Economia

Grande redução no funcionalismo economizaria até R$ 816 bi em 10 anos

Impacto vem do congelamento de salários por 2 anos, aprovado no Congresso, e de mudanças nas carreiras, segundo estudo do Ipea sobre reforma administrativa

Esplanada dos Ministérios (Ueslei Marcelino/Reuters)

Esplanada dos Ministérios (Ueslei Marcelino/Reuters)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 14 de setembro de 2020 às 13h09.

Última atualização em 15 de setembro de 2020 às 06h06.

As medidas de controle nos gastos com pessoal e as alterações nas regras do RH do setor público em discussão na reforma administrativa podem resultar em uma economia entre R$ 673 bilhões e R$ 816 bilhões em dez anos, para União Estados e municípios, segundo cálculos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O impacto é fruto do congelamento de salários por dois anos, já aprovada pelo Congresso, e de eventuais mudanças nas carreiras daqui para frente, como a reposição de 50% de servidores que se aposentam, excluindo militares, da União, dos estados e dos municípios. cujas propostas ainda estão em discussão dentro do governo.

Em 20 anos, a economia chegaria a R$ 1,7 trilhão. Mas esse cenário é muito pouco provável, segundo o Ipea, porque demandaria que todas as medidas sugeridas valessem por esse período de tempo. Por essa razão, o estudo foca nos resultados ao longo de uma década. "A gente quis destacar cenários que comnsideramos possíveis. Certamente algumas dessas medidas não vão ser tomadas na totalidade", diz à Exame o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo Souza Júnior.

Os Estados e o Distrito Federal são os que têm mais espaço para frear os gastos com a folha do funcionalismo e podem poupar de R$ 286,2 bilhões a R$ 339,7 bilhões na comparação com um cenário sem reforma. Nos municípios, a redução de despesas pode ficar entre R$ 200 bilhões e R$ 224 bilhões. Para a União, o estudo estima a possibilidade de economia de R$ 186,9 bilhões a R$ 252 3 bilhões.

As estimativas foram divulgadas pelo Ipea na nota técnica "Ajustes nas despesas de pessoal do setor público: cenários exploratórios para o período 2020-2039". A ideia do órgão é subsidiar o debate que começa agora na Câmara com o início da tramitação da reforma administrativa, que muda a forma como os servidores são contratados, promovidos e demitidos.

 

Na semana passada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, se antecipou e citou um potencial de R$ 300 bilhões de diminuição dos gastos com a reforma, um número que já considera parte das projeções feitas pelo Ipea. Nas contas do órgão, iniciativas para reduzir a reposição de servidores daqui para frente, cortar salários iniciais para novos entrantes e alongar os degraus das carreiras podem resultar em impactos de R$ 202,5 bilhões a R$ 318,5 bilhões nas três esferas, a depender do alcance das medidas.

A outra parte da economia viria do congelamento dos salários de servidores federais, estaduais e municipais, medida aprovada este ano juntamente com o socorro financeiro concedido a Estados e municípios devido à pandemia da covid-19.

Embora a proibição a reajustes valha por dois anos, seu efeito é perene, uma vez que aumentos futuros ocorrerão sobre uma base salarial menor.

Considerando que, a partir de 2022, os reajustes correspondam sempre à inflação anual, sem compensações para "devolver" o período de congelamento, o Ipea avalia que essa medida causa um deslocamento permanente para baixo das despesas de pessoal. Por isso, a economia em uma década pode ser de R$ 470,7 a R$ 503,5 bilhões, segundo o Ipea.

Oficialmente, o governo não enviou junto com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa nenhum cálculo da economia potencial. A justificativa é que a conta depende ainda de decisões sobre as carreiras dos servidores, que não estão contempladas no texto da PEC e que ficarão para projetos de lei, numa segunda fase da reforma, porque dependem inclusive da aprovação da mudança constitucional.

