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Por que os países não medem o PIB do mesmo jeito?

Revisão metodológica do IBGE mostra que a forma de medir o PIB não pode ficar parada no tempo - e atualizações tem o poder de mudar os números radicalmente

Indústria: metalúrgica na Alemanha: cada país escolhe o que vai monitorar (Peter Andrews/Reuters)

João Pedro Caleiro

Publicado em 8 de maio de 2014 às 14h03.

São Paulo – Há alguns meses, o IBGE mudou a forma de medir o desempenho do setor de serviços no Brasil – o que fez o crescimento do PIB de 2012 ser revisado de 0,9% para 1%.

Nesta quinta, o órgão divulgou os resultados da indústria de acordo com uma nova metodologia que aumentou o número de fábricas monitoradas de 3,7 mil para 7,8 mil e o de produtos de 830 para 944.

No próximo dia 30, saberemos se a aplicação retroativa dos novos critérios vai revisar para cima ou para baixo o crescimento de 2013.

O que pode parecer mágica contábil é na verdade um processo necessário. Não existe uma forma única (ou completa) de medir “o valor total dos bens e serviços produzidos por uma economia específica em um determinado período de tempo”.

Diferenças

Economistas tem desenvolvido técnicas para medir a renda total da sociedade desde o final do século XVI, mas o processo só ficou minimamente confiável no começo do século passado.

Na década de 40, o economista (e futuro vencedor do Nobel) Richard Stone formulou os métodos que seriam adotados como referência internacional. O Sistema de Contas Nacionais das Nações Unidas foi lançado em 1953 pelo Fundo Monetário Internacional ( FMI ) e tem sido atualizado periodicamente desde então.

A rigor, as categorias são as mesmas para todo mundo: agropecuária, indústria, serviços, formação bruta de capital fixo (investimento), consumo das famílias, consumo dos governos e exportação menos importação. A diferença é como os dados são coletados:

“Você tem a ótica da demanda, da oferta e da renda. Na medida que seus instrumentos são melhores sobre uma ótica ou outra, é isso que o pais adota”, diz Otto Nogami, professor de Economia do Insper.

E como não dá para monitorar tudo, muda a seleção do que é escolhido e o peso de cada item: “com o tempo, os produtos se modificam e outros passam a ter mais ou menos representatividade dentro da atividade econômica. Um carro, por exemplo, é mais significativo no cálculo brasileiro, porque aqui a demanda por ele é maior do que em outros países. Por isso que um instrumento como a PNAD Contínua, por exemplo, é tão importante: ela permite entender o real consumo das famílias”.

Em alguns casos, a mudança metodológica faz toda a diferença. A Nigéria , que não revia seus critérios desde 1990, passou recentemente a monitorar mais indústrias e dar mais peso para setores como o de comunicações e entretenimento, além de reconhecer que tem uma vibrante economia informal.

O resultado: o PIB se revelou 89% maior do que na estimativa anterior e firmou o país como maior economia do continente africano, na frente da África do Sul.


Outras diferenças são mais sutis: “se você tem muito investimento de curto prazo – como em tecnologia de informação – o produto final é superestimado se você incluir esta despesa como investimento (como tendem a fazer os americanos) e subestimado se você a incluir como gasto (como tendem a fazer os europeus)”, diz o economista John Kay.

Obstáculos

O que o PIB não leva em conta também é importante. A depreciação (perda de valor que máquinas e outros ativos sofrem com o tempo), por exemplo, é ignorada.

Autores já apontam que a dificuldade de medir o valor de bens digitais e a profusão de serviços gratuitos estão aumentando a defasagem entre o que acontece na economia e o que está sendo monitorado pelo PIB:

“A janela entre o que nós medimos e o que nós damos valor cresce toda vez que ganhamos acesso a um novo bem ou serviço que nunca existiu antes, ou quando bens existentes se tornam gratuitos – como frequentemente acontece quando são digitalizados”, escrevem Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee no livro “The Second Machine Age”.

Há também a questão que nem tudo que tem valor para a sociedade pode ser medido em termos econômicos. O PIB não leva em conta, por exemplo, o trabalho não remunerado realizado dentro das residências.

A outra crítica é que o PIB pode até medir a atividade econômica, mas não o desenvolvimento. Voltando ao exemplo do carro: sua fabricação entra no cálculo ao mesmo tempo que a poluição e o trânsito causadas pelo seu uso são ignoradas. Recentemente, algumas iniciativas surgiram para criar métricas mais equilibradas - um exemplo disso é o Índice de Progresso Social de Michael Porter.

Como disse Robert Kennedy, ex-ministro da Justiça nos Estados Unidos, “o PIB não mede a beleza de nossa poesia ou a inteligência do nosso debate público. Não mede nossa inteligência nem nossa coragem, nem nossa sabedoria nem nosso aprendizado, nem nossa compaixão ou devoção. Ela mede tudo, em resumo, exceto o que faz a vida valer a pena”.

