Guedes: Brasil gasta dez vezes mais com aposentadorias do que com educação
Em audiência com os deputados, ministro disse que o sistema de repartição (onde os trabalhadores da ativa financiam os aposentados) está fadado ao fracasso
Agência Brasil
Publicado em 3 de abril de 2019 às 15h56.
Última atualização em 3 de abril de 2019 às 19h33.
Brasília — O ministro da Economia, Paulo Guedes , afirmou nesta quarta-feira (3) que não terá coragem de lançar o sistema de capitalização se os parlamentares aprovarem uma reforma da Previdência com potência menor que a necessária, defendendo que esse modelo foi responsável por impulsionar o crescimento econômico no Chile.
"Se os senhores preferem que filhos e gerações futuras sofram esse mesmo problema, se estiverem dispostos a seguir nesse ambiente, podem seguir. Eu não vou lançar sistema de capitalização, não sou irresponsável", afirmou ele, em audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na Câmara dos Deputados.
Após parlamentares da oposição criticarem o Chile como modelo a ser perseguido, Guedes defendeu que aquele país era frágil e financeiramente quebrado e, com a introdução da capitalização, passou a ter a maior renda per capita da América Latina.
Guedes afirmou ainda que a instituição de uma camada nacional na capitalização pode garantir o salário mínimo aos trabalhadores que não conseguirem poupar o suficiente para assegurá-lo por conta própria.
"Dez vezes mais"
De acordo com o ministro, o Brasil gasta dez vezes mais com aposentadorias que com educação. Na audiência com os deputados, ele disse que o sistema de repartição (onde os trabalhadores da ativa financiam os aposentados) está fadado ao fracasso.
O ministro destacou que a maior despesa que pressiona o déficit das contas públicas tem sido a Previdência. "Ano passado gastamos R$ 700 bilhões com a Previdência, que é o nosso passado, e gastamos R$ 70 bilhões com educação, que é o futuro. Gastamos dez vezes mais com a Previdência que com o futuro, que é a educação. Antes de a população brasileira envelhecer, a Previdência está condenada", declarou.
Segundo Guedes, os problemas fiscais decorrentes do crescimento dos gastos com a Previdência estão se impondo aos governos locais, independentemente do partido. "Tenha quem tiver, o partido que tiver, independentemente de quem esteja no governo, esse problema está se impondo", advertiu.
Confusão
Segundo Guedes, caso a reforma da Previdência não seja aprovada, o Brasil passará a ter problemas para pagar salários dos servidores, como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás.
Nesse momento, houve bate-boca quando um parlamentar disse que a capitalização não deu certo no Chile, e Guedes fez um paralelo com a crise econômica e humanitária na Venezuela.
"Acho que a Venezuela está melhor [que o Chile]", rebateu o ministro em tom de provocação. Nesse momento, deputados da oposição começaram a gritar. O ministro disse que não conseguia ouvir vários parlamentares falando ao mesmo tempo. O presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), interveio e pediu calma e respeito ao ministro.
Parlamentares do PT, do PDT, do PSOL e do PSB foram os principais protagonistas dessa fase inicial da audiência, quando Guedes bateu boca com alguns deles, mas logo depois conseguiu "esfriar" a temperatura e pediu desculpas em uma das vezes em que se exaltou.
Ao retomar a palavra, Guedes disse que a confusão começou quando ele respondeu, fora de hora, a um questionamento da deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) sobre como cobrir os custos de transição para o sistema de capitalização.
O ministro explicou que o Chile conseguiu implementar políticas sociais nos últimos 30 anos porque passou a sobrar recursos depois que o país adotou o regime de capitalização, nos anos 1980. Ele lembrou que a renda per capita do país dobrou nos últimos 30 anos.
Desabafo
Sob forte pressão dos deputados da oposição, o ministro acabou fazendo um desabafo ao afirmar que pode estar "errando de várias maneiras", mas que procura fazer o melhor. Em audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Guedes refutou o título de "rentista" dado pelos parlamentares por ter trabalhado no mercado financeiro. Ele disse que ao entrar para o governo "sem dúvida" está perdendo financeiramente e destacou que se desfez de investimentos.
Diante da classificação de rentista, o ministro cutucou os políticos. Disse que não gostaria de ser chamado de rentista da mesma maneira que não aponta para um deputado dizendo que ele é praticante da velha política. "Eu não classifico ninguém", disse.
O ministro disse que é empreendedor, mas que gostaria de ter sido professor. Ele contou que não foi professor porque quando retornou ao Brasil, depois de estudos no exterior, encontrou um ambiente bastante ideologizado, do qual não concordava.
"Repartição está condenada"
O ministro afirmou que a Previdência Social no formato atual de repartição está condenada. "A repartição é um avião partindo para alto mar sem combustível. A primeira bomba a bordo é a demográfica. O sistema está condenado antes de a população brasileira envelhecer, não interessa quem estiver no poder, o partido que for".
Guedes deu exemplos de países como Grécia e Portugal em que houve um colapso da Previdência. "A dimensão fiscal é incontornável, independentemente do partido, não tenho filiação partidária, é um problema que está se impondo, independente de quem estiver na Presidência", reforçou.
O ministro destacou que os gastos públicos subiram ao longo dos últimos 40 anos até atingir 45% do PIB e disse que o principal componente para a explosão dos gastos foram as despesas com pessoal.
"Dentro desses gastos com pessoal, o elemento de déficit galopante foi a Previdência Social. Gastamos 10 vezes mais com a Previdência no ano passado do que com o futuro, que é a educação", completou.
Guedes ressaltou também o crescimento também de gastos "menos nobres" do que a Previdência, como com a dívida pública e com os salários do funcionalismo. Ele abriu sua fala elogiando os deputados, que disse serem "extremamente qualificados" para o exercício da profissão e que já estão informados sobre o tema.
"É um tema que cria muita paixão política e efeito social dependendo de como é feito. Quem vai votar isso são os senhores, eu sou meramente um equacionador, uma pessoa que se debruçou sobre sistemas alternativos de forma a dar uma solução definitiva para o problema", completou.