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Como saber a hora em que devemos parar de trabalhar?

A atitude de Vettel pode ser trazida para o ambiente profissional? Sim. Mas, como a vida executiva é muito mais elástica que a esportiva, quando parar?

Sebastian Vettel (Getty Images/Getty Images)
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Da Redação

Publicado em 29 de julho de 2022 às 10h54.

Aluizio Falcão Filho

Ontem, o tetracampeão de Fórmula-1, Sebastian Vettel (imagem), anunciou sua aposentadoria. Disse que seus objetivos tinham mudado. Antes, suas prioridades eram ganhar corridas e conquistar campeonatos. Agora, seu foco está em ver seus filhos crescerem, além de ajudá-los e ouvi-los nos momentos difíceis.

O esporte é cruel e fugaz. Muitas vezes descarta atletas que estão no auge físico e intelectual, como Vettel, de apenas 35 anos. O piloto alemão vinha sendo, nos últimos dois anos, uma das vozes mais interessantes do grid. Há algum tempo ele parecia vir pensando na hipótese de parar – e abandonou a tradicional politicagem que a maioria dos pilotos fazem, sendo bastante franco, mas sem perder a leveza.

Vettel obteve quatro títulos na F-1, na Red Bull, e foi contratado a peso de ouro para correr pela Ferrari. O plano da escuderia italiana era fazer dele um novo Michael Schumacher, que obteve sete títulos mundiais. Mas o alemão foi aos poucos vergado pelo estresse e pela pressão por resultados, cometendo erros bobos e perdendo feio para Lewis Hamilton, que aproveitou de forma soberba a ascensão da equipe Mercedes neste mesmo período. Lembram-se do Grande Prêmio de Montreal, quando ele cruzou a pista em primeiro, mas foi penalizado em 5 segundos e trocou as placas de classificação? E no GP de Baku, quando ele se irritou com Hamilton durante a entrada de um safety car? Ele emparelhou com a Mercedes e deu um “chega pra lá” no colega de profissão.

Este comportamento mostra alguém sob estresse total, o que o levou a uma temporada pífia em 2020, chegando constantemente atrás do novato Charles Leclerc. Nos últimos dois anos, na Aston Martin, relaxou e passou à condição de boa praça. Percebeu erros e limitações e entrou em uma fase zen.

Sua atitude me fez lembrar a de John Lennon, que passou boa parte dos anos 1970 fora do circuito musical, cuidando de seu filho Sean. Lennon percebeu que precisava de um tempo para si mesmo. Voltaria, alguns anos depois, com o disco Double Fantasy, revigorado pela pausa (infelizmente, foi morto logo depois).

A atitude de Vettel pode ser trazida para o ambiente profissional? Sim. Mas, como a vida executiva é muito mais elástica que a esportiva, quando parar?

Não são todos que podem desacelerar quando têm vontade. Mas, entre aqueles que possuem condições, quando é a hora certa? No mundo em que vivemos, sexagenários, septuagenários e octogenários têm energia de sobra para trabalhar com afinco. Evidentemente, a performance pode não ser a mesma de um jovem de 30 anos, mas a experiência pode representar um diferencial importante. Portanto, “parar de trabalhar” talvez não seja a melhor expressão para este fenômeno – provavelmente “troca de carreiras” seja um termo mais adequado.

Assim sendo, vamos reformular a pergunta que está no título desta coluna: como saber a hora de trocar de profissão?

O importante, nessas horas, é ser honesto e sincero consigo mesmo: não seria o momento de seguir uma nova carreira? De se transformar em um mentor? Tenho um grande amigo que saiu do mundo publicitário e hoje é um consagrado escritor de empreendedorismo (acaba de lançar uma obra neste mês). Talvez ele trabalhe hoje, por conta própria, mais do que na época em que dirigia agências de publicidade.

As gerações atuais de idosos são bem diferentes daquelas que viveram nas décadas passadas. Essas pessoas não querem ficar em casa de pijama, vendo o tempo passar. Querem produzir e se divertir – não necessariamente nessa ordem.

Por isso, o jovem Sebastian Vettel, apesar de dizer que pretende testemunhar o crescimento de seus filhos, vai seguramente encontrar uma nova profissão. E permanecer produtivo por décadas e décadas.

