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Reforma econômica na China pode prejudicar exportador

Haverá redução dos grandes investimentos estatais em projetos de infraestrutura, limitando a expansão da demanda do país por metais industriais

Fábrica da Votorantim Metais: a transição pode prejudicar gradualmente grandes exportadores de metais, como o Brasil (Divulgação)
DR

Da Redação

Publicado em 24 de dezembro de 2013 às 09h32.

São Paulo - As reformas econômicas propostas este ano pela nova liderança chinesa podem levar à redução dos grandes investimentos estatais na indústria pesada e em projetos de infraestrutura, limitando, assim, a expansão da demanda do país por metais industriais. Como resultado, essa transição pode prejudicar gradualmente grandes exportadores de metais, como o Brasil.

Contudo, outras diretrizes anunciadas pelas autoridades da China podem criar novas oportunidades e conter o impacto negativo sobre as economias emergentes.

Sob o comando do presidente Xi Jinping e do primeiro-ministro Li Keqiang, que assumiram o poder em março de 2013, o Partido Comunista da China anunciou que o consumo interno deverá se tornar uma prioridade no país e que o mercado terá um papel maior na alocação de recursos. Essa mudança no atual modelo econômico chinês visa dar mais equilíbrio ao crescimento do país.

Para o especialista em China da consultoria Capital Economics, Qinwei Wang, as reformas têm por objetivo transferir os investimentos chineses da indústria pesada para programas que estimulem o consumo das famílias.

"Se as reformas forem bem sucedidas, os recursos serão canalizados de empresas estatais e da indústria pesada para o setor de serviços. Isso também significa que parte da receita será transferida do governo e das pessoas mais ricas para famílias comuns", afirmou.

Com isso, a China deverá apresentar uma demanda maior por produtos manufaturados de uso diário e uma necessidade menor de commodities industriais. Ao permitir mais participação do setor privado na economia, os fundamentos de oferta e demanda deverão ganhar força na alocação de recursos e, consequentemente, haverá um peso menor dos investimentos governamentais que muitas vezes beneficiam alguns setores vistos como estratégicos, como energia e infraestrutura.


Mesmo se os gastos públicos chineses no setor industrial permanecerem altos, "uma expansão mais lenta dos investimentos significará um desafio para os produtores de commodities industriais, devido ao impacto no volume de exportações para a China e nos preços", afirmou Qinwei.

Os países que direcionaram as receitas das commodities para investimentos produtivos devem ter mais facilidade em se adaptar a esse processo, mas economias que usaram os ganhos para aumentar o consumo, como o Brasil, poderão sofrer mais com as mudanças.

Nos onze meses de 2013 (até novembro), a China foi o maior destino nacional - excluindo blocos econômicos como a União Europeia - das exportações brasileiras, respondendo por cerca de 19% do total de embarques saídos do Brasil.

Além disso, no mesmo período, as commodities industriais somaram aproximadamente 35% dos produtos brasileiros comprados pelos chineses. Vê-se, com isso, a importância de se observar os potenciais efeitos das reformas chinesas sobre o Brasil.

Para o presidente do FTI Consulting Brasil, Eduardo Sampaio, a possível desaceleração das compras de commodities pela China não é alarmante, mas é necessária uma atuação mais incisiva do governo brasileiro durante esta transição.

Segundo o executivo, as autoridades nacionais poderiam buscar parcerias e acordos bilaterais com os chineses para ajudar o empresariado brasileiro a ganhar espaço na China. Sampaio destaca que as companhias do Brasil encontram grande dificuldade para iniciar negócios ou para vender produtos em território chinês e defende uma atuação mais firme de Brasília.


Efeitos limitados

Apesar da perspectiva negativa para as economias emergentes, as reformas chinesas deverão ser aplicadas de maneira gradual, o que poderá conter o efeito no mercado de commodities industriais.

De acordo com um comunicado divulgado após a Terceira Sessão Plenária do Partido Comunista, em novembro, os líderes do país disseram que os resultados das reformas deverão ser conquistados até 2020 - embora não tenham anunciado prazos intermediários ou mais detalhados sobre as metas.

