É preciso desolavizar nossas relações exteriores
Assim como em tudo mais que tocaram, os olavistas demonstram apenas a mais pura incompetência
Bibiana Guaraldi
Publicado em 27 de novembro de 2020 às 08h45.
Última atualização em 27 de novembro de 2020 às 10h06.
Quem será a mente brilhante por trás de nossa estratégia internacional? Em poucas semanas, o Brasil: se recusou a parabenizar o presidente-eleito americano, ao mesmo tempo em que ameaçou os EUA com nosso poderio militar em caso de desentendimentos quanto à Amazônia. Piorou o mal-estar com França e Alemanha, novamente ligado ao desmatamento e aos incêndios na Amazônia. Por fim, graças a novas declarações de Eduardo Bolsonaro (que é o chefe de facto de nossas relações exteriores), voltamos a criar atritos com a China, ligados à escolha do 5G. Em suma, compramos briga simultaneamente com EUA, União Europeia e China. Brilhante!
Na mente do governo, falar grosso e fazer bravata no plano internacional são vistos como vitórias em si mesmo, ainda que nos afastem de nossos objetivos. Queremos firmar o acordo comercial com a Europa, queremos o melhor negócio possível para o 5G no Brasil; isso fica em segundo plano para a possibilidade de “fazer bonito” nas redes sociais. Do ponto de vista do governo, faz sentido mesmo: é com esse teatrinho que Bolsonaro mantém sua base feliz e mobilizada. Mas está nos afundando de maneira séria.
O problema é que nossas relações internacionais continuam nas mãos da chamada ala olavista. Assim como em tudo mais que tocaram, os olavistas demonstram apenas a mais pura incompetência. Não trazem resultado nenhum, e promovem apenas intriga e conflito por onde passam. Com eles, o fracasso é certo.
O tempo de brincadeira acabou. O governo, confrontado com uma possibilidade real de impeachment na primeira metade do ano, abraçou-se ao centrão, e teve que reduzir a influência dos olavistas na Educação e da comunicação oficial. Não dá para dizer que essas áreas sejam, agora, um grande sucesso; mas só de não termos mais um Ministro de Estado xingando a mãe de cidadãos no Twitter e celebrando o corte de verba de universidades já é algo positivo.
Os seguidores de Olavo de Carvalho continuam entrincheirados, contudo, nas relações internacionais. Enquanto Trump estava no poder, eles tinham um salvo-conduto para levar adiante seu mix de bajulação, intriga, bravata e fake news.
Eduardo Bolsonaro acusou a China de espionagem. O embaixador chinês usou o meio que o governo brasileiro mais gosta - as redes sociais - para escalar o discurso. E agora, vamos fazer o que? Se China e EUA querem ter o Brasil a seu lado no 5G, cabe a nós receber propostas dos dois lados e escolher a que nos parecer melhor, juntando critérios econômicos, tecnológicos e considerações geopolíticas. Jogar-se no colo dos americanos e rejeitar os chineses na largada é garantir que ficaremos dependentes dos EUA, aceitando qualquer coisa que venha deles.
Com Trump, essa estratégia já era ruim; ficávamos à espera de migalhas. Com a vitória de Biden, a maré virou. Os EUA voltam a defender a ordem mundial liberal - baseada em regras e órgãos multilaterais - que eles próprios criaram no pós-guerra e consolidaram com o fim da Guerra Fria.
Neste momento, a pauta ambiental ganha importância renovada no mundo. A rivalidade entre EUA e China deve se manter, mas agora de maneira mais previsível. Biden quer enquadrar a China nas regras internacionais (econômicas, ambientais), e não apenas fazer um cabo de guerra comercial com desfecho incerto. É o momento do Brasil deixar de lado o amadorismo de Eduardo Bolsonaro e Ernesto Araújo e resgatar seus quadros de excelência, graças aos quais o Itamaraty e a diplomacia brasileira são referência mundial.
Não há cruzada global para defender a fé cristã. Trump não era um enviado de Deus numa missão sagrada. O tal do “globalismo”, o grande inimigo, sequer existe. Tudo isso eram mistificações de discurso usadas para justificar uma subserviência automática à agenda da extrema direita americana, a quem os olavistas servem (é curioso notar o fascínio deslumbrado de Eduardo e Carlos Bolsonaro com os EUA). O mundo é complexo, os desafios políticos, comerciais e ambientais são enormes e o Brasil corre o risco sério de ficar isolado. O tempo da pirraça acabou. É preciso desolavizar nossas relações exteriores.
