HENRIQUE MEIRELLES: a pressão em 2003 era ainda maior / Aline Lata / Veja
Da Redação
Publicado em 6 de dezembro de 2016 às 14h49.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h05.
Lucas Amorim e Giuliano Guandalini
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tem sido cada vez mais pressionado para implementar medidas que consigam reabilitar a economia. Nesta terça-feira, sua equipe apresentou um projeto considerado essencial para o equilíbrio financeiro do governo no longo prazo: a reforma da previdência. Mas e as medidas de efeito imediato, capazes de dar tranquilidade ao governo e aos empresários? O governo não está sendo muito tímido em sua atuação? E como lidar com as críticas crescentes, que pedem inclusive sua saída? Sobre esses assuntos, Meirelles concedeu a seguinte entrevista.
Os últimos dados sobre a economia brasileira frustraram um pouco as expectativas de uma retomada mais acelerada neste final de ano. Ao que o senhor atribui essa frustração das expectativas?
O que houve foi uma avaliação da maioria dos analistas que não levou em conta o tamanho e a profundidade da crise pela qual está passando e de certa maneira começa a sair a economia brasileira. O Brasil teve uma crise que começou em final de 2014 e que apenas começou a ser combatida no meio de 2016. Uma crise que tem essa duração e esta profundidade deve ser a maior crise da história do Brasil. O PIB deve cair numa dimensão maior do que a depressão de 1929-1930. Quando a crise atinge profundamente o crédito, como é o caso do Brasil, ela demanda muito mais tempo de recuperação, e isso não foi avaliado em um primeiro momento. Agora está sendo. A boa notícia é que essas questões todas estão sendo equacionadas, o processo de eliminação das causas dos problemas da economia brasileira, que são essencialmente questões fiscais, estão sendo enfrentados e resolvidos de uma maneira muito forte e até agora bem sucedida. Portanto, nós esperamos que esse processo tenha o seu curso natural e a recuperação vai ocorrer.
O senhor mencionou a questão do endividamento das famílias e das empresas. O governo tem sido criticado por tratar apenas questões de médio e longo prazo, e não apresentar como também apresentar medidas paralelas no sentido de que as empresas possam diminuir mais rapidamente o seu endividamento. Existe algo em estudo?
Existe sim uma série de medidas que estão sendo estudadas e que serão anunciadas, mas precisa se levar em conta uma questão: o custo do crédito é em função, em última análise, da política monetária, e do nível de risco do país. O nível de risco está caindo, e a aprovação dessas medidas já dá uma confiança muito grande que faça com que o risco do país caia. O componente estrutural da taxa de juros vai cair, facilitando a vinda das empresas. Além do mais, tem uma questão de política monetária do Banco Central: o BC está olhando a inflação e a expectativa de inflação. O Banco Central adotou a opção de aguardar isso, para aí sim fazer uma distensão da política monetária, isto é, cortar os juros de uma forma mais forte. Existem mudanças que são mais rápidas, existem mudanças que demandam mais tempo.
Como o governo vai fazer para lançar medida anticíclicas sem cair nos mesmos erros do governo anterior que nos trouxeram aqui?
Exatamente, por isso estamos fazendo todos esses estudos com tranquilidade, e com seriedade, exatamente para não incorrer nos mesmos erros. Não pode ser algo que em última análise o governo paga a conta, o governo pagando a conta aumenta mais o déficit. Nós temos um déficit de 170 bilhões de reais. É muito dinheiro em qualquer lugar do mundo, e precisamos levar isso em conta. Nós não podemos aumentar esse déficit, que foi o problema anterior, exatamente como você disse. Por isso, os movimentos têm que ser sérios e com precisão. Esse artificialismo, que no fundo é uma cortina de fumaça e não resolve o problema, não será adotado por esse governo.
O senhor entrou pra atacar grandes propostas, falava em duas, três grandes medidas. Agora, tem que atuar mais no varejo. É uma mudança de expectativa?
Não, são questões complementares. As grandes medidas estão sendo adotadas. Não só na sua votação final, no último turno do Senado, mas também ontem foi apresentada uma proposta da maior importância, que é a reforma da Previdência, que modifica o panorama das contas públicas brasileiras pelas próximas décadas.
Modifica como? O senhor pode dar uma dimensão da situação hoje e como a sociedade ganharia?
Só o crescimento do déficit da previdência exigiria um aumento de contribuições de cerca de 10% do PIB, e isso é inviável. O Brasil já tem a maior tributação da América Latina. Em resumo, é uma situação absolutamente insustentável. E isso está sendo enfrentado. Na década de 1960, foi fixada a idade mínima pra aposentadoria, que era de 55 anos. A idade média de aposentadoria hoje no Brasil é 54. Houve um crescimento da expectativa de vida enorme da população brasileira. O que é uma notícia excelente, mas alguém tem que pagar por isso. Alguém pode dizer que isso é um problema de longo prazo. Não, não. Por que? Porque a economia e os mercados antecipam isso, e reagem imediatamente ao problema. Essa foi a causa da crise, isto é, todos projetaram e viram que a subida da dívida pública seria insustentável.
Essa medida vai passar pelo Congresso ainda. Qual projeto final o senhor consideraria uma vitória?
Acredito que os pontos fundamentais têm de ser mantidos. Tem de ter a idade mínima, de 65 anos, que é um período bastante justo, razoável pra economia brasileira. Um período de transição, que aí nós estamos propondo que comece para homens aos 50 anos e para mulheres aos 45. Significando que o homem que tiver mais de 50 anos entra no período de transição, ou seja, vai trabalhar 50% a mais de tempo do que ele tinha a expectativa de trabalhar pela lei de hoje. Antes disso, mais jovens, entrariam na nova lei. Em resumo, a mensagem é a seguinte: mais importante do que a idade em que alguém se aposenta é que todos os cidadãos e cidadãs brasileiras tenham certeza de que vão receber a aposentadoria.
O senhor vem recebendo algumas críticas, inclusive de aliados, e o senhor já sofreu também com o fogo amigo quando era presidente do Banco Central no governo Lula. Como o senhor compara esses dois períodos, e ao que o senhor atribui esses ataques ao seu trabalho?
As mesmas razões daquela época. Quando você chega e começa a botar a casa em ordem, pessoas que estão acostumadas a uma situação desarranjada se ressentem. Naquela época, acredito que as críticas e os ataques foram inclusive foram mais pesados. Agora, na minha persistência, naquela época a economia foi estabilizada, o Brasil cresceu por um longo tempo, criou empregos, a classe média dobrou no país. Tenho convicção de que vai ser a mesma coisa. Encaro isso com naturalidade, faz parte, todos estão ansiosos para que o problema seja resolvido.
Sendo realista, a percepção para o brasileiro de uma recuperação, em meados do ano que vem…
Virá durante o ano de 2017. Agora, note bem: alguns falam “ah o crescimento em 2017 vai ser baixo, vai ser pouco acima de zero, ou meio etc.”. É importante se esclarecer o seguinte, as comparações média com média às vezes enganam. Contando de ponta a ponta, do começo do ano ao final do ano, o crescimento vai ser forte e o brasileiro vai sentir bastante a diferença.