O Brasil precisa de matemática
Ocorre que um país não tem futuro plausível se não investir de forma inteligente em educação
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Publicado em 6 de dezembro de 2023 às 16h57.
Quando estava na escola, os professores geralmente avaliavam as capacidades de seus alunos por um filtro bastante óbvio: a própria matéria. Assim, vamos supor que um aluno tirasse nota 10 em todas as atividades propostas pelo professor de português. O docente, provavelmente, achava que aquele pupilo era um estudante dedicado. Isso, no entanto, podia gerar interpretações confusas. Um jovem que iria bem em ciências poderia ir muito mal em matemática – e o contrário também. Mas outra conclusão óbvia que todos os mestres tiravam, na época, era a de que se um aluno fosse bem em sua matéria era porque teria talento para prestar vestibular em algum curso do gênero. Portanto, um bom aluno em matemática teria uma inclinação natural para cursar engenharia, física ou qualquer faculdade ligada ao que se chamava antes de “exatas”.
Pois bem. Estava cursando o último ano do ensino médio (naquela época, se chamava colegial ou segundo grau), quando fui chamado pela minha professora de matemática, Maria Helena Souza. Ela queria discutir o meu futuro profissional, já que eu era um ótimo aluno em sua matéria. “Você já se decidiu sobre o vestibular?”, perguntou ela. “Você deve estar pensando em engenharia, mas eu acho que você poderia considerar matemática”.
Tomei um susto. Era bom em álgebra e, em algumas ocasiões, inventava fórmulas diferentes das ensinadas em salas de aula. Tinha bastante facilidade. Lembro inclusive de uma prova sobre logaritmo, no segundo ano Fui o único aluno da classe a tirar 10, enquanto a média dos meus colegas ficou em torno de 5. Mas minha verdadeira paixão era escrever e já tinha me decidido pelo jornalismo. Quando expliquei isso a ela, vi o desapontamento em seus olhos. “Você tinha de ser um teórico da matemática”, disse ela, incrédula.
Uma vez eu contei essa história ao meu filho, que me encarou com olhos marotos, duvidando do que eu contava. Mas, alguns meses depois, estava com ele almoçando em um restaurante e topei com a professora Maria Helena, que confirmou a minha versão, tintim por tintim.
Essa história me veio à cabeça quando eu li ontem que sete entre dez estudantes brasileiros não sabem o básico das operações de matemática, segundo estudo do Programa de Avaliação Internacional dos Estudantes (PISA, em inglês). Além disso, a pesquisa mostra que somente 1% dos alunos no Brasil atingiram o melhor nível de rendimento nesta matéria. Para se ter uma ideia, o líder do ranking, Singapura, teve 41% dos alunos classificados neste quesito.
Em matemática, em uma amostra de 80 países, o Brasil ocupa a 64ª posição, uma à frente da Argentina. Aliás, os países latino-americanos listados no estudo do PISA, de maneira geral, foram muito mal.
Ocorre que um país não tem futuro plausível se não investir de forma inteligente em educação. Convenhamos: o orçamento do Ministério da Educação será de R$ 162 bilhões em 2024. É bastante dinheiro. Mas os resultados brasileiros do PISA mostram que estamos gastando mal essa verba.
O resultado deste ano, dizem os especialistas, foi prejudicado pela pandemia de 2020. Mas, em tese, esse problema também teria afetado as demais nações, nivelando todos os alunos da pesquisa. Mas, de fato, houve uma piora (pequena, mas houve). Hoje, são 73 % dos alunos que não têm conhecimentos básicos em matemática. Na amostra de 2018, esse índice era de 68 %.
Em um mundo cada vez mais tecnológico, precisamos de mão de obra especializada. Só que, se tivermos um ensino ruim de matemática, a lógica nos diz que produziremos poucos engenheiros diante da necessidade do país. Hoje, temos iniciativas como a Inteli, de Roberto Saloutti e André Esteves, sócios do BTG Pactual. Este projeto destina-se a ampliar a oferta de mão-de-obra dos profissionais de engenharia de computação e de software, além de ciências de computação e de sistemas de informação.
Mas, do jeito que as coisas estão no ensino médio, precisaremos de outras iniciativas para ajudar os adolescentes a aprender matemática e se preparar para cursos universitários ligados ao mundo da tecnologia. Essa é uma questão crucial para o nosso futuro. E só vai ser resolvida quando o governo traçar metas concretas, como avançar pelo menos vinte posições na próxima pesquisa do PISA.
Sem objetivos palpáveis, não conseguiremos estabelecer um método de excelência para revolucionar nosso ensino. Precisamos urgentemente de engenheiros que ajudem a consolidar o Brasil no século 21. E, sem um ensino adequado de matemática, isso não será possível.