É verdade - mas como os países ainda preferem ser ricos do que pobres, o PIB é uma medida que não deve perder importância tão cedo.

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Nesta quinta, o órgão divulgou os resultados da indústria de acordo com uma nova metodologia que aumentou o número de fábricas monitoradas de 3,7 mil para 7,8 mil e o de produtos de 830 para 944.

No próximo dia 30, saberemos se a aplicação retroativa dos novos critérios vai revisar para cima ou para baixo o crescimento de 2013.

O que pode parecer mágica contábil é na verdade um processo necessário. Não existe uma forma única (ou completa) de medir “o valor total dos bens e serviços produzidos por uma economia específica em um determinado período de tempo”.

Diferenças

Economistas tem desenvolvido técnicas para medir a renda total da sociedade desde o final do século XVI, mas o processo só ficou minimamente confiável no começo do século passado.

Na década de 40, o economista (e futuro vencedor do Nobel) Richard Stone formulou os métodos que seriam adotados como referência internacional. O Sistema de Contas Nacionais das Nações Unidas foi lançado em 1953 pelo Fundo Monetário Internacional ( FMI ) e tem sido atualizado periodicamente desde então.

A rigor, as categorias são as mesmas para todo mundo: agropecuária, indústria, serviços, formação bruta de capital fixo (investimento), consumo das famílias, consumo dos governos e exportação menos importação. A diferença é como os dados são coletados:

“Você tem a ótica da demanda, da oferta e da renda. Na medida que seus instrumentos são melhores sobre uma ótica ou outra, é isso que o pais adota”, diz Otto Nogami, professor de Economia do Insper.

E como não dá para monitorar tudo, muda a seleção do que é escolhido e o peso de cada item: “com o tempo, os produtos se modificam e outros passam a ter mais ou menos representatividade dentro da atividade econômica. Um carro, por exemplo, é mais significativo no cálculo brasileiro, porque aqui a demanda por ele é maior do que em outros países. Por isso que um instrumento como a PNAD Contínua, por exemplo, é tão importante: ela permite entender o real consumo das famílias”.

Em alguns casos, a mudança metodológica faz toda a diferença. A Nigéria , que não revia seus critérios desde 1990, passou recentemente a monitorar mais indústrias e dar mais peso para setores como o de comunicações e entretenimento, além de reconhecer que tem uma vibrante economia informal.

O resultado: o PIB se revelou 89% maior do que na estimativa anterior e firmou o país como maior economia do continente africano, na frente da África do Sul.


Outras diferenças são mais sutis: “se você tem muito investimento de curto prazo – como em tecnologia de informação – o produto final é superestimado se você incluir esta despesa como investimento (como tendem a fazer os americanos) e subestimado se você a incluir como gasto (como tendem a fazer os europeus)”, diz o economista John Kay.

Obstáculos

O que o PIB não leva em conta também é importante. A depreciação (perda de valor que máquinas e outros ativos sofrem com o tempo), por exemplo, é ignorada.

Autores já apontam que a dificuldade de medir o valor de bens digitais e a profusão de serviços gratuitos estão aumentando a defasagem entre o que acontece na economia e o que está sendo monitorado pelo PIB:

“A janela entre o que nós medimos e o que nós damos valor cresce toda vez que ganhamos acesso a um novo bem ou serviço que nunca existiu antes, ou quando bens existentes se tornam gratuitos – como frequentemente acontece quando são digitalizados”, escrevem Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee no livro “The Second Machine Age”.

Há também a questão que nem tudo que tem valor para a sociedade pode ser medido em termos econômicos. O PIB não leva em conta, por exemplo, o trabalho não remunerado realizado dentro das residências.

A outra crítica é que o PIB pode até medir a atividade econômica, mas não o desenvolvimento. Voltando ao exemplo do carro: sua fabricação entra no cálculo ao mesmo tempo que a poluição e o trânsito causadas pelo seu uso são ignoradas. Recentemente, algumas iniciativas surgiram para criar métricas mais equilibradas - um exemplo disso é o Índice de Progresso Social de Michael Porter.

Como disse Robert Kennedy, ex-ministro da Justiça nos Estados Unidos, “o PIB não mede a beleza de nossa poesia ou a inteligência do nosso debate público. Não mede nossa inteligência nem nossa coragem, nem nossa sabedoria nem nosso aprendizado, nem nossa compaixão ou devoção. Ela mede tudo, em resumo, exceto o que faz a vida valer a pena”.

É verdade - mas como os países ainda preferem ser ricos do que pobres, o PIB é uma medida que não deve perder importância tão cedo.

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