Argentina deposita pagamento da dívida apesar de advertência
Depósito foi o primeiro realizado sob a nova legislação, que habilita uma nova sede de pagamento
Da Redação
Publicado em 30 de setembro de 2014 às 16h16.
Buenos Aires - A Argentina depositou nesta terça-feira em Buenos Aires 161 milhões de dólares para o pagamento de um novo vencimento de dívida , apesar da decisão de um juiz de Nova York que considerou na segunda que esta medida é ilegal e declarou o país em desacato, informou o Ministério da Economia.
O depósito foi o primeiro realizado sob a nova legislação, que habilita uma nova sede de pagamento enquanto é mantida a ordem judicial que bloqueia 539 milhões de dólares em um banco de Nova York.
O juiz Griesa declarou na segunda-feira a Argentina em desacato por ter dado passos ilegais para burlar sua sentença, que obriga o país a pagar 1,33 bilhão de dólares por bônus em default a fundos especulativos, mas sem impor sanções até o momento.
"O tribunal argumenta que a República de Argentina está em desacato civil", afirmou Griesa ao final de uma audiência realizada em um tribunal do sul de Manhattan, em resposta a um pedido feito pelos fundos especulativos.
Apesar da advertência, "a Argentina depositou os juros dos títulos da dívida 'Bonos Par' emitidos na renegociação da dívida soberana dos anos 2005 e 2010, sob a legislação do Estado de Nova York (Estados Unidos) e da Inglaterra e País de Gales pelo equivalente a 161 milhões de dólares", informou nesta terça-feira o Ministério da Economia em um comunicado.
"Ao realizar estes depósitos, a República Argentina ratifica mais uma vez seu compromisso inquebrantável de cumprir com todas as suas obrigações em relação aos credores e contribuir com as medidas que estiverem ao seu alcance para preservar seu direito de receber", afirma o comunicado.
Com esse depósito, o governo concretizou a transferência de sede de pagamento para a capital argentina, como estabelece a lei aprovada recentemente, que busca driblar o bloqueio judicial de fundos determinado por Griesa em um banco de Nova York.
O juiz mantém bloqueado no Bank of New York (BoNY) 539 milhões de dólares depositados pela Argentina por uma dívida anterior dos títulos reestruturados sob legislação americana, medida com a qual Griesa busca cumprir sua decisão que estabelece um 'pari passu' (mesmo tratamento) para todos os credores.
Esta situação levou a Argentina a uma moratória parcial no dia 30 de julho.
Não se sabe se os credores aceitarão a nova sede pagamento, se pedirão para receber na França (outra opção que contempla a nova norma) ou em outra sede fora dos Estados Unidos.
Outra parte do pagamento da dívida - dos títulos emitidos sob a lei argentina e que deve ser paga pelo Citibank Argentina - já havia sido autorizada por Griesa após um pedido dessa instituição bancária, que apontado para o risco de "sanções penais e de perda da sua licença na Argentina" caso não conseguisse repassar o pagamento aos credores.
Desacato "sem efeito prático"
Griesa justificou sua decisão de declarar o país em desacato pelas "medidas ilegais propostas" pelo governo da presidente Cristina Kirchner a fim de evitar o cumprimento da sentença que determina o pagamento de 1,33 bilhão de dólares pelos títulos da dívida em moratória desde 2001.
Os fundos NML Capital e Aurelius, chamados de "abutres" pelo governo argentino, fizeram um pedido por escrito na última quarta-feira à justiça, argumentando que o país "violou repetida e descaradamente as ordens do tribunal, deixando bem claro que não respeita essas ordens, o tribunal e o sistema judicial dos Estados Unidos".
Antes da audiência de segunda-feira com Griesa, a embaixada da Argentina em Washington havia advertido o secretário de Estado, John Kerry, que os Estados Unidos seriam legalmente responsáveis por uma eventual declaração judicial de desacato.
Para a Chancelaria argentina, a decisão de Griesa de declarar o país em desacato é "uma violação do direito internacional, da Carta das Nações Unidas e da Carta da Organização dos Estados Americanos".
Nesta terça-feira, em sua habitual coletiva de imprensa pela manhã, o chefe de Gabinete, Jorge Capitanich, considerou que a decisão de Griesa "não tem fundamento nem impacto".
Capitanich reiterou que a ordem do juiz constitui "uma violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas" e considerou "inaplicáveis" eventuais sanções, já que "a lei de imunidade soberana proíbe as sanções por desacato contra os Estados estrangeiros".
Na prática, a Argentina pode ser punida com a aplicação do pagamento de uma multa diária, "um castigo simbólico", segundo argumentou o economista Nicolás Dujovne.
"A declaração de Griesa provocará, possivelmente, uma escalada retórica do governo argentino, o que constituirá sem dúvida uma dificuldade adicional para se imaginar um cenário de negociação dentro de alguns meses", avaliou o economista em uma coluna do jornal La Nación.
Segundo a agenda oficial, a presidente argentina fará um discurso em rede nacional nesta terça-feira às 21h30 GMT (18h30 de Brasília).