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Estudante negra premiada na UnB não se preocupa com cor de sua pele

Oi pessoal, O texto abaixo foi publicado hoje no Correio Braziliense. Fala de uma estudante negra da UnB, moradora de cidade satélite do Distrito Federal, que venceu importante prêmio de graduação (do PIBIC). Ela quer ser reconhecida pelo seu mérito acadêmico (coisa cada vez mais esquecida na UnB, onde o ultra-esquerdismo domina), independente da cor de sua pele. . Eu estava na cerimônia onde a aluna foi premiada. Gabriela, a […] Leia mais

DR

Da Redação

Publicado em 24 de outubro de 2009 às 10h31.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 13h05.

Oi pessoal,
O texto abaixo foi publicado hoje no Correio Braziliense. Fala de uma estudante negra da UnB, moradora de cidade satélite do Distrito Federal, que venceu importante prêmio de graduação (do PIBIC). Ela quer ser reconhecida pelo seu mérito acadêmico (coisa cada vez mais esquecida na UnB, onde o ultra-esquerdismo domina), independente da cor de sua pele.
.
Eu estava na cerimônia onde a aluna foi premiada.

Gabriela, a UnB profunda e o Brasil
por José Flávio Sombra Saraiva, Prof da UnB

Universidade de Brasília, quarta-feira, 21 de outubro de 2009, 20h12. Sob os trovões do verão antecipado do Planalto Central do Brasil e as frestas úmidas das paredes do grande cenário, a jovem Gabriela desceu as escadas do Auditório 4 do Instituto Central de Ciências da UnB. Agarrada às mãos de seu orientador de pesquisa na graduação, Gabriela era semblante forte, elegante em seus trajes, olhar sereno sobre a audiência, autoconfiante. Sem pedir licença, Gabriela recebeu o prêmio do melhor trabalho científico apresentado, na área de ciências humanas e artes, no Congresso de Iniciação Científica da UnB e do Congresso de Iniciação Científica do Distrito Federal.

Seu orientador, professor titular por concurso público da UnB, portador de mais de duas décadas de serviços prestados a instituição, não escondeu as lágrimas da emoção. Seus colegas, na primeira fila do auditório, reconheceram, em acenos, a alegria da vitória merecida. Sua amiga Aline, a representante convocada pela urgência da família, registrava o momento, sem açodamento, em fotos para a posteridade. Recebia Gabriela o diploma mais importante da graduação para a área de ciências humanas da UnB para o ano de 2009. Cumprimentos da banca, do professorado, da representante do CNPq, do reitor.

Depois de duas horas de atos secundários, burburinhos, discursos, certo cansaço, o auditório semiocupado, mas em silêncio obsequioso, ovacionava a afro-brasileira, moradora de uma cidade satélite de Brasília, estudante de curso de elite, o de Relações Internacionais, terceiro em concorrência no vestibular da UnB. Gabriela foi a primeira estudante do curso de Relações Internacionais da UnB a receber o merecido prêmio, medido por banca externa, alheia às políticas internas de departamentos e institutos da UnB.

Gabriela é orgulho de seus mestres e colegas. Ela sabia que, na comunidade de mais de 30 mil estudantes de graduação da UnB, ao lado de outros dois colegas das área de ciências exatas e da vida, era ela o centro do mérito científico, símbolo do que deve ser a universidade, sem concessões ao poder que passa.

Qual o significado daquela noite? Para a educação nacional, a lembrança de que o mérito acadêmico, ainda que eventualmente obliterado pelas políticas de ocasião, segue sendo um valor universal e um projeto relevante para um país que se deseja democrático e desejoso de fazer parte da construção dos padrões elevados de produção científica de impacto social e transformador da realidade que vivemos. Para a Universidade de Brasília, o alerta de que nem sempre o que ocorre na área do poder administrativo tem reflexo na UnB acadêmica e profunda.
.
Gabriela não é militante política, não sobe rampas para derrubar reitor, não é dada à política partidária. Gabriela é fruto da UnB profunda, da dedicação, da serenidade científica, do esforço noite a dentro, do silêncio da mesa de trabalho. Essa é a experiência que gerou seu orientador, em outros tempos, mais duros que os de hoje, e que expõe o que de melhor tem o Brasil no mapeamento da ciência nacional e seus impactos na competividade científica mundial. As universidades públicas nacionais foram para tal meta criadas.

Gabriela, no que tange a sua epiderme, não reivindica a afro-brasilidade para avançar privilégios, mas apenas a honestidade de sua brasilidade. Gabriela, aluna de escolas públicas na fase da educação básica, quer servir ao Brasil, quer ser diplomata. Não tem recalques nem quer recompensas nem esmolas. Quer transformar seu problema científico — a cooperação do Brasil com os países da franja atlântica africana — em resultantes práticas e nobres à inserção internacional do Brasil. Gabriela, menina da Brasília dos tempos que temos, toma tempo para a salsa caribenha, para os amigos africanos, para o mundo que desperta em suas inquietações intelectuais. Não gosta de ser confundida com africanos, ainda que tenha na África muitos amigos, como o próprio orientador.

Gabriela é, portanto, o que temos de melhor na UnB. Brasília, ao se aproximar dos seus 50 anos, idade do professor que a orientou no projeto que a levou a tal prêmio, deve a Gabriela a simples lição de que é melhor seguir os caminhos simples, do estudo, da perseverança, aos caminhos tortuosos da política universitária como fim, como projeto egoísta, como meio rápido para o acesso ao poder. Gabriela é uma esperança. Gabriela é uma possibilidade para um Brasil distinto, mais verdadeiro, mais nosso, da gente que pensa que as coisas mudam com atos, esforços, noites de estudo, certa disciplina acadêmica, respeito aos mestres, indiferença aos aventureiros.