P.S.: A quem duvida do talento de Vettel e credita suas conquistas apenas à superioridade técnica das equipes pelas quais passou, uma dica: procure no YouTube a corrida que ele fez no circuito de Monza em 2008. Correndo pela pequena Toro Rosso, com DNA da antiga Minardi, ele obteve a pole-position e uma vitória incontestável.

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Aluizio Falcão Filho

Ontem, o tetracampeão de Fórmula-1, Sebastian Vettel (imagem), anunciou sua aposentadoria. Disse que seus objetivos tinham mudado. Antes, suas prioridades eram ganhar corridas e conquistar campeonatos. Agora, seu foco está em ver seus filhos crescerem, além de ajudá-los e ouvi-los nos momentos difíceis.

O esporte é cruel e fugaz. Muitas vezes descarta atletas que estão no auge físico e intelectual, como Vettel, de apenas 35 anos. O piloto alemão vinha sendo, nos últimos dois anos, uma das vozes mais interessantes do grid. Há algum tempo ele parecia vir pensando na hipótese de parar – e abandonou a tradicional politicagem que a maioria dos pilotos fazem, sendo bastante franco, mas sem perder a leveza.

Vettel obteve quatro títulos na F-1, na Red Bull, e foi contratado a peso de ouro para correr pela Ferrari. O plano da escuderia italiana era fazer dele um novo Michael Schumacher, que obteve sete títulos mundiais. Mas o alemão foi aos poucos vergado pelo estresse e pela pressão por resultados, cometendo erros bobos e perdendo feio para Lewis Hamilton, que aproveitou de forma soberba a ascensão da equipe Mercedes neste mesmo período. Lembram-se do Grande Prêmio de Montreal, quando ele cruzou a pista em primeiro, mas foi penalizado em 5 segundos e trocou as placas de classificação? E no GP de Baku, quando ele se irritou com Hamilton durante a entrada de um safety car? Ele emparelhou com a Mercedes e deu um “chega pra lá” no colega de profissão.

Este comportamento mostra alguém sob estresse total, o que o levou a uma temporada pífia em 2020, chegando constantemente atrás do novato Charles Leclerc. Nos últimos dois anos, na Aston Martin, relaxou e passou à condição de boa praça. Percebeu erros e limitações e entrou em uma fase zen.

Sua atitude me fez lembrar a de John Lennon, que passou boa parte dos anos 1970 fora do circuito musical, cuidando de seu filho Sean. Lennon percebeu que precisava de um tempo para si mesmo. Voltaria, alguns anos depois, com o disco Double Fantasy, revigorado pela pausa (infelizmente, foi morto logo depois).

A atitude de Vettel pode ser trazida para o ambiente profissional? Sim. Mas, como a vida executiva é muito mais elástica que a esportiva, quando parar?

Não são todos que podem desacelerar quando têm vontade. Mas, entre aqueles que possuem condições, quando é a hora certa? No mundo em que vivemos, sexagenários, septuagenários e octogenários têm energia de sobra para trabalhar com afinco. Evidentemente, a performance pode não ser a mesma de um jovem de 30 anos, mas a experiência pode representar um diferencial importante. Portanto, “parar de trabalhar” talvez não seja a melhor expressão para este fenômeno – provavelmente “troca de carreiras” seja um termo mais adequado.

Assim sendo, vamos reformular a pergunta que está no título desta coluna: como saber a hora de trocar de profissão?

O importante, nessas horas, é ser honesto e sincero consigo mesmo: não seria o momento de seguir uma nova carreira? De se transformar em um mentor? Tenho um grande amigo que saiu do mundo publicitário e hoje é um consagrado escritor de empreendedorismo (acaba de lançar uma obra neste mês). Talvez ele trabalhe hoje, por conta própria, mais do que na época em que dirigia agências de publicidade.

As gerações atuais de idosos são bem diferentes daquelas que viveram nas décadas passadas. Essas pessoas não querem ficar em casa de pijama, vendo o tempo passar. Querem produzir e se divertir – não necessariamente nessa ordem.

Por isso, o jovem Sebastian Vettel, apesar de dizer que pretende testemunhar o crescimento de seus filhos, vai seguramente encontrar uma nova profissão. E permanecer produtivo por décadas e décadas.

P.S.: A quem duvida do talento de Vettel e credita suas conquistas apenas à superioridade técnica das equipes pelas quais passou, uma dica: procure no YouTube a corrida que ele fez no circuito de Monza em 2008. Correndo pela pequena Toro Rosso, com DNA da antiga Minardi, ele obteve a pole-position e uma vitória incontestável.

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