Luzes de Natal contam a história das complicações da guerra comercial
Fornecedores chineses encontram maneiras de burlar a etiqueta “Made in China", e o Vietnã é um dos que saem ganhando com este movimento
João Pedro Caleiro
Publicado em 26 de dezembro de 2019 às 16h59.
Última atualização em 26 de dezembro de 2019 às 17h00.
Nas salas de estar de várias residências espalhadas pelo mundo, as luzes de Natal deste ano contaram uma história complicada da guerra comercial que atinge até o Vietnã.
Durante muitos anos, as luzes de Natal eram fabricadas quase exclusivamente na China, mas o aumento das tarifas dos EUA sobre mercadorias chinesas levou muitos a comprarem esses produtos em outros lugares.
Um claro vencedor dessa guerra foi o Vietnã: as remessas marítimas de luzes de Natal do país para os EUA mais do que duplicaram nos primeiros 10 meses do ano em relação ao mesmo período de 2018, de acordo com dados alfandegários do governo norte-americano. Ao mesmo tempo, as importações dos EUA de luzes da China caíram 49% no período.
Uma análise mais profunda dos dados e conversas com empresas e especialistas em comércio revelam uma história complexa.
As luzes de Natal seguem um padrão que está se tornando comum nas listas de tarifas dos EUA: fornecedores chineses têm encontrado maneiras de burlar a etiqueta “Made in China” para evitar multas, usando países vizinhos como o Vietnã para transportar mercadorias para outros países, etiquetá-las novamente e enviá-las para os EUA.
Não há dúvidas de que o Vietnã está atraindo investimentos estrangeiros legítimos e fábricas - e estava indo muito bem antes de o presidente dos EUA, Donald Trump, começar a interferir nas cadeias de suprimentos globais. No entanto, a guerra comercial aumentou o risco de tráfico ilegal de mercadorias, colocando o Vietnã sob os holofotes.
Os chineses “são muito bons em produzir baixo valor e volumes altos com uma certa habilidade que não pode ser facilmente transferida ou replicada”, disse Deborah Elms, presidente do Centro de Comércio Asiático, em Cingapura.
As empresas têm “grandes incentivos” para transportar itens de uma maneira diferente a fim de evitar tarifas pesadas que possam reduzir as margens de lucro, afirmou.
É uma conclusão vividamente ilustrada no Vietnã, onde um trecho de três quarteirões consecutivos no bairro antigo de Hanói está repleto de lojas de Natal nesta época do ano.
“Existem algumas empresas locais que trouxeram material e peças da China para montar esses tipos de luzes e vendê-las”, disse Nguyen Thi Ha, uma comerciante de 34 anos da rua Hang Ma, conhecida pela oferta de artigos sazonais ao longo do ano.
“Eles não podem produzir sozinhos, porque isso custaria muito mais do que importar peças da China para montá-las”, disse.
As pressões da guerra comercial fizeram com que mais fornecedores chineses inundassem o mercado este ano, segundo vários lojistas de Hang Ma.
Em maio, o governo Trump aplicou tarifas de 25% sobre as luzes de Natal da China, acima da tarifa anterior de 10%. O item não é coberto pelo acordo comercial de primeira fase fechado pelos EUA e China no início deste mês.
Para Au Anh Tuan, chefe de controle e supervisão aduaneira do Departamento Geral da Alfândega do Vietnã, restringir o fluxo de mercadorias ilegais é difícil. Entre janeiro e outubro, autoridades haviam identificado cerca de 14 casos significativos de exportação com etiquetas falsas.
“Trabalhamos com o Ministério do Planejamento e Investimento na digitalização completa do investimento estrangeiro direto da China e Hong Kong”, disse Tuan em entrevista em novembro, em Hanói.
O investimento estrangeiro direto chinês no Vietnã cresceu três dígitos em 2019, segundo dados de novembro.