Escolas fechadas e comércio aberto: Covas precisa se explicar melhor
A prefeitura alega que reabrir as escolas pode criar novas ondas de contágio, e as escolas particulares partiram para a Justiça para poder reabrir
felipegiacomelli
Publicado em 20 de agosto de 2020 às 08h27.
Última atualização em 20 de agosto de 2020 às 08h49.
Agora é a vez de as escolas particulares entrarem em conflito com o prefeito de São Paulo , Bruno Covas . O governador João Doria havia autorizado, em setembro, a reabertura de todos os estabelecimentos de ensino (públicos e privados) no Estado para atividades de reforço e acolhimento. Covas, no entanto, vetou o assunto e os grupos particulares, através do sindicato patronal, partiram para uma briga na Justiça.
A prefeitura alega que reabrir as escolas pode criar novas ondas de contágio e contaminar pessoas que fazem parte do grupo de risco e moram com os alunos que voltariam a frequentar as unidades educacionais. A frase do prefeito é: "São duzentas e cinquenta mil crianças que moram muito provavelmente com avôs, avós, tios e tias com mais de 60 anos — e, portanto, podem agravar a disseminação da doença nessa faixa etária da população, que é a que tem o risco de maior vulnerabilidade".
Esse tipo de situação, portanto, só poderá ser resolvida com a chegada da vacina contra o coronavírus , que não estará disponível durante esse ano letivo. Isso quer dizer que as autoridades municipais vão decretar ensino à distância durante todo o segundo semestre? Não necessariamente. Segundo Covas, a decisão poderá ser reavaliada em outubro.
"Ainda temos o horizonte de outubro. Teremos outro inquérito sorológico, com crianças da rede estadual e da rede privada. E também para toda a família. Queremos entender se as crianças já imunizadas são de famílias também imunizadas", afirmou o prefeito. Dificilmente essa situação mudará em um mês. Os alunos que moram com representantes do grupo de risco vão continuar residindo nos mesmos lugares.
Das duas uma: ou Covas não vai reabrir as escolas e ficará neste chove não molha mensalmente ou vai retomar as aulas no mês que vem contradizendo o argumento dado no mês de agosto.
O prefeito também afirmou que "é muito mais complicado manter o distanciamento social dentro da sala de aula, dentro da escola do que em bares, restaurantes, supermercados, lojas, estabelecimentos já autorizados a retornar”. Lembremos que essa mesma explicação foi utilizada para manter os portões dos parques públicos fechados enquanto os dos shopping centers estavam abertos – para depois ser esquecida. Hoje, como se sabe, os parques públicos paulistanos estão abertos à população nos dias úteis (a desculpa para o fechamento aos finais de semana é justamente evitar aglomerações).
É possível detectar dois problemas na atitude do alcaide paulistano.
Um é a interferência direta no funcionamento de empresas privadas, como as escolas particulares. Mas, neste caso, pode-se relevar a postura de Covas. Em matéria de saúde pública, é melhor pecar pelo excesso do que pela falta.
A outra questão é relativa à fragilidade destes argumentos. Como o vírus continuará no ar e uma vacina surgirá somente depois de muitos meses, por que deixar expectativas para o mês de outubro? Se a intenção é preservar os integrantes do grupo de risco do convívio de crianças que podem se contaminar na escola, é melhor jogar aberto, afirmar que as escolas permanecerão cerradas pelo menos até o final do ano e aguentar a pressão de quem não concorda com a medida. O mesmo vale para a hipotética dificuldade de reprimir aglomerações escolares. De hoje a outubro, nada mudará nesse sentido.
Talvez o verdadeiro motivo para deixar as escolas fechadas seja outro. Uma pesquisa recente do Datafolha mostra que 79% dos entrevistados acreditam que o sistema de ensino deva continuar trancado. É ano de eleições. Some-se essas duas variáveis e teremos a real razão que move a atitude do prefeito.
A honestidade sempre se apresenta como o caminho correto. Seria preferível o prefeito admitir logo que as aulas não serão presenciais até o final de 2020 ou trabalhar melhor seus argumentos. O que ele não pode é deixar essa peteca no ar.
Enquanto a autoridade municipal tergiversa, crianças e adolescentes enfrentam a dura realidade de ficar isolados durante a pandemia. Uma pesquisa divulgada hoje pelo jornal Folha de S. Paulo aponta um crescimento significativo nos sentimentos de tristeza e ansiedade por parte dos jovens. Cerca de 77% dos jovens se sentem mais tristes, irritados ou sobrecarregados agora quando comparam seu comportamento no início do ano. São 50% os que consideram não estar evoluindo no aprendizado à distância e o risco de evasão escolar nos anos finais do ensino fundamental chega a 43 %.
Trata-se de um quadro dramático, que precisa também ser levado em consideração neste processo. Mas o prefeito prefere seguir o caminho fácil da demagogia sem admiti-lo publicamente. Afinal, o comércio pode abrir, mas as escolas não. No fundo, este episódio mostra que o PSDB continua na toada de sempre – ou seja, ficar em cima do muro mesmo que chova canivetes. Num mundo dominado pelas redes sociais, no qual todos defendem veementemente seus pontos de vista, os tucanos insistem em fingir que não são neutros e cheios de dedos quando se dirigem ao público. Até quando os eleitores vão engolir essa mise en scène?
