O populismo anti-trabalhista do Uber
O país tem leis trabalhistas que, se aplicadas, não inviabilizam os aplicativos de transporte
Maurício Grego
Publicado em 31 de outubro de 2017 às 14h46.
Nesta terça-feira será discutido no plenário do Senado Federal o Projeto de Lei 28/2017 que visa regulamentar o transporte privado de passageiros no país. Trata-se de um projeto que definiria parâmetros para a utilização de serviços como Uber e Cabify, inovações que têm melhorado a vida dos brasileiros, mas sofrem com o lobby de taxistas e com o anseio (provavelmente justo) de políticos que querem arrecadar mais impostos com os aplicativos.
À primeira vista, todo projeto que vai para discussão em plenário sob regime de urgência é precedido de certo consenso pelos parlamentares – se não consenso, ao menos pela formação de uma clara maioria favorável ou contrária à proposta.
Não é o caso, por incrível que pareça, do PL 28/2017. Proposto pelo deputado federal Carlos Zarattini (PT), o projeto foi antecedido por dois outros, os PLs 530/2015 (Ricardo Ferraço, senador do PSDB) e 726/2015 (Lasier Martins, senador do PSD). O presidente do Senado Federal, Eduardo Braga (PMDB), afirma que pediu o regime de urgência para o PL 28/2017 pois os líderes partidários ainda não haviam entrado em entendimento sobre o assunto.
Seria fácil culpar as instituições complicadas do Brasil pelo impasse, mas o mundo todo tem discutido a melhor maneira de regulamentar serviços como Airbnb e Uber. Não é nada fácil. A tensão entre a “gig economy” e temas que parecem antiquados, como arrecadação tributária e direitos trabalhistas, tem ressonância especial no Brasil.
O excelente livro “As Upstarts: Como a Uber, o Airbnb e as killer companies do novo Vale do Silício estão mudando o mundo” (Ed. Intrínseca, 2017), do jornalista Brad Stone, mostra que desde o lançamento do Uber em San Francisco, em 2011, a empresa tem imensa dificuldade em lidar com o poder público. O argumento de então é o mesmo em discussão hoje no Brasil: o governo, dizem Uber etc, quer tratar como serviço público um serviço que tem natureza privada. Não é uma boa análise. O PL 28 propõe medidas sensatas como a exigência de contratação de seguro para os carros usados e a exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do INSS.
Ser contra esta última medida coloca as empresas em certa saia justa. Admitem que não enxergam os motoristas como funcionários, mas sim como freelancers que dirigiriam Uber para complementar a renda. Não é o que tem acontecido no Brasil, ao menos. Há muitos motoristas (chamados pelo Uber de “parceiros”) em atividade por conta do desemprego. Trabalham com liberdade para escolher seus horários, têm direito a 75% do valor ganho em cada corrida e não têm que pagar diária por uso do carro para um proprietário de licença, ao contrário de muitos taxistas.
É um bom negócio? Talvez sim para muitos motoristas, e certamente é para o Uber e outras empresas. Mas o país tem leis trabalhistas que, se aplicadas, não inviabilizam os aplicativos. Identificar os carros com placas vermelhas também não inviabiliza os serviços, apesar de potencialmente diminuir o número de motoristas. Afinal, o custo de entrada para trabalhar como motorista de Uber aumentaria. Ainda assim, é algo longe, bem longe, da “proibição” alegada pelas empresas. Caso o PL 28/2017 seja aprovado, a próxima, e gigantesca, batalha será na Câmara dos Deputados e com um presidente aprovado por 3% dos cidadãos. Bons auspícios para Uber e suas concorrentes, embora um fato permaneça: nenhuma empresa pode escolher leis para ignorar.
Nesta terça-feira será discutido no plenário do Senado Federal o Projeto de Lei 28/2017 que visa regulamentar o transporte privado de passageiros no país. Trata-se de um projeto que definiria parâmetros para a utilização de serviços como Uber e Cabify, inovações que têm melhorado a vida dos brasileiros, mas sofrem com o lobby de taxistas e com o anseio (provavelmente justo) de políticos que querem arrecadar mais impostos com os aplicativos.
À primeira vista, todo projeto que vai para discussão em plenário sob regime de urgência é precedido de certo consenso pelos parlamentares – se não consenso, ao menos pela formação de uma clara maioria favorável ou contrária à proposta.
Não é o caso, por incrível que pareça, do PL 28/2017. Proposto pelo deputado federal Carlos Zarattini (PT), o projeto foi antecedido por dois outros, os PLs 530/2015 (Ricardo Ferraço, senador do PSDB) e 726/2015 (Lasier Martins, senador do PSD). O presidente do Senado Federal, Eduardo Braga (PMDB), afirma que pediu o regime de urgência para o PL 28/2017 pois os líderes partidários ainda não haviam entrado em entendimento sobre o assunto.
Seria fácil culpar as instituições complicadas do Brasil pelo impasse, mas o mundo todo tem discutido a melhor maneira de regulamentar serviços como Airbnb e Uber. Não é nada fácil. A tensão entre a “gig economy” e temas que parecem antiquados, como arrecadação tributária e direitos trabalhistas, tem ressonância especial no Brasil.
O excelente livro “As Upstarts: Como a Uber, o Airbnb e as killer companies do novo Vale do Silício estão mudando o mundo” (Ed. Intrínseca, 2017), do jornalista Brad Stone, mostra que desde o lançamento do Uber em San Francisco, em 2011, a empresa tem imensa dificuldade em lidar com o poder público. O argumento de então é o mesmo em discussão hoje no Brasil: o governo, dizem Uber etc, quer tratar como serviço público um serviço que tem natureza privada. Não é uma boa análise. O PL 28 propõe medidas sensatas como a exigência de contratação de seguro para os carros usados e a exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do INSS.
Ser contra esta última medida coloca as empresas em certa saia justa. Admitem que não enxergam os motoristas como funcionários, mas sim como freelancers que dirigiriam Uber para complementar a renda. Não é o que tem acontecido no Brasil, ao menos. Há muitos motoristas (chamados pelo Uber de “parceiros”) em atividade por conta do desemprego. Trabalham com liberdade para escolher seus horários, têm direito a 75% do valor ganho em cada corrida e não têm que pagar diária por uso do carro para um proprietário de licença, ao contrário de muitos taxistas.
É um bom negócio? Talvez sim para muitos motoristas, e certamente é para o Uber e outras empresas. Mas o país tem leis trabalhistas que, se aplicadas, não inviabilizam os aplicativos. Identificar os carros com placas vermelhas também não inviabiliza os serviços, apesar de potencialmente diminuir o número de motoristas. Afinal, o custo de entrada para trabalhar como motorista de Uber aumentaria. Ainda assim, é algo longe, bem longe, da “proibição” alegada pelas empresas. Caso o PL 28/2017 seja aprovado, a próxima, e gigantesca, batalha será na Câmara dos Deputados e com um presidente aprovado por 3% dos cidadãos. Bons auspícios para Uber e suas concorrentes, embora um fato permaneça: nenhuma empresa pode escolher leis para ignorar.