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FHC vê Bolsonaro mais fraco em 2022 e momento econômico difícil

Segundo o ex-presidente, Bolsonaro não tem carisma nem retórica certa para se tornar um ditador populista

Ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. (Nacho Doce/Reuters)
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Bloomberg

Publicado em 2 de dezembro de 2020 às 16h30.

Última atualização em 4 de dezembro de 2020 às 10h06.

A efervescência social que catapultou Jair Bolsonaro à Presidência em 2018, após o governo de 13 anos do PT, dificilmente se sustentará até as próximas eleições em 2022, diz o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso .

“Bolsonaro já sabemos como ele é. Difícil que ele seja uma pessoa que empolgue novamente, como já empolgou. Empolgou muito mais contra o medo que o pessoal tinha do PT, exagerado”, afirmou à Bloomberg News. “Agora, chega lá, mas tem de fazer alguma coisa. O que de concreto está sendo feito?”

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Isso não significa que o presidente de extrema-direita não será um forte candidato à reeleição. A popularidade de Bolsonaro atingiu recorde no auge da pandemia, devido ao auxílio emergencial, que ele está sendo forçado a suspender devido às restrições fiscais.

Sua marca populista, no entanto, sofreu um duplo golpe nas últimas semanas: primeiro, seu aliado Donald Trump não conseguiu se reeleger nos Estados Unidos. Depois (sem partido) saiu enfraquecido das eleições municipais, já que candidatos que receberam seu apoio não se elegeram.

O governo também enfrenta dificuldades para avançar com as reformas. “O ministro Paulo Guedes não conhece o Congresso. Ele é um peixe fora d’água no Congresso. Então é difícil que o Congresso vá atrás das reformas necessárias”, afirma Fernando Henrique.

O ex-presidente observa com preocupação a deterioração das finanças do país, incluindo os primeiros sinais de problemas na rolagem de títulos da dívida. Não é o tamanho da dívida pública — agora perto de 100% do PIB — que o preocupa, mas a redução da credibilidade do governo nos mercados financeiros.

“O governo está tomando atitudes que são condizentes com alguém que espera que haja alguma sobra fiscal para poder pagar a dívida ou não? Não vi nada que mostre uma disposição férrea.”

O próximo presidente precisará reconstruir essa credibilidade e “reinventar um caminho” para o país, diz Fernando Henrique, ao citar quatro potenciais candidatos: o governador de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, ambos do PSDB, o apresentador Luciano Huck e Ciro Gomes (PDT).

Apesar de uma “fumaça de populismo” nublando o cenário político do Brasil, Bolsonaro não tem carisma nem retórica certa para se tornar um ditador populista, segundo o ex-presidente.

“A crise da democracia representativa não chegou ao ponto de dizer que então é melhor um bom ditador.”

Leia os principais trechos da entrevista:

Bolsonaro

“Neste momento a posição do presidente Bolsonaro não é das mais favoráveis a ele. Há muita crítica, um sentimento negativo que deriva de vários fatores. Estamos num momento difícil da economia, tem muita gente desempregada, e por outro lado, o presidente diz coisas de forma um pouco impensada. A palavra presidencial pesa muito.”

Eleições 2022

“Vai haver alguém com a capacidade de reinventar um caminho para o país? Esse é o ponto fundamental para quem quiser ser candidato. Bolsonaro já sabemos como ele é. Difícil que ele seja uma pessoa que empolgue novamente, como já empolgou. Empolgou muito mais contra o medo que o pessoal tinha do PT, exagerado, mas havia esse temor, e aproveitou e nadou nessas águas. Agora, chega lá, mas tem de fazer alguma coisa. O que é que está fazendo, o que de concreto está sendo feito? Vamos precisar de alguém que desperte confiança.”

