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Biden: bom para os EUA, essencial para o mundo

Um voto em Biden/Kamala é uma aposta na decência pessoal e na institucionalidade contra um governo que corrói o tecido social e as instituições americanas

Joe Biden: segundo pesquisa do Pew Research, seu principal ponto forte é não ser Donald Trump (Brendan McDermid/File Photo/Reuters)
Joe Biden: segundo pesquisa do Pew Research, seu principal ponto forte é não ser Donald Trump (Brendan McDermid/File Photo/Reuters)
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Joel Pinheiro da Fonseca

Publicado em 21 de agosto de 2020 às, 07h02.

Enquanto o governo escapa de uma bomba de irresponsabilidade plantada pelo Senado, podemos respirar aliviados por um momento, esquecendo momentaneamente que o desafio segue monumental. Olhemos um pouco para fora, para os EUA, onde se desenha a disputa da qual o destino do mundo - e o nosso - depende.

Joe Biden não é o candidato à presidência mais excitante da história dos EUA. Em uma pesquisa do Pew Research Center, conduzida entre fins de julho e início de agosto, dos eleitores que planejam votar em Biden, 56% deram como um dos motivos de seu voto o fato de ele “não ser Trump”. Num distante segundo lugar, com 19%, estava sua capacidade de liderança e desempenho.

Apesar de não animar o eleitorado, as pesquisas continuam muito favoráveis para o candidato Democrata. Na projeção do FiveThirtyEight, o principal site de estatísticas, Biden vence em 72 dos 100 cenários que o modelo deles vê como possíveis. Isso está longe de ser uma certeza - basta lembrar que eles davam a Hillary a probabilidade de cerca de 70% de vitória para Hillary às vésperas da eleição de 2016. Na eleição americana, algumas centenas de milhares de votos em estados decisivos pode fazer toda a diferença; e milhões de votos a mais em estados já precificados não valem nada.

Um voto para a chapa Biden e Kamala Harris é uma aposta na decência pessoal e na institucionalidade contra um governo que rapidamente corrói o tecido social e as instituições americanas, liderado por um presidente notoriamente corrupto em sua trajetória. Acusar os Correios de quererem fraudar as eleições é só o mais recente truque sujo de um presidente que, mais do que nenhum outro, rebaixou o nível moral de seu cargo, isso sem falar no fracasso monstruoso de seu combate ao coronavírus. Em seu discurso de quinta-feira, aceitando a nomeação como candidato do Partido Democrata, Biden se colocou como o exato oposto de Trump: união contra divisão, competência e seriedade contra improviso, amor ao próximo contra ódio e ganância.

Trump termina seu primeiro mandato com um país devastado pelo coronavirus, déficits galopantes (que serviram, em sua maioria, para bancar cortes de impostos aos mais ricos), expectativa de vida em queda - algo raro na história do mundo - e uma sociedade profundamente dividida e com a confiança mútua corroída, radicalismo em alta.

O mesmo cenário vale globalmente. Sob Trump, os EUA deixaram de ser o bastião da ordem mundial liberal - que os próprios americanos criaram no pós-guerra -, e se tornou um de seus sabotadores. Temos um mundo mais instável, mais egoísta, em que regras internacionais estão enfraquecidas. Sob Bolsonaro, o Brasil decidiu virar o capacho desta potência agora errática e individualista.

Trump retorna o amor de Bolsonaro fazendo gato e sapato de nós. Sabe que Bolsonaro se isolou do mundo todo, que dependemos dele e que portanto Bolsonaro não o irá abandonar. Ao mesmo tempo, com os países mais hostis, a rede de comércio internacional se enfraquece, dificultando nossa entrada nessa rede. A mudança do presidente americano nos obrigará a confrontar o isolamento no qual nos colocamos, e a mudar de postura. Lembremos que Steve Bannon, o ideólogo por trás do nacionalismo anti-global que nos norteia, foi preso esses dias por fraude financeira. A fraude maior, contudo, foi ter convencido tanta gente de que promover o “cada um por si” em vez da cooperação entre as nações democráticas do globo poderia ter qualquer outro efeito que não o fortalecimento do autoritarismo. E que o Brasil, que nem de longe é uma das nações mais fortes do mundo, se beneficia muito mais com regras e diplomacia do que com a lei da selva.

Os EUA e o mundo não podem se dar ao luxo de mais quatro anos destrutivos com Trump: desordem, incompetência, corrupção, desastre. As chances de Biden são boas; parece haver um desejo no eleitorado por decência e cuidado com o próximo. Ainda traumatizados por 2016, no entanto, é melhor segurar essa torcida até que as urnas sejam apuradas em novembro.