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E se a "economia do Uber" for uma volta ao passado?

Em 1900, metade da força de trabalho nos EUA era autônoma - o número caiu através do século e volta a subir com ajuda de plataformas digitais, diz McKinsey

Motorista de Uber: eles são só a face mais visível de um fenômeno mais amplo (Robert Galbraith/ Reuters)

João Pedro Caleiro

Publicado em 20 de outubro de 2016 às 12h39.

Última atualização em 20 de outubro de 2016 às 13h25.

São Paulo – Trabalhadores independentes, flexíveis, sem chefe direto nem horário e salário fixo: "o futuro do trabalho independente parece bastante com o seu passado".

A frase é do McKinsey Global Institute, que publicou um relatório sobre a situação dos trabalhadores autônomos em países desenvolvidos.

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Como os dados oficiais sobre a categoria são incompletos, a consultoria fez uma pesquisa própria com 8 mil pessoas em 6 países: Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Suécia, França e Espanha.

A conclusão é que de 20% a 30% da força de trabalho nos Estados Unidos e nos países da EU-15, ou 162 milhões de pessoas, podem ser considerados “trabalhadores independentes”.

Não entram aí os terceirizados ou aqueles que tem vários empregados próprios, mas apenas quem tem sua ocupação definida por autonomia, pagamento por tarefa e relação de curto prazo com o cliente.

Autonomia e necessidade

Eles foram divididos em 4 grupos. 30% são os “livres agentes”, que preferem esse tipo de trabalho e tiram a maior parte da sua renda dele. 40% são “ganhadores casuais”, que escolhem ganhar um extra com essas atividades.

Um outro estudo recente, de Lawrence Katz e Alan Krueger, que já havia apontado a crescente porcentagem de autônomos, nota que 60% dos motoristas de Uber nos EUA também têm outra fonte de renda.

No balanço geral da McKinsey, 70% do total é "independente" por escolha – e está, na média, mais satisfeito do que os outros independentes e até de quem tem emprego fixo.

Entra aí muita gente para quem esse tipo de esquema mais flexível simplesmente faz mais sentido, como decoradores, médicos e contadores.

Já 14% do total é formado pelos “relutantes”, que dependem dessas atividades para ter renda mas preferiam ter emprego fixo, e 16% de “financeiramente apertados”, que precisam complementar sua renda com esse tipo de bico.

Como era de se esperar, o tamanho dessa parcela de "autônomos por necessidade" (30%) flutua de acordo com a situação econômica do país. Em países com alto desemprego e baixo crescimento recente, como Grécia, Espanha e Polônia, mais de três quartos dos trabalhadores temporários são involuntários.

No Brasil, por exemplo, o número de motoristas do Uber cresceu 10 vezes em um ano e chegou a 50 mil parceiros. Isso tem a ver com regulação e propaganda, mas também com o fato de que virar motorista é hoje uma das poucas alternativas em um mercado de trabalho em queda livre.

É importante notar que hoje apenas 15% dos autônomos pesquisados pela McKinsey trabalham através de plataformas digitais, mas esse é um número que não para de crescer.

O estudo também refuta alguns mitos ao mostrar que o perfil desse grupo é bem diverso em termos de renda, escolaridade e gênero. E não é coisa só de millenials, já que eles são menos de um quarto do total.

A parte boa disso tudo é que ela favorece o aumento da produtividade e mais participação na força de trabalho, mas resta o desafio de impedir a existência de dois mercados de trabalho paralelos - registrados de um lado, com todos os benefícios, e autônomos do outro (e sem nenhum).

“Uma área de preocupação para trabalhadores independentes é seu acesso limitado a proteções de segurança de renda como seguro contra desemprego e invalidez e compensação por trabalho. Salário mínimo e leis antidiscriminação podem não se aplicar e segurança na aposentadoria é outra preocupação", diz a McKinsey.

É nesse sentido que a consultoria fala em uma volta ao passado. No começo do século passado, praticamente metade da força de trabalho americana era auto-empregada. Na medida que os países iam se industrializando, surgiam os empregos "chão de fábrica" e essa parcela ia caindo.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, de 30% a 40% dos adultos são trabalhadores "tradicionais" nos países de renda baixa, parcela que sobre para 60% a 70% em países de renda média e 80% a 90% em países de renda alta.

Um mudança nessas porcentagens está acontecendo rapidamente e tem levado a um debate muitas vezes polarizado "ampliado pelo fato de que essa transição ocorre em um cenário de ansiedade generalizada em relação à qualidade dos empregos e como tecnologias digitais estão mudando o mundo do trabalho para todo mundo", diz o relatório.

As soluções podem vir de vários lados. Na legislação trabalhista, por exemplo, não existe resposta pronta para o equilíbrio fino a ser encontrado entre flexibilidade e segurança (e para diferentes tipos de ocupação e trabalhador).

A consultoria cita como possibilidade a criação de associações de trabalhadores independentes com seu próprio mercado e benefícios (como acontece com os roteiristas de Hollywood, por exemplo), mas pode caminhar também para um modelo em que garantias mínimas não serão dadas mais por empresas e sim diretamente pelo Estado (como uma renda mínima ou seguro de saúde universal).

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