Quem será a mente brilhante por trás de nossa estratégia internacional? Em poucas semanas, o Brasil: se recusou a parabenizar o presidente-eleito americano, ao mesmo tempo em que ameaçou os EUA com nosso poderio militar em caso de desentendimentos quanto à Amazônia. Piorou o mal-estar com França e Alemanha, novamente ligado ao desmatamento e aos incêndios na Amazônia. Por fim, graças a novas declarações de Eduardo Bolsonaro (que é o chefe de facto de nossas relações exteriores), voltamos a criar atritos com a China, ligados à escolha do 5G. Em suma, compramos briga simultaneamente com EUA, União Europeia e China. Brilhante!
Na mente do governo, falar grosso e fazer bravata no plano internacional são vistos como vitórias em si mesmo, ainda que nos afastem de nossos objetivos. Queremos firmar o acordo comercial com a Europa, queremos o melhor negócio possível para o 5G no Brasil; isso fica em segundo plano para a possibilidade de “fazer bonito” nas redes sociais. Do ponto de vista do governo, faz sentido mesmo: é com esse teatrinho que Bolsonaro mantém sua base feliz e mobilizada. Mas está nos afundando de maneira séria.
O problema é que nossas relações internacionais continuam nas mãos da chamada ala olavista. Assim como em tudo mais que tocaram, os olavistas demonstram apenas a mais pura incompetência. Não trazem resultado nenhum, e promovem apenas intriga e conflito por onde passam. Com eles, o fracasso é certo.
O tempo de brincadeira acabou. O governo, confrontado com uma possibilidade real de impeachment na primeira metade do ano, abraçou-se ao centrão, e teve que reduzir a influência dos olavistas na Educação e da comunicação oficial. Não dá para dizer que essas áreas sejam, agora, um grande sucesso; mas só de não termos mais um Ministro de Estado xingando a mãe de cidadãos no Twitter e celebrando o corte de verba de universidades já é algo positivo.
Os seguidores de Olavo de Carvalho continuam entrincheirados, contudo, nas relações internacionais. Enquanto Trump estava no poder, eles tinham um salvo-conduto para levar adiante seu mix de bajulação, intriga, bravata e fake news.
Eduardo Bolsonaro acusou a China de espionagem. O embaixador chinês usou o meio que o governo brasileiro mais gosta - as redes sociais - para escalar o discurso. E agora, vamos fazer o que? Se China e EUA querem ter o Brasil a seu lado no 5G, cabe a nós receber propostas dos dois lados e escolher a que nos parecer melhor, juntando critérios econômicos, tecnológicos e considerações geopolíticas. Jogar-se no colo dos americanos e rejeitar os chineses na largada é garantir que ficaremos dependentes dos EUA, aceitando qualquer coisa que venha deles.
Com Trump, essa estratégia já era ruim; ficávamos à espera de migalhas. Com a vitória de Biden, a maré virou. Os EUA voltam a defender a ordem mundial liberal - baseada em regras e órgãos multilaterais - que eles próprios criaram no pós-guerra e consolidaram com o fim da Guerra Fria.
Neste momento, a pauta ambiental ganha importância renovada no mundo. A rivalidade entre EUA e China deve se manter, mas agora de maneira mais previsível. Biden quer enquadrar a China nas regras internacionais (econômicas, ambientais), e não apenas fazer um cabo de guerra comercial com desfecho incerto. É o momento do Brasil deixar de lado o amadorismo de Eduardo Bolsonaro e Ernesto Araújo e resgatar seus quadros de excelência, graças aos quais o Itamaraty e a diplomacia brasileira são referência mundial.
Não há cruzada global para defender a fé cristã. Trump não era um enviado de Deus numa missão sagrada. O tal do “globalismo”, o grande inimigo, sequer existe. Tudo isso eram mistificações de discurso usadas para justificar uma subserviência automática à agenda da extrema direita americana, a quem os olavistas servem (é curioso notar o fascínio deslumbrado de Eduardo e Carlos Bolsonaro com os EUA). O mundo é complexo, os desafios políticos, comerciais e ambientais são enormes e o Brasil corre o risco sério de ficar isolado. O tempo da pirraça acabou. É preciso desolavizar nossas relações exteriores.