O autor é Ph.D. pela Universidade de Birmingham, Inglaterra, professor titular em relações internacionais da UnB e pesquisador 1 do CNPq.

(Publicado emCiência Brasil)

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Oi pessoal,
O texto abaixo foi publicado hoje no Correio Braziliense. Fala de uma estudante negra da UnB, moradora de cidade satélite do Distrito Federal, que venceu importante prêmio de graduação (do PIBIC). Ela quer ser reconhecida pelo seu mérito acadêmico (coisa cada vez mais esquecida na UnB, onde o ultra-esquerdismo domina), independente da cor de sua pele.
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Eu estava na cerimônia onde a aluna foi premiada.

Gabriela, a UnB profunda e o Brasil
por José Flávio Sombra Saraiva, Prof da UnB

Universidade de Brasília, quarta-feira, 21 de outubro de 2009, 20h12. Sob os trovões do verão antecipado do Planalto Central do Brasil e as frestas úmidas das paredes do grande cenário, a jovem Gabriela desceu as escadas do Auditório 4 do Instituto Central de Ciências da UnB. Agarrada às mãos de seu orientador de pesquisa na graduação, Gabriela era semblante forte, elegante em seus trajes, olhar sereno sobre a audiência, autoconfiante. Sem pedir licença, Gabriela recebeu o prêmio do melhor trabalho científico apresentado, na área de ciências humanas e artes, no Congresso de Iniciação Científica da UnB e do Congresso de Iniciação Científica do Distrito Federal.

Seu orientador, professor titular por concurso público da UnB, portador de mais de duas décadas de serviços prestados a instituição, não escondeu as lágrimas da emoção. Seus colegas, na primeira fila do auditório, reconheceram, em acenos, a alegria da vitória merecida. Sua amiga Aline, a representante convocada pela urgência da família, registrava o momento, sem açodamento, em fotos para a posteridade. Recebia Gabriela o diploma mais importante da graduação para a área de ciências humanas da UnB para o ano de 2009. Cumprimentos da banca, do professorado, da representante do CNPq, do reitor.

Depois de duas horas de atos secundários, burburinhos, discursos, certo cansaço, o auditório semiocupado, mas em silêncio obsequioso, ovacionava a afro-brasileira, moradora de uma cidade satélite de Brasília, estudante de curso de elite, o de Relações Internacionais, terceiro em concorrência no vestibular da UnB. Gabriela foi a primeira estudante do curso de Relações Internacionais da UnB a receber o merecido prêmio, medido por banca externa, alheia às políticas internas de departamentos e institutos da UnB.

Gabriela é orgulho de seus mestres e colegas. Ela sabia que, na comunidade de mais de 30 mil estudantes de graduação da UnB, ao lado de outros dois colegas das área de ciências exatas e da vida, era ela o centro do mérito científico, símbolo do que deve ser a universidade, sem concessões ao poder que passa.

Qual o significado daquela noite? Para a educação nacional, a lembrança de que o mérito acadêmico, ainda que eventualmente obliterado pelas políticas de ocasião, segue sendo um valor universal e um projeto relevante para um país que se deseja democrático e desejoso de fazer parte da construção dos padrões elevados de produção científica de impacto social e transformador da realidade que vivemos. Para a Universidade de Brasília, o alerta de que nem sempre o que ocorre na área do poder administrativo tem reflexo na UnB acadêmica e profunda.
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Gabriela não é militante política, não sobe rampas para derrubar reitor, não é dada à política partidária. Gabriela é fruto da UnB profunda, da dedicação, da serenidade científica, do esforço noite a dentro, do silêncio da mesa de trabalho. Essa é a experiência que gerou seu orientador, em outros tempos, mais duros que os de hoje, e que expõe o que de melhor tem o Brasil no mapeamento da ciência nacional e seus impactos na competividade científica mundial. As universidades públicas nacionais foram para tal meta criadas.

Gabriela, no que tange a sua epiderme, não reivindica a afro-brasilidade para avançar privilégios, mas apenas a honestidade de sua brasilidade. Gabriela, aluna de escolas públicas na fase da educação básica, quer servir ao Brasil, quer ser diplomata. Não tem recalques nem quer recompensas nem esmolas. Quer transformar seu problema científico — a cooperação do Brasil com os países da franja atlântica africana — em resultantes práticas e nobres à inserção internacional do Brasil. Gabriela, menina da Brasília dos tempos que temos, toma tempo para a salsa caribenha, para os amigos africanos, para o mundo que desperta em suas inquietações intelectuais. Não gosta de ser confundida com africanos, ainda que tenha na África muitos amigos, como o próprio orientador.

Gabriela é, portanto, o que temos de melhor na UnB. Brasília, ao se aproximar dos seus 50 anos, idade do professor que a orientou no projeto que a levou a tal prêmio, deve a Gabriela a simples lição de que é melhor seguir os caminhos simples, do estudo, da perseverança, aos caminhos tortuosos da política universitária como fim, como projeto egoísta, como meio rápido para o acesso ao poder. Gabriela é uma esperança. Gabriela é uma possibilidade para um Brasil distinto, mais verdadeiro, mais nosso, da gente que pensa que as coisas mudam com atos, esforços, noites de estudo, certa disciplina acadêmica, respeito aos mestres, indiferença aos aventureiros.

O autor é Ph.D. pela Universidade de Birmingham, Inglaterra, professor titular em relações internacionais da UnB e pesquisador 1 do CNPq.

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