Mais um sinal de que os impactos negativos das reformas sobre outros países pode ser limitado é que a transição do modelo de crescimento chinês deve evitar um "pouso forçado" da economia local, permitindo, assim, que o país se mantenha como um grande motor da recuperação global.

"As reformas mais gerais devem fortalecer o papel do país no comércio mundial, pois geram mais confiança nos investidores e mostram que há uma preocupação na China de que é preciso se enquadrar na nova realidade", afirmou o professor Oliver Stuenkel, do Centro de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Se as reformas forem bem sucedidas, Stuenkel explica que a China permanecerá como uma economia líder global e sustentará o crescimento de outros países, como o Brasil.

Além disso, parte das diretrizes apresentadas pela liderança chinesa também deve ajudar a amenizar o efeito ruim para as relações comerciais com o Brasil e pode até abrir novas oportunidades. De acordo com o Partido Comunista, a China concederá mais liberdade para o câmbio e para as taxas de juros no país.


Essas reformas podem gerar uma valorização do yuan e uma transparência maior na condução da economia chinesa. O yuan opera sob rígido controle de Pequim, que determina diariamente uma taxa de referência frente a outras moedas e permite que a divisa chinesa varie até 1% acima ou abaixo da cotação oficial.

Devido a essa influência, uma das principais reclamações da comunidade internacional é que a China mantém o yuan desvalorizado para facilitar a exportação de seus produtos, prejudicando os concorrentes.

Para o economista do Itaú Unibanco em Londres, Guilherme Martins, a liberalização do câmbio e uma possível valorização do yuan diminuem a preocupação que o Brasil tem em competir com a China no mercado doméstico ou na América Latina, por exemplo.

"De maneira geral, isso é positivo para o mundo todo, não só para o Brasil, pois acaba permitindo uma competição mais saudável frente às empresas chinesas", afirmou.

A reforma no câmbio, assim como uma possível liberalização das taxas de juros, também deve dar mais previsibilidade e transparência às relações comerciais chinesas, gerando novas oportunidades.

Segundo o professor Stuenkel, as medidas poderão aproximar a flutuação da moeda e dos juros aos fundamentos de mercado, oferecendo mais confiança aos investidores internacionais.

Apesar da provável desaceleração da demanda por commodities industriais e de uma possível perda de ritmo no crescimento chinês, Stuenkel acredita que o mundo deve apoiar as reformas. "O processo de recuperação global depende da China", destacou.

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São Paulo - As reformas econômicas propostas este ano pela nova liderança chinesa podem levar à redução dos grandes investimentos estatais na indústria pesada e em projetos de infraestrutura, limitando, assim, a expansão da demanda do país por metais industriais. Como resultado, essa transição pode prejudicar gradualmente grandes exportadores de metais, como o Brasil.

Contudo, outras diretrizes anunciadas pelas autoridades da China podem criar novas oportunidades e conter o impacto negativo sobre as economias emergentes.

Sob o comando do presidente Xi Jinping e do primeiro-ministro Li Keqiang, que assumiram o poder em março de 2013, o Partido Comunista da China anunciou que o consumo interno deverá se tornar uma prioridade no país e que o mercado terá um papel maior na alocação de recursos. Essa mudança no atual modelo econômico chinês visa dar mais equilíbrio ao crescimento do país.

Para o especialista em China da consultoria Capital Economics, Qinwei Wang, as reformas têm por objetivo transferir os investimentos chineses da indústria pesada para programas que estimulem o consumo das famílias.

"Se as reformas forem bem sucedidas, os recursos serão canalizados de empresas estatais e da indústria pesada para o setor de serviços. Isso também significa que parte da receita será transferida do governo e das pessoas mais ricas para famílias comuns", afirmou.

Com isso, a China deverá apresentar uma demanda maior por produtos manufaturados de uso diário e uma necessidade menor de commodities industriais. Ao permitir mais participação do setor privado na economia, os fundamentos de oferta e demanda deverão ganhar força na alocação de recursos e, consequentemente, haverá um peso menor dos investimentos governamentais que muitas vezes beneficiam alguns setores vistos como estratégicos, como energia e infraestrutura.


Mesmo se os gastos públicos chineses no setor industrial permanecerem altos, "uma expansão mais lenta dos investimentos significará um desafio para os produtores de commodities industriais, devido ao impacto no volume de exportações para a China e nos preços", afirmou Qinwei.

