Ética e resiliência norteiam a trajetória rumo ao sucesso, afirma Daniela Manique
Na coluna desta semana, conheça a história de Daniela Manique, presidente da GBU COATIS
Colunista
Publicado em 8 de dezembro de 2023 às 12h28.
Sinto-me honrada ao averiguar como obtive enorme êxito na edificação dessa magnífica trajetória, como uma líder bem-sucedida e realizada. Desde jovem, sabia qual seria a minha vocação, portanto, tratei de me empenhar com ética, perseverança, resiliência e determinação para alcançar todos os meus objetivos. Com mais de 25 de carreira, atualmente ocupo com orgulho a cadeira de presidente para América Latina do Grupo Solvay.
Natural de São Paulo, nasci em24/01/1974, sou casada com oJimir, e somos pais daCarolinade 12 anos. Sem dúvida, a influência familiar foi decisiva no momento de escolher a carreira, haja vista que o meu pai Márcio e meu irmão são engenheiros metalúrgicos e por esta razão a vocação para a indústria era bastante forte. Já a minha mãe Sônia é psicóloga e sempre me incentivou e proveu o suporte para alavancar as minhas ambições.
Durante o ensino médio, já havia decidido que cursaria Engenharia Química e assim ingressei na Faculdade de Engenharia Industrial ( FEI ), conceituada instituição, contemplada por uma bolsa estudantil, devido ao ótimo resultado obtido no vestibular. Tentei entrar na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo ( Poli-USP ), e tive de lidar com a frustração por não ter sido aprovada – o nervosismo no dia da prova me atrapalhou. Todavia, meu pai e meu irmão também estudaram na FEI, ou seja, há toda uma cultura por trás, e reitero como é um curso bastante exigente.
Pontuo como apreciava observar como as coisas se transformavam e logo coloquei como prioridade atuar em uma indústria química. Talvez, por conta do destino, sucedeu de me encontrar no segmento petroleiro, algo que até assusta as pessoas. Porém, sabendo atuar de forma correta, seguindo princípios sólidos, englobando as novas tecnologias e inovações do setor, aplicando-se na direção do carbono neutro, o petróleo torna-se uma fonte de energia que provém melhorias na qualidade de vida.
A paixão pelo ofício e os desafios iniciais como executiva
Há formas de dirimir essa pecha associada ao petróleo, inclusive, por ser utilizado na estruturação de coisas importantes, como na produção de próteses, com materiais bem nobres. Nos últimos anos, temos trabalhado bastante na linha da “química verde”, e observamos como desfrutamos de oportunidades fantásticas de utilizar matérias-primas renováveis.
Saliento como na minha procura por estágio deparei-me como uma situação desagradável, de preconceito, ao entrar em contato com uma pequena metalúrgica. O senhor que me atendeu rispidamente disse: “Mandaram uma menina?!”, como se fosse a coisa mais absurda do mundo. Ele afirmou que sequer havia banheiro feminino na empresa. Felizmente, foi a única vez que sofri com isso.
Sequer me preocupei com esse fato, pois, logo na sequência, fui chamada para participar dos programas de estágio da Shell, e da própria Rhodia, empresa do Grupo Solvay no Brasil. Assim, iniciei a minha jornada na Shell, apesar de que a esta já havia estabelecido o contato inicial com a Rhodia. Exalto como o período de trainee serviu como uma excelente escola, muito importante na lapidação do perfil.
Ao participar do processo de rotatividade de áreas obtive as noções intrínsecas de diferentes segmentos, como importação e exportação, logística, fábrica, projetos, finanças, enfim, percebi com o que me adequava mais. Devidamente efetivada, completei sete anos de companhia, até migrar para a Ultragaz, significando outra vivência especial, inclusive, pelo fato de a empresa ter me ajudado em termos de formação, por meio do MBA realizado na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Contudo, estava decidida a ingressar em uma multinacional – um sonho acalentado desde jovem – e realizei esse movimento, em 2006. Um head hunter me contou sobre a oportunidade na Solvay e sequer hesitei ao aceitar o convite. O grupo já era uma referência para mim e, desta maneira, iniciei a minha trajetória na corporação.
