Pastore: "(...) se não tivermos uma mudança de governo, para resolver a governabilidade, não saímos desse problema" (ARQUIVO/VEJA)
Da Redação
Publicado em 6 de dezembro de 2015 às 09h52.
São Paulo -- A economia brasileira registrará uma contração de 3,7% a 4,0% em 2015 e, no ano seguinte, o Produto Interno Bruto (PIB) deve perder entre 2,5% e 3,5%, afirmou Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central e sócio da A.C.Pastore & Associados. O economista disse que o PIB deve ter retração novamente no quarto trimestre deste ano e, depois, ao menos mais dois trimestres em baixa. "Quando isso tiver terminado, as pessoas vão descobrir que essa foi a maior recessão da história do País e mais profunda que a de 2008", acrescentou.
"Estamos numa crise profunda de natureza dupla: econômica, que tem componente fiscal gigantesco, e política, na qual foi perdida a condição de governabilidade", disse o economista em evento do Fiabci-Brasil e do Secovi-SP. "O governo não tem vontade de fazer as reformas, talvez por inclinação ideológica, e foi perdendo o suporte político para conduzi-las. Isso deixa uma perspectiva de crescimento muito ruim", afirmou.
O economista apontou que a recessão começou no segundo trimestre de 2014, quase um ano antes de o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, começar o atual ajuste fiscal. "A recessão brasileira não é causada pelo ajuste fiscal, ela tem causas anteriores", afirmou o economista. Entre os motivos para a situação atual, Pastore citou o enfraquecimento da confiança e o aumento da sensação de risco, com consequente alta de juros pelos bancos e restrição de investimentos nas empresas.
De acordo com dados publicados pelo Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB brasileiro recuou 1,7% no terceiro trimestre em relação ao segundo trimestre deste ano. Na comparação com o terceiro trimestre de 2014, o PIB recuou 4,5%.
O economista disse que a crise econômica atual é derivada, em parte, do fator externo, como o fim do boom das commodities, embora o grande motivo das dificuldades atuais sejam internas. "A crise que temos hoje no Brasil é interna, mas há também um componente externo: o fim a bonança. Vivemos alguns anos com preços de commodities em alta, favorecendo fartamente o crescimento do Brasil. Mas esse período se esgotou", disse, repetindo declarações recentes de Levy. "Os preços das commodities estão caindo e não temos mais esse impulso externo", completou.
Para o Affonso Celso Pastore, o desequilíbrio fiscal, com crescimento da dívida pública, é a principal fonte da crise atual. Ao citar as chamadas pedaladas fiscais, o economista disse que as manobras do governo para "tentar fazer o PIB crescer a fórceps" fizeram com que a dívida bruta tivesse forte elevação.
Diante desse problema, o economista apontou que o governo tem buscado, com recessão e queda da receita tributária, encontrar receita não recorrente, como a repatriação de recursos de brasileiros no exterior não declarados ao Fisco. Outro esforço do governo, lembrado pelo economista é a tentativa de recriar a CPMF. No entanto, por causa da falta de apoio político, o ex-presidente do Banco Central mostrou ceticismo com a aprovação da medida.
"Daqui para frente, ou corta-se gastos e aplicam-se reformas, ou não tem como conseguir equilíbrio" das contas públicas, disse o economista. "Tivemos cortes de gastos neste ano concentrados inteiramente em investimentos públicos. Mas não é possível cortar INSS", ponderou, ao criticar as regras da previdência. "Não deveria ter um salário mínimo indexado do jeito que há no Brasil", acrescentou.
"É preciso aplicar reformas, que requerem vontade de fazer e apoio político. O governo não tem nenhum dos dois", disse. "Com isso, o risco de insolvência do governo cresce", elevando o Credit Default Swap (CDS), que já se afastou do México, que tem grau de investimento, afirmou ao apontar que esta espécie de seguro contra calote já está em cerca de 450 pontos.
Para o economista, o governo teria de mudar o regime de política econômica e realizar reformas que alterem "radicalmente" o regime fiscal, como na previdência, nos salários e no ICMS. "Teria de fazer uma abertura da economia para o setor externo e criar regras que reduzem risco de investimento em infraestrutura, cujo financiamento só pode ser feito pelo setor privado, porque o governo não tem mais dinheiro", disse. Além disso, seria preciso abandonar a ideia de que a fonte de crescimento vem de gastos públicos e que "tudo se resolve com expansão de crédito".
"A crise econômica está se agravando porque a crise política minou a governabilidade", afirmou o economista, ao indicar que a disputa com o Congresso tem travado as tentativas de reforma. "O problema fiscal continua se agravando e daqui a pouco o Brasil perde o grau de investimento", acrescentou. Para ele, não é difícil pensar em um governo transitório, frente às dificuldades atuais, pois com a piora da economia há também uma deterioração da situação do governo, abrindo caminho para pressão de impedimento da presidente Dilma Roussef.
"Se vai ter impeachment ou não, eu não sei. Mas se não tivermos uma mudança de governo, para resolver a governabilidade, não saímos desse problema", disse.