate, não se limita a aspectos pontuais e possui uma consistência interna que talvez não tenha ainda sido suficientemente percebida. Nada a ver, portanto, com o título "miopia urbana" que encabeçou a crítica...

Acompanhe tudo sobre:[]

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Economia

Mais na Exame