A reforma da Previdência vai sobreviver à turbulência política?
Proposta anunciada hoje é dura para dar margem ao governo nas negociações; luta promete ser mais difícil do que a da PEC do Teto
João Pedro Caleiro
Publicado em 6 de dezembro de 2016 às 16h40.
Última atualização em 6 de dezembro de 2016 às 17h44.
São Paulo – O governo anunciou hoje sua proposta de reforma da Previdência em meio a um cenário turbulento.
Na noite de ontem, o ministro Marco Aurélio Mello do Supremo Tribunal Federal ( STF ) afastou Renan Calheiros da presidência do Senado.
A Mesa Diretora da Casa não acatou a decisão e disse que vai aguardar um posicionamento do plenário do STF.
No lugar de Renan entraria Jorge Viana (PT-AC), que prometeu adiar a tramitação da PEC do Teto dos gastos públicos, prevista ainda para essa semana.
Mesmo se a situação não der em nada e a PEC do Teto for aprovada com facilidade, a luta da Previdência promete ser bem mais dura - tanto por sua natureza quanto pelo enfraquecimento político do governo de Michel Temer.
As últimas semanas tiveram episódios como o afastamento do ministro Geddel Vieira Lima e o desgaste com a lei da anistia para o caixa 2.
“A Previdência não vai passar tão fácil como a PEC do Teto, quando o governo estava com toda força", diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.
O governo e economistas insistem que ao definir crescimento real zero do gasto, a PEC do Teto exige o controle da Previdência, sob risco de achatar cada vez mais os demais gastos.
O ministro Eliseu Padilha disse ontem que se nada for feito, o Orçamento em 2024 estará totalmente comprometido com custos fixos de saúde, educação, folha de pagamento e Previdência - e nenhum real para nada mais.
"O discurso é que o teto obriga a Previdência, mas não é porque é obrigado que se faz”, pontua Perfeito.
A estratégia do governo, segundo analistas, foi de fazer uma proposta dura para poder manter um núcleo robusto mesmo após muitas negociações.
“Seria ingênuo achar que o Temer com 3 meses de gestão conseguiria fazer uma reforma total, algo que nem Fernando Henrique nem Lula nem Dilma conseguiram”, diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) não participou da reunião convocada pelo Planalto e criticou a reforma, assim como o deputado Paulinho da Força (SP), presidente da Força Sindical. Ambos atacaram a idade mínima de 65 anos, considerada o centro da proposta.
“Os pontos centrais têm que ser inegociáveis”, diz Paulo Tafner, técnico aposentado que estudou Previdência por décadas no Ipea.
Ele acha que um dos exageros foi no tamanho do corte das pensões por morte, mas concorda com o princípio de que não se possa mais acumular pensão e aposentadoria.
Fábio Giambiagi, especialista em Previdência e contas públicas, também acha a regra boa mas acredita que ela não vai sobreviver às negociações.
Outra novidade polêmica define que o tempo mínimo de contribuição é 25 anos, mas que dá direito a apenas 76% do valor da aposentadoria, aumentando gradualmente ao longo dos anos. O trabalhador precisará contribuir por 49 anos para receber 100%.
“Acho que essa regra é bem dura e dificilmente sobrevive”, aposta Alexandre Schwartsman, ex-Diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.
E esse não é o único problema. Para Nelson Marconi, coordenador executivo do Fórum de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), trabalhadores informais - desproporcionalmente negros e pobres - também saem perdendo:
"A regra de soma com idade é inteligente, mas o governo teria que criar algum mecanismo para proteger quem está no sistema informal. Se eessa pessoa não tiver algum jeito de contribuir para compensar o tempo que ficou fora do sistema, vai ficar prejudicada".