Os países que direcionaram as receitas das commodities para investimentos produtivos devem ter mais facilidade em se adaptar a esse processo, mas economias que usaram os ganhos para aumentar o consumo, como o Brasil, poderão sofrer mais com as mudanças.

Nos onze meses de 2013 (até novembro), a China foi o maior destino nacional - excluindo blocos econômicos como a União Europeia - das exportações brasileiras, respondendo por cerca de 19% do total de embarques saídos do Brasil.

Além disso, no mesmo período, as commodities industriais somaram aproximadamente 35% dos produtos brasileiros comprados pelos chineses. Vê-se, com isso, a importância de se observar os potenciais efeitos das reformas chinesas sobre o Brasil.

Para o presidente do FTI Consulting Brasil, Eduardo Sampaio, a possível desaceleração das compras de commodities pela China não é alarmante, mas é necessária uma atuação mais incisiva do governo brasileiro durante esta transição.

Segundo o executivo, as autoridades nacionais poderiam buscar parcerias e acordos bilaterais com os chineses para ajudar o empresariado brasileiro a ganhar espaço na China. Sampaio destaca que as companhias do Brasil encontram grande dificuldade para iniciar negócios ou para vender produtos em território chinês e defende uma atuação mais firme de Brasília.


Efeitos limitados

Apesar da perspectiva negativa para as economias emergentes, as reformas chinesas deverão ser aplicadas de maneira gradual, o que poderá conter o efeito no mercado de commodities industriais.

De acordo com um comunicado divulgado após a Terceira Sessão Plenária do Partido Comunista, em novembro, os líderes do país disseram que os resultados das reformas deverão ser conquistados até 2020 - embora não tenham anunciado prazos intermediários ou mais detalhados sobre as metas.

Mais um sinal de que os impactos negativos das reformas sobre outros países pode ser limitado é que a transição do modelo de crescimento chinês deve evitar um "pouso forçado" da economia local, permitindo, assim, que o país se mantenha como um grande motor da recuperação global.

"As reformas mais gerais devem fortalecer o papel do país no comércio mundial, pois geram mais confiança nos investidores e mostram que há uma preocupação na China de que é preciso se enquadrar na nova realidade", afirmou o professor Oliver Stuenkel, do Centro de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Se as reformas forem bem sucedidas, Stuenkel explica que a China permanecerá como uma economia líder global e sustentará o crescimento de outros países, como o Brasil.

Além disso, parte das diretrizes apresentadas pela liderança chinesa também deve ajudar a amenizar o efeito ruim para as relações comerciais com o Brasil e pode até abrir novas oportunidades. De acordo com o Partido Comunista, a China concederá mais liberdade para o câmbio e para as taxas de juros no país.


Essas reformas podem gerar uma valorização do yuan e uma transparência maior na condução da economia chinesa. O yuan opera sob rígido controle de Pequim, que determina diariamente uma taxa de referência frente a outras moedas e permite que a divisa chinesa varie até 1% acima ou abaixo da cotação oficial.

Devido a essa influência, uma das principais reclamações da comunidade internacional é que a China mantém o yuan desvalorizado para facilitar a exportação de seus produtos, prejudicando os concorrentes.

Para o economista do Itaú Unibanco em Londres, Guilherme Martins, a liberalização do câmbio e uma possível valorização do yuan diminuem a preocupação que o Brasil tem em competir com a China no mercado doméstico ou na América Latina, por exemplo.

"De maneira geral, isso é positivo para o mundo todo, não só para o Brasil, pois acaba permitindo uma competição mais saudável frente às empresas chinesas", afirmou.

A reforma no câmbio, assim como uma possível liberalização das taxas de juros, também deve dar mais previsibilidade e transparência às relações comerciais chinesas, gerando novas oportunidades.

Segundo o professor Stuenkel, as medidas poderão aproximar a flutuação da moeda e dos juros aos fundamentos de mercado, oferecendo mais confiança aos investidores internacionais.

Apesar da provável desaceleração da demanda por commodities industriais e de uma possível perda de ritmo no crescimento chinês, Stuenkel acredita que o mundo deve apoiar as reformas. "O processo de recuperação global depende da China", destacou.

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