A mentoria é primordial no planejamento da carreira
Acredito muito em mentoria, especialmente com as mulheres guarnecendo o exemplo. Em 2009, quando estava prestes a me casar, fui convidada para uma expatriação na França, mas não pretendia atrasar os meus projetos pessoais, porque já pensava em ter filhos. Contei com o amplo suporte do meu líder à época, o José Borges Matias, que assegurou como não haveria dificuldades em termos de logística. Por fim, deu tudo certo – regressei ao Brasil antes do prazo, já para assumir a diretoria de compras. Além disso, a minha filha nasceu em solo brasileiro.
Menciono como o José Matias foi o meu líder e tive o prazer e a honra de sucedê-lo na presidência, em 2018. Ele e o Elder Martini – outro gestor excepcional – me inspiraram fortemente. Além disso, vislumbram o meu potencial, de que poderia alcançar uma alta posição na empresa.
Destaco uma ocasião na qual houve uma reunião com várias mulheres CEOs e a consultora responsável perguntou quantas de nós precisaram ouvir de um homem que detínhamos a aptidão para alcançarmos posições de liderança. Todas levantaram a mão, mas, à época, tratava-se de uma realidade diferente.
O cenário atual é outro, requer contar com resiliência, dedicação, porque todas têm possibilidades de alcançar o sucesso, conquistar posições notáveis, desde que estejam preparadas para assumir os desafios propostos.
Gosto de prover mentoria e tenho duas pessoas com quem realizo esse trabalho. Trato de enfatizar como se prioriza o foco, tendo em vista estar preparada, seja com treinamentos ou novas formações. Com o planejamento adequado, cobrindo eventuais gaps, a pessoa se encontrará em uma situação privilegiada quando a chance surgir. Recebi esses ensinamentos dos meus mentores e trato de transmiti-los adiante; é uma missão.
O valor do equilíbrio entre vida pessoal e profissional
O retorno da licença-maternidade ficou marcado como um grande desafio. Após quatro meses de afastamento, retomei as minhas atividades, mas imbuída por um sentimento diferenciado, ao deixar minha filha em casa. Nestes casos, o suporte familiar é essencial para evitar desgastes desnecessários. Também obtive a ajuda de um palestrante, que conseguiu me mostrar como conseguiria conciliar a vida profissional, com êxito, sendo uma boa mãe – são ações conectadas.
Amo o meu trabalho e sinto-me plenamente realizada. Volto para casa feliz, e dou o máximo de amor à minha filha, equilibrando a vida pessoal com a profissional. Ela me cita como exemplo, para suas amigas, especialmente quando saio em jornais, ou seja, sou uma referência para ela. O meu marido, por ser advogado, viaja menos e nossa filha até questiona o motivo pelo qual não mudo de trabalho. Enfim, ao conciliar sucesso profissional com o sucesso pessoal, amparada por estímulos e positividade, tudo se torna possível.
Evidentemente, nem sempre tudo ocorre perfeitamente, pois é impossível receber somente feedbacks positivos. Pondero, contudo, como os feedbacks negativos são fundamentais para contribuir na carreira. Deparei-me com um momento em que a equipe solicitou que brigasse mais por eles, com foco em um investimento mais alto para determinado projeto. Se as pessoas ao seu redor não falarem nada, tudo estagna, ou seja, são momentos de aprendizado e sigo amealhando conhecimentos constantemente – ninguém vive apenas com elogios.
Tendo em vista essa linha de raciocínio, assevero como a minha preocupação com a geração atual passa pela falta de resiliência, pois os jovens se lamentam por qualquer motivo. As lideranças antigas eram mais severas - às vezes com exageros - mas contribuíam em termos de trabalhar a resiliência, o comprometimento e dedicação nas empreitadas.
O compromisso inegociável com as pautas do ESG
Considero como um projeto que me deixou bastante feliz, englobando a biodiversidade, resultou com o reconhecimento da ONG Wildlife Habitat Council (WHC), em 2021. No começo estudamos o projeto para analisar o nosso maior complexo, situado em Paulínia, no interior de São Paulo, para compreendermos como lidávamos com a biodiversidade, com o intuito de podermos contribuir com essa pauta. Obtivemos inúmeros aprendizados e verificamos que muitas das práticas que tínhamos já eram referências de mercado.