Quando estava na escola, os professores geralmente avaliavam as capacidades de seus alunos por um filtro bastante óbvio: a própria matéria. Assim, vamos supor que um aluno tirasse nota 10 em todas as atividades propostas pelo professor de português. O docente, provavelmente, achava que aquele pupilo era um estudante dedicado. Isso, no entanto, podia gerar interpretações confusas. Um jovem que iria bem em ciências poderia ir muito mal em matemática – e o contrário também. Mas outra conclusão óbvia que todos os mestres tiravam, na época, era a de que se um aluno fosse bem em sua matéria era porque teria talento para prestar vestibular em algum curso do gênero. Portanto, um bom aluno em matemática teria uma inclinação natural para cursar engenharia, física ou qualquer faculdade ligada ao que se chamava antes de “exatas”.
Pois bem. Estava cursando o último ano do ensino médio (naquela época, se chamava colegial ou segundo grau), quando fui chamado pela minha professora de matemática, Maria Helena Souza. Ela queria discutir o meu futuro profissional, já que eu era um ótimo aluno em sua matéria. “Você já se decidiu sobre o vestibular?”, perguntou ela. “Você deve estar pensando em engenharia, mas eu acho que você poderia considerar matemática”.
Tomei um susto. Era bom em álgebra e, em algumas ocasiões, inventava fórmulas diferentes das ensinadas em salas de aula. Tinha bastante facilidade. Lembro inclusive de uma prova sobre logaritmo, no segundo ano Fui o único aluno da classe a tirar 10, enquanto a média dos meus colegas ficou em torno de 5. Mas minha verdadeira paixão era escrever e já tinha me decidido pelo jornalismo. Quando expliquei isso a ela, vi o desapontamento em seus olhos. “Você tinha de ser um teórico da matemática”, disse ela, incrédula.
Uma vez eu contei essa história ao meu filho, que me encarou com olhos marotos, duvidando do que eu contava. Mas, alguns meses depois, estava com ele almoçando em um restaurante e topei com a professora Maria Helena, que confirmou a minha versão, tintim por tintim.
Essa história me veio à cabeça quando eu li ontem que sete entre dez estudantes brasileiros não sabem o básico das operações de matemática, segundo estudo do Programa de Avaliação Internacional dos Estudantes (PISA, em inglês). Além disso, a pesquisa mostra que somente 1% dos alunos no Brasil atingiram o melhor nível de rendimento nesta matéria. Para se ter uma ideia, o líder do ranking, Singapura, teve 41% dos alunos classificados neste quesito.
Em matemática, em uma amostra de 80 países, o Brasil ocupa a 64ª posição, uma à frente da Argentina. Aliás, os países latino-americanos listados no estudo do PISA, de maneira geral, foram muito mal.
Ocorre que um país não tem futuro plausível se não investir de forma inteligente em educação. Convenhamos: o orçamento do Ministério da Educação será de R$ 162 bilhões em 2024. É bastante dinheiro. Mas os resultados brasileiros do PISA mostram que estamos gastando mal essa verba.
O resultado deste ano, dizem os especialistas, foi prejudicado pela pandemia de 2020. Mas, em tese, esse problema também teria afetado as demais nações, nivelando todos os alunos da pesquisa. Mas, de fato, houve uma piora (pequena, mas houve). Hoje, são 73 % dos alunos que não têm conhecimentos básicos em matemática. Na amostra de 2018, esse índice era de 68 %.
Em um mundo cada vez mais tecnológico, precisamos de mão de obra especializada. Só que, se tivermos um ensino ruim de matemática, a lógica nos diz que produziremos poucos engenheiros diante da necessidade do país. Hoje, temos iniciativas como a Inteli, de Roberto Saloutti e André Esteves, sócios do BTG Pactual. Este projeto destina-se a ampliar a oferta de mão-de-obra dos profissionais de engenharia de computação e de software, além de ciências de computação e de sistemas de informação.
Mas, do jeito que as coisas estão no ensino médio, precisaremos de outras iniciativas para ajudar os adolescentes a aprender matemática e se preparar para cursos universitários ligados ao mundo da tecnologia. Essa é uma questão crucial para o nosso futuro. E só vai ser resolvida quando o governo traçar metas concretas, como avançar pelo menos vinte posições na próxima pesquisa do PISA.
Sem objetivos palpáveis, não conseguiremos estabelecer um método de excelência para revolucionar nosso ensino. Precisamos urgentemente de engenheiros que ajudem a consolidar o Brasil no século 21. E, sem um ensino adequado de matemática, isso não será possível.