Nomes para 2022

“Os governadores de São Paulo e do Rio Grande do Sul são pessoas que têm ação, o de São Paulo especialmente. Isso quer dizer que ele vai ganhar? Não, isso quer dizer que ele tem alguma credencial para falar. Agora, vai conseguir entrar no Rio, no Nordeste? Depois tem Luciano Huck, se é que vai ser candidato. Vai largar a Globo? Quando? E vai ser capaz de despertar mais do que a simpatia que desperta na televisão? Mais do que isso, tem capacidade de liderar? Ciro é bom de bico, sabe falar. Essa condição é importante no Brasil: saber expressar um sentimento. É um pouquinho cedo, mas não é cedo para que eles comecem a se jogar. Pode aparecer alguém? Pode, mas não é facil, especialmente agora, você vai ter de ter alguém que abra um caminho, que dê esperança, mostre capacidade de liderar.”

Paulo Guedes e as reformas

“O ministro Paulo Guedes não conhece o Congresso. Ele é um peixe fora d’água no Congresso. Então é difícil que o Congresso vá atrás das reformas necessárias. Acho difícil que as reformas sejam aprovadas no tempo que se imagina que seja possível. Pode ser que uma ou outra reforma ainda passem, mas quanto mais próximo chega do fim do governo e quanto menos poder eleitoral tem o presidente, mais difícil se torna a reforma.”

Bolsonaro e as reformas

“É mais fácil reformar no começo do governo do que no meio. Daqui para a frente vão começar a ver um lame duck, é o pato manco. Se tiver chance de reeleição, é uma coisa. Se não tiver chance de reeleição, o Congresso vai enrolar esse negócio o que puder.”

Centrão e as reformas

“Tendência do centrão é fisiológica, muito mais do que ideológica. Aliança dá possibilidade de aprovação de projetos. Vai custar caro, como sempre custa. Quando você se entrega ao dá cá toma lá, você fica no poder, mas o custo é alto. É o que tem o presidente Bolsonaro a meu ver.”

Credibilidade da dívida

“O problema não é o tamanho da dívida, mas a credibilidade que o governo tem para fazer novas dívidas. Então quando você começa a ver dificuldade na rolagem da dívida, e nós estamos começando a ter, aí preocupa porque a situação fiscal não se resolve do dia para a noite. Começa a haver alguns sinais preocupantes, que vêm junto com a falta de prestígio político. O governo está tomando atitudes que são condizentes com alguém que espera que haja alguma sobra fiscal para poder pagar a dívida ou não? Não vi nada que mostre uma disposição férrea.”

Crise da democracia

“A crise da democracia representativa não chegou ao ponto de dizer que então é melhor um bom ditador. Nesse momento há um mal-estar e quando há mal-estar é sempre perigoso porque haver um escorregão e pode ir para uma deriva autoritária. No Brasil há fumaça de populismo. Não creio que o presidente Bolsonaro tenha as características para isso, porque para você ser líder populista é preciso ser capaz de ter outra retórica que não é a dele.”

Crescimento em V

“Olhando o que vai acontecer daqui a alguns anos não posso dizer que a economia formalmente vai bafejar a nosso favor, não vai. Vai precisar de mais organização, de mais capacidade nossa. Eu não estou vendo recuperação em V rapidamente. Precisamos nos preparar, barbas de molho porque as coisas não vão ser fáceis e, quanto mais difíceis, mais se necessita de comando.”

Inflação

Tem um repique sim, muito pequeno, mas acho que aprendemos um pouco a lidar com a inflação. Se perder o controle, ela volta, mas não vejo isso acontecendo de forma iminente.

China x EUA

“O presidente atual, a turma dele, dá a sensação de que tem lado. Opinar contra a China? É uma coisa insensata. Para quem nós exportamos? Para a China. Para quê mexer com a China? Eu acho um erro. Como presidente, tem que ter uma certa capacidade de entender o interesse seu, do seu país e não se precipitar. Se não entender que a diversidade faz parte da vida, não entendeu nada. Tem que entender e conviver. A palavra chave é conviver. Ou senão, faz guerra. Mas é melhor não fazer, ainda mais nós.”

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