No primeiro ano em que nos inscrevemos no projeto, já recebemos a certificação Gold, algo inédito para uma indústria do setor, significando motivo de enorme orgulho. Apesar de ser uma base de matéria petroquímica, nos empenhamos em inovação, indo na direção do carbono neutro. Alcançamos 95% de neutralidade no polo de Paulínia, o maior da América Latina e o segundo da Solvay no mundo. E seguimos puxando as equipes para atingir a meta da Agenda 2030 da ONU antes do prazo estabelecido.
Empenhados na causa do crescimento sustentável, lançamos, em meados de 2023, duas linhas de produtos 100% carbono neutro, caracterizando uma inovação dentro da área petroquímica. Em uma frente, inovamos no nicho de têxteis, sendo que na outra, nos dedicamos à matéria-prima para solados de sapatos.
Assisti a um vídeo da Apple, e achei muito interessante, por se tratar de uma conversa do board real com a natureza. E no final, eles mostram um produto como sendo o primeiro carbono neutro. Mas relembro como conseguimos tal feito antes deles. É uma conquista imensa, por se tratar de um projeto bastante complexo, que demandou inúmeras conversas com a equipe. De fato, implementamos algo sério, comprovado e certificado, com todas as regulamentações atendidas.
Ao analisar o ESG, aponto três caminhos distintos, que dependem muito da região, por envolver a legislação de cada país. Na Europa e em alguns distritos dos Estados Unidos, a lei é a responsável por incentivar o movimento, além de haver mais conscientização da sociedade, do público consumidor.
Já no Brasil, vejo a questão individual como um vetor menos participativo. E, tampouco, há uma legislação sólida, atuante e arraigada como na Europa. Portanto, saliento como há uma terceira vertente, na qual as próprias empresas se dedicam ao ESG, vislumbrando como oportunidades, inclusive com a vastas possibilidades de prover longevidade aos negócios.
O Grupo Solvay tem mais de 160 anos de atuação. E não imagino que uma indústria química deste porte passará por mais de uma centena de anos sem estar extremamente comprometida com as práticas ESG. Tanto na questão do meio ambiente, utilizando o mínimo possível de recursos naturais, englobando extração de minérios, aproveitamento da água, quanto na questão de poluição e emissão de gás carbônico. De toda forma, está longe de ser uma pauta nova para nós – nossos cases extremamente bem-executados atestam a nossa robusta atuação.
Evidentemente, não é normal o que está acontecendo no mundo e, se continuar assim, não haverá planeta para as futuras gerações, para os meus netos. É preciso se ater às informações, cada vez mais disponibilizadas, o que ajuda na conscientização.
Ademais, ajuda até a atrair novos talentos para uma indústria que não é tão fashion. Desde que se aplique em sustentabilidade, caminhando na direção da neutralidade de carbono. Contamos com uma floresta cercando a principal fábrica, enfim, isso demonstra o alinhamento com as pautas, atuando com matérias-primas renováveis, na utilização do etanol, glicerina, o que nos diferencia da concorrência.
Flexibilidade e comprometimento são sólidos diferenciais
Acredito nas pessoas e preciso desses talentos, para prover benefícios econômicos para a organização. Ao atrair os melhores profissionais, com o intuito de estruturar o negócio de forma mais sólida, contemplamos os anseios individuais e do próprio grupo.
Destaco a flexibilidade e o comprometimento como habilidades comportamentais imprescindíveis no momento de estruturar um time. Recentemente, efetuamos mudanças nas lideranças, com reformulações consideráveis. E são pessoas com excelente formação, o que ajuda demais nesse processo.
A flexibilidade se mostrou como um diferencial quando decidimos alocar diferentes perfis em outras áreas, com o propósito de que esses indivíduos passassem a assumir diferente papéis. Já a lógica do comprometimento envolve assimilar o aspecto de sentir, em cada colaborador, os níveis de engajamento.
Contamos com pessoas que trabalham na empresa e pensam estar em seu próprio negócio. O profissional pode atuar com essa visão de dono dentro da organização, desde que tome decisões como se fosse com o seu dinheiro – trata-se do espírito de empreendedor e pode derivar em crescimento exponencial. Em uma multinacional, esse quesito é bem interessante, mas sem jamais exacerbar, pois há toda uma estrutura que deve ser respeitada.