Agora é a vez de as escolas particulares entrarem em conflito com o prefeito de São Paulo , Bruno Covas . O governador João Doria havia autorizado, em setembro, a reabertura de todos os estabelecimentos de ensino (públicos e privados) no Estado para atividades de reforço e acolhimento. Covas, no entanto, vetou o assunto e os grupos particulares, através do sindicato patronal, partiram para uma briga na Justiça.
A prefeitura alega que reabrir as escolas pode criar novas ondas de contágio e contaminar pessoas que fazem parte do grupo de risco e moram com os alunos que voltariam a frequentar as unidades educacionais. A frase do prefeito é: "São duzentas e cinquenta mil crianças que moram muito provavelmente com avôs, avós, tios e tias com mais de 60 anos — e, portanto, podem agravar a disseminação da doença nessa faixa etária da população, que é a que tem o risco de maior vulnerabilidade".
Esse tipo de situação, portanto, só poderá ser resolvida com a chegada da vacina contra o coronavírus , que não estará disponível durante esse ano letivo. Isso quer dizer que as autoridades municipais vão decretar ensino à distância durante todo o segundo semestre? Não necessariamente. Segundo Covas, a decisão poderá ser reavaliada em outubro.
"Ainda temos o horizonte de outubro. Teremos outro inquérito sorológico, com crianças da rede estadual e da rede privada. E também para toda a família. Queremos entender se as crianças já imunizadas são de famílias também imunizadas", afirmou o prefeito. Dificilmente essa situação mudará em um mês. Os alunos que moram com representantes do grupo de risco vão continuar residindo nos mesmos lugares.
Das duas uma: ou Covas não vai reabrir as escolas e ficará neste chove não molha mensalmente ou vai retomar as aulas no mês que vem contradizendo o argumento dado no mês de agosto.
O prefeito também afirmou que "é muito mais complicado manter o distanciamento social dentro da sala de aula, dentro da escola do que em bares, restaurantes, supermercados, lojas, estabelecimentos já autorizados a retornar”. Lembremos que essa mesma explicação foi utilizada para manter os portões dos parques públicos fechados enquanto os dos shopping centers estavam abertos – para depois ser esquecida. Hoje, como se sabe, os parques públicos paulistanos estão abertos à população nos dias úteis (a desculpa para o fechamento aos finais de semana é justamente evitar aglomerações).
É possível detectar dois problemas na atitude do alcaide paulistano.
Um é a interferência direta no funcionamento de empresas privadas, como as escolas particulares. Mas, neste caso, pode-se relevar a postura de Covas. Em matéria de saúde pública, é melhor pecar pelo excesso do que pela falta.
A outra questão é relativa à fragilidade destes argumentos. Como o vírus continuará no ar e uma vacina surgirá somente depois de muitos meses, por que deixar expectativas para o mês de outubro? Se a intenção é preservar os integrantes do grupo de risco do convívio de crianças que podem se contaminar na escola, é melhor jogar aberto, afirmar que as escolas permanecerão cerradas pelo menos até o final do ano e aguentar a pressão de quem não concorda com a medida. O mesmo vale para a hipotética dificuldade de reprimir aglomerações escolares. De hoje a outubro, nada mudará nesse sentido.
Talvez o verdadeiro motivo para deixar as escolas fechadas seja outro. Uma pesquisa recente do Datafolha mostra que 79% dos entrevistados acreditam que o sistema de ensino deva continuar trancado. É ano de eleições. Some-se essas duas variáveis e teremos a real razão que move a atitude do prefeito.
A honestidade sempre se apresenta como o caminho correto. Seria preferível o prefeito admitir logo que as aulas não serão presenciais até o final de 2020 ou trabalhar melhor seus argumentos. O que ele não pode é deixar essa peteca no ar.
Enquanto a autoridade municipal tergiversa, crianças e adolescentes enfrentam a dura realidade de ficar isolados durante a pandemia. Uma pesquisa divulgada hoje pelo jornal Folha de S. Paulo aponta um crescimento significativo nos sentimentos de tristeza e ansiedade por parte dos jovens. Cerca de 77% dos jovens se sentem mais tristes, irritados ou sobrecarregados agora quando comparam seu comportamento no início do ano. São 50% os que consideram não estar evoluindo no aprendizado à distância e o risco de evasão escolar nos anos finais do ensino fundamental chega a 43 %.
Trata-se de um quadro dramático, que precisa também ser levado em consideração neste processo. Mas o prefeito prefere seguir o caminho fácil da demagogia sem admiti-lo publicamente. Afinal, o comércio pode abrir, mas as escolas não. No fundo, este episódio mostra que o PSDB continua na toada de sempre – ou seja, ficar em cima do muro mesmo que chova canivetes. Num mundo dominado pelas redes sociais, no qual todos defendem veementemente seus pontos de vista, os tucanos insistem em fingir que não são neutros e cheios de dedos quando se dirigem ao público. Até quando os eleitores vão engolir essa mise en scène?