Impactos

O diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo Souza Junior, diz que a divulgação dos cálculos pretende auxiliar a sociedade e os tomadores de decisão - Executivo e Parlamento - a entender os possíveis impactos fiscais de diferentes conjuntos de medidas e as condições necessárias para torná-las efetivas. "A ideia foi fazer uma avaliação de projeções de gastos com pessoal sob diferentes hipóteses e cenários", explica.

Apesar de a PEC do governo ter deixado de fora os membros de Poderes (como juízes, desembargadores, procuradores e parlamentares), os cálculos do Ipea adotam como premissa a inclusão dessas categorias nas medidas de ajuste. "Os juízes estão incluídos, mas é bom lembrar que o objetivo do estudo não é estimar a economia especificamente com a PEC enviada. O objetivo é avaliar determinadas medidas que podem ser classificadas como reforma administrativa. De qualquer forma, o tipo de medida avaliado sobre a carreira específica de juiz não teria impacto fiscal elevado", afirma o diretor.

Cenários

O Ipea elaborou três cenários (A, B e C) para simular a economia potencial da reforma administrativa e do congelamento de salários do funcionalismo por dois anos. Em comum, eles consideram uma redução de 30% no salário inicial para novos servidores federais, estaduais e municipais, além de uma reposição das vagas em número menor que o total de aposentadorias.

O diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo Souza Junior, frisa que o grupo dedicado ao trabalho não se debruçou em medir a probabilidade de sucesso de cada um dos cenários, ou seja, as chances de cada conjunto de medidas ser aprovado no Congresso Nacional.

No cenário A, os salários de todos os servidores estaduais e municipais ficam congelados por dois anos, enquanto na União a medida alcança apenas os estatutários (servidores que ingressaram por meio de concurso público e ganham estabilidade após três anos de estágio probatório). Em todas as esferas, o salário inicial fica em 70% do respectivo valor atual.

Para os servidores federais, apenas estatutários, dobra-se o tempo para que os novos entrantes cheguem ao topo de carreira, e a taxa de reposição (novas contratações ante número de novas aposentadorias) fica em 90% em cargos de nível superior e 50% em cargos de nível médio.

Já para Estados, o cenário A prevê uma taxa de reposição de 90% para todos os servidores (estatutários e não estatutários) e redução do salário inicial dos novos entrantes também de 30%. O estudo adota a premissa de que os ganhos auferidos pelos municípios sejam uma fração dos ganhos para os Estados.

Considerando todas essas premissas, a economia potencial em uma década é de R$ 470,7 bilhões com o congelamento salarial e de R$ 202,5 bilhões com as alterações nas carreiras.

Segundo o Ipea, dois tipos de efeitos sobre as despesas com não estatutários seriam teoricamente possíveis: de um lado, a redução do contingente de estatutários poderia levar à maior contratação de temporários ou celetistas para evitar comprometer alguns serviços públicos, elevando a despesa.

Estatutários

No cenário B, inclui-se os servidores não estatutários nas medidas válidas para a União, sob a hipótese de que o ganho potencial com isso corresponde a 50% do ganho obtido com os estatutários. Esse cenário pressupõe ganhos "expressivos" de produtividade no serviço público, segundo o Ipea.

Com isso, a magnitude da economia total para a União e para o setor público como um todo aumenta. No cenário B, o impacto do congelamento chega a R$ 503,5 bilhões, e o das mudanças nas carreiras, a R$ 235 bilhões em dez anos. Toda a diferença vem do governo federal, já que Estados e municípios permanecem com estimativas iguais às do cenário A.

No cenário C, o mais otimista em termos de alcance das medidas, considera o cenário B com uma diferença: a de que a taxa de reposição nos Estados e municípios seja de 50%, ou seja, cinco novos contratados a cada dez novos aposentados. Com isso, o congelamento resultaria em economia de R$ 497,7 bilhões, e as alterações nas carreiras, de R$ 318,5 bilhões em uma década.

A folha de pessoal e encargos sociais representa o segundo maior item de despesa no orçamento da União - respondendo por quase 22% do total das despesas primárias. Nos Estados, corresponde a 56,3% das despesas totais e a 76,1% da receita corrente líquida. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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