O líder acolhedor gera engajamento e crescimento
Reitero como não existe mais espaço para o líder com o perfil de super-herói ou super-heroína. O líder é aquele que entende as suas vulnerabilidades, para poder contar com o apoio das pessoas dentro da equipe, visando a complementação. Não existe um líder que seja perfeito em absolutamente tudo, enfim, é preciso amealhar os conhecimentos no decorrer da jornada.
No meu caso, estou tentando me aprimorar em termos de tecnologia, como Inteligência Artificial, por exemplo. É pré-requisito contar com essa capacidade de diversificar – que vai além de gênero, abarcando a formação, perfis distintos, com pessoas mais arrojadas e outras de perfil conservador, pois tudo isso gera novas e distintas opiniões.
Alia-se a isso, a capacidade de ser acolhedor, para construir times vencedores, pois ninguém alcança o sucesso sozinho. Desta forma, também há abertura para se lidar com diferentes talentos e quem está à frente, percebe no que pode melhorar. Demanda estar mais próximo das equipes, como acontece por aqui, com diálogo amplo e assertivo. Houve uma transformação significativa na forma de se analisar a hierarquia, com menos burocracia, mais interlocução e proximidade entre os envolvidos, com o líder provendo suporte e ajuda.
Eventualmente, o sentimento de frustração, por se desconhecer determinado tema, vem à tona. Mas é inviável conhecer tudo a fundo. Saber lidar com as limitações, superar os eventuais obstáculos é muito importante. As novas gerações também se frustram, porque querem ascender rapidamente, mas isso requer experiência, vivência, maturidade – a carreira é um processo de planejamento.
Ética e resiliência norteiam a trajetória rumo ao sucesso
Dito isto, noto como a constante troca de emprego denota que a pessoa não consegue entregar sequer um projeto, pois está constantemente vislumbrando outras oportunidades – é uma ambição insalubre. Infelizmente, isso é bem recorrente – não raro, analiso currículos de jovens profissionais e me deparo com essas lacunas.
Considero como a resiliência deve sempre prevalecer. Todos convivemos com momentos difíceis, mas ao entregarmos o nosso melhor, em determinado momento o reconhecimento virá. No final, a empresa precisará de resultados robustos, e isso vêm das pessoas, independentemente do grau hierárquico e com a força coletiva.
Precisamos nos escutar, conectar mais, para que as ideias possam fluir. A quantidade de informações que temos hoje em dia é vultuosa – demanda ter um cuidado muito grande, especialmente para zelar pela reputação das empresas. Claro, estar antenado é importante, mas tomando cuidado com a apuração das notícias.
Além disso, assevero como a ética é um valor inegociável e exemplifico com uma passagem popular: “Nunca faça nada que você não tenha coragem de contar à sua mãe”, haja vista como explicita o erro. O nome deve ser honrado no mercado, atrelado à honestidade, ética, retidão, atuando com legalidade. É uma preocupação muito grande que tenho, pois quero ser reconhecida pelos meus valores – o meu legado se constitui a partir destes valores.
Encontrar o caminho da felicidade é o real propósito
“ É comum abordar o conceito do propósito, porém, saliento como o mais importante é a pessoa realmente gostar do que se propõe a realizar. O trabalho não pode gerar desânimo, algo desempenhado somente por obrigação. O primordial é apreciar de fato, com o intuito de gerar impacto na vida, com crescimento pessoal e profissional.
Enfim, o propósito é encontrar o que se ama, porque proverá coisas positivas para quem estará ao seu redor e ao planeta. Sou muito feliz com as minhas atribuições, com harmonia em todos os âmbitos. Todavia, atesto como a nova geração tem enorme dificuldade em encontrar esse ponto de equilíbrio, inclusive por culpa da ansiedade.
Por fim, requer saber dissociar o hobby do trabalho. Todo mundo terá a oportunidade de encontrar um caminho que lhe provenha a satisfação – basta acreditar, com resiliência e determinação. Caso contrário, busque outro caminho, inclusive para ser feliz, respaldando-se em encontrar forças para dar a volta por cima quando necessário.”
Sinto-me honrada ao averiguar como obtive enorme êxito na edificação dessa magnífica trajetória, como uma líder bem-sucedida e realizada. Desde jovem, sabia qual seria a minha vocação, portanto, tratei de me empenhar com ética, perseverança, resiliência e determinação para alcançar todos os meus objetivos. Com mais de 25 de carreira, atualmente ocupo com orgulho a cadeira de presidente para América Latina do Grupo Solvay.
Natural de São Paulo, nasci em24/01/1974, sou casada com oJimir, e somos pais daCarolinade 12 anos. Sem dúvida, a influência familiar foi decisiva no momento de escolher a carreira, haja vista que o meu pai Márcio e meu irmão são engenheiros metalúrgicos e por esta razão a vocação para a indústria era bastante forte. Já a minha mãe Sônia é psicóloga e sempre me incentivou e proveu o suporte para alavancar as minhas ambições.
Durante o ensino médio, já havia decidido que cursaria Engenharia Química e assim ingressei na Faculdade de Engenharia Industrial ( FEI ), conceituada instituição, contemplada por uma bolsa estudantil, devido ao ótimo resultado obtido no vestibular. Tentei entrar na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo ( Poli-USP ), e tive de lidar com a frustração por não ter sido aprovada – o nervosismo no dia da prova me atrapalhou. Todavia, meu pai e meu irmão também estudaram na FEI, ou seja, há toda uma cultura por trás, e reitero como é um curso bastante exigente.
Pontuo como apreciava observar como as coisas se transformavam e logo coloquei como prioridade atuar em uma indústria química. Talvez, por conta do destino, sucedeu de me encontrar no segmento petroleiro, algo que até assusta as pessoas. Porém, sabendo atuar de forma correta, seguindo princípios sólidos, englobando as novas tecnologias e inovações do setor, aplicando-se na direção do carbono neutro, o petróleo torna-se uma fonte de energia que provém melhorias na qualidade de vida.
A paixão pelo ofício e os desafios iniciais como executiva
Há formas de dirimir essa pecha associada ao petróleo, inclusive, por ser utilizado na estruturação de coisas importantes, como na produção de próteses, com materiais bem nobres. Nos últimos anos, temos trabalhado bastante na linha da “química verde”, e observamos como desfrutamos de oportunidades fantásticas de utilizar matérias-primas renováveis.
Saliento como na minha procura por estágio deparei-me como uma situação desagradável, de preconceito, ao entrar em contato com uma pequena metalúrgica. O senhor que me atendeu rispidamente disse: “Mandaram uma menina?!”, como se fosse a coisa mais absurda do mundo. Ele afirmou que sequer havia banheiro feminino na empresa. Felizmente, foi a única vez que sofri com isso.
Sequer me preocupei com esse fato, pois, logo na sequência, fui chamada para participar dos programas de estágio da Shell, e da própria Rhodia, empresa do Grupo Solvay no Brasil. Assim, iniciei a minha jornada na Shell, apesar de que a esta já havia estabelecido o contato inicial com a Rhodia. Exalto como o período de trainee serviu como uma excelente escola, muito importante na lapidação do perfil.
Ao participar do processo de rotatividade de áreas obtive as noções intrínsecas de diferentes segmentos, como importação e exportação, logística, fábrica, projetos, finanças, enfim, percebi com o que me adequava mais. Devidamente efetivada, completei sete anos de companhia, até migrar para a Ultragaz, significando outra vivência especial, inclusive, pelo fato de a empresa ter me ajudado em termos de formação, por meio do MBA realizado na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Contudo, estava decidida a ingressar em uma multinacional – um sonho acalentado desde jovem – e realizei esse movimento, em 2006. Um head hunter me contou sobre a oportunidade na Solvay e sequer hesitei ao aceitar o convite. O grupo já era uma referência para mim e, desta maneira, iniciei a minha trajetória na corporação.
A mentoria é primordial no planejamento da carreira
Acredito muito em mentoria, especialmente com as mulheres guarnecendo o exemplo. Em 2009, quando estava prestes a me casar, fui convidada para uma expatriação na França, mas não pretendia atrasar os meus projetos pessoais, porque já pensava em ter filhos. Contei com o amplo suporte do meu líder à época, o José Borges Matias, que assegurou como não haveria dificuldades em termos de logística. Por fim, deu tudo certo – regressei ao Brasil antes do prazo, já para assumir a diretoria de compras. Além disso, a minha filha nasceu em solo brasileiro.
Menciono como o José Matias foi o meu líder e tive o prazer e a honra de sucedê-lo na presidência, em 2018. Ele e o Elder Martini – outro gestor excepcional – me inspiraram fortemente. Além disso, vislumbram o meu potencial, de que poderia alcançar uma alta posição na empresa.
Destaco uma ocasião na qual houve uma reunião com várias mulheres CEOs e a consultora responsável perguntou quantas de nós precisaram ouvir de um homem que detínhamos a aptidão para alcançarmos posições de liderança. Todas levantaram a mão, mas, à época, tratava-se de uma realidade diferente.
O cenário atual é outro, requer contar com resiliência, dedicação, porque todas têm possibilidades de alcançar o sucesso, conquistar posições notáveis, desde que estejam preparadas para assumir os desafios propostos.
Gosto de prover mentoria e tenho duas pessoas com quem realizo esse trabalho. Trato de enfatizar como se prioriza o foco, tendo em vista estar preparada, seja com treinamentos ou novas formações. Com o planejamento adequado, cobrindo eventuais gaps, a pessoa se encontrará em uma situação privilegiada quando a chance surgir. Recebi esses ensinamentos dos meus mentores e trato de transmiti-los adiante; é uma missão.
O valor do equilíbrio entre vida pessoal e profissional
O retorno da licença-maternidade ficou marcado como um grande desafio. Após quatro meses de afastamento, retomei as minhas atividades, mas imbuída por um sentimento diferenciado, ao deixar minha filha em casa. Nestes casos, o suporte familiar é essencial para evitar desgastes desnecessários. Também obtive a ajuda de um palestrante, que conseguiu me mostrar como conseguiria conciliar a vida profissional, com êxito, sendo uma boa mãe – são ações conectadas.
Amo o meu trabalho e sinto-me plenamente realizada. Volto para casa feliz, e dou o máximo de amor à minha filha, equilibrando a vida pessoal com a profissional. Ela me cita como exemplo, para suas amigas, especialmente quando saio em jornais, ou seja, sou uma referência para ela. O meu marido, por ser advogado, viaja menos e nossa filha até questiona o motivo pelo qual não mudo de trabalho. Enfim, ao conciliar sucesso profissional com o sucesso pessoal, amparada por estímulos e positividade, tudo se torna possível.
Evidentemente, nem sempre tudo ocorre perfeitamente, pois é impossível receber somente feedbacks positivos. Pondero, contudo, como os feedbacks negativos são fundamentais para contribuir na carreira. Deparei-me com um momento em que a equipe solicitou que brigasse mais por eles, com foco em um investimento mais alto para determinado projeto. Se as pessoas ao seu redor não falarem nada, tudo estagna, ou seja, são momentos de aprendizado e sigo amealhando conhecimentos constantemente – ninguém vive apenas com elogios.
Tendo em vista essa linha de raciocínio, assevero como a minha preocupação com a geração atual passa pela falta de resiliência, pois os jovens se lamentam por qualquer motivo. As lideranças antigas eram mais severas - às vezes com exageros - mas contribuíam em termos de trabalhar a resiliência, o comprometimento e dedicação nas empreitadas.
O compromisso inegociável com as pautas do ESG
Considero como um projeto que me deixou bastante feliz, englobando a biodiversidade, resultou com o reconhecimento da ONG Wildlife Habitat Council (WHC), em 2021. No começo estudamos o projeto para analisar o nosso maior complexo, situado em Paulínia, no interior de São Paulo, para compreendermos como lidávamos com a biodiversidade, com o intuito de podermos contribuir com essa pauta. Obtivemos inúmeros aprendizados e verificamos que muitas das práticas que tínhamos já eram referências de mercado.
No primeiro ano em que nos inscrevemos no projeto, já recebemos a certificação Gold, algo inédito para uma indústria do setor, significando motivo de enorme orgulho. Apesar de ser uma base de matéria petroquímica, nos empenhamos em inovação, indo na direção do carbono neutro. Alcançamos 95% de neutralidade no polo de Paulínia, o maior da América Latina e o segundo da Solvay no mundo. E seguimos puxando as equipes para atingir a meta da Agenda 2030 da ONU antes do prazo estabelecido.
Empenhados na causa do crescimento sustentável, lançamos, em meados de 2023, duas linhas de produtos 100% carbono neutro, caracterizando uma inovação dentro da área petroquímica. Em uma frente, inovamos no nicho de têxteis, sendo que na outra, nos dedicamos à matéria-prima para solados de sapatos.
Assisti a um vídeo da Apple, e achei muito interessante, por se tratar de uma conversa do board real com a natureza. E no final, eles mostram um produto como sendo o primeiro carbono neutro. Mas relembro como conseguimos tal feito antes deles. É uma conquista imensa, por se tratar de um projeto bastante complexo, que demandou inúmeras conversas com a equipe. De fato, implementamos algo sério, comprovado e certificado, com todas as regulamentações atendidas.
Ao analisar o ESG, aponto três caminhos distintos, que dependem muito da região, por envolver a legislação de cada país. Na Europa e em alguns distritos dos Estados Unidos, a lei é a responsável por incentivar o movimento, além de haver mais conscientização da sociedade, do público consumidor.
Já no Brasil, vejo a questão individual como um vetor menos participativo. E, tampouco, há uma legislação sólida, atuante e arraigada como na Europa. Portanto, saliento como há uma terceira vertente, na qual as próprias empresas se dedicam ao ESG, vislumbrando como oportunidades, inclusive com a vastas possibilidades de prover longevidade aos negócios.
O Grupo Solvay tem mais de 160 anos de atuação. E não imagino que uma indústria química deste porte passará por mais de uma centena de anos sem estar extremamente comprometida com as práticas ESG. Tanto na questão do meio ambiente, utilizando o mínimo possível de recursos naturais, englobando extração de minérios, aproveitamento da água, quanto na questão de poluição e emissão de gás carbônico. De toda forma, está longe de ser uma pauta nova para nós – nossos cases extremamente bem-executados atestam a nossa robusta atuação.
Evidentemente, não é normal o que está acontecendo no mundo e, se continuar assim, não haverá planeta para as futuras gerações, para os meus netos. É preciso se ater às informações, cada vez mais disponibilizadas, o que ajuda na conscientização.
Ademais, ajuda até a atrair novos talentos para uma indústria que não é tão fashion. Desde que se aplique em sustentabilidade, caminhando na direção da neutralidade de carbono. Contamos com uma floresta cercando a principal fábrica, enfim, isso demonstra o alinhamento com as pautas, atuando com matérias-primas renováveis, na utilização do etanol, glicerina, o que nos diferencia da concorrência.
Flexibilidade e comprometimento são sólidos diferenciais
Acredito nas pessoas e preciso desses talentos, para prover benefícios econômicos para a organização. Ao atrair os melhores profissionais, com o intuito de estruturar o negócio de forma mais sólida, contemplamos os anseios individuais e do próprio grupo.
Destaco a flexibilidade e o comprometimento como habilidades comportamentais imprescindíveis no momento de estruturar um time. Recentemente, efetuamos mudanças nas lideranças, com reformulações consideráveis. E são pessoas com excelente formação, o que ajuda demais nesse processo.
A flexibilidade se mostrou como um diferencial quando decidimos alocar diferentes perfis em outras áreas, com o propósito de que esses indivíduos passassem a assumir diferente papéis. Já a lógica do comprometimento envolve assimilar o aspecto de sentir, em cada colaborador, os níveis de engajamento.
Contamos com pessoas que trabalham na empresa e pensam estar em seu próprio negócio. O profissional pode atuar com essa visão de dono dentro da organização, desde que tome decisões como se fosse com o seu dinheiro – trata-se do espírito de empreendedor e pode derivar em crescimento exponencial. Em uma multinacional, esse quesito é bem interessante, mas sem jamais exacerbar, pois há toda uma estrutura que deve ser respeitada.
O líder acolhedor gera engajamento e crescimento
Reitero como não existe mais espaço para o líder com o perfil de super-herói ou super-heroína. O líder é aquele que entende as suas vulnerabilidades, para poder contar com o apoio das pessoas dentro da equipe, visando a complementação. Não existe um líder que seja perfeito em absolutamente tudo, enfim, é preciso amealhar os conhecimentos no decorrer da jornada.
No meu caso, estou tentando me aprimorar em termos de tecnologia, como Inteligência Artificial, por exemplo. É pré-requisito contar com essa capacidade de diversificar – que vai além de gênero, abarcando a formação, perfis distintos, com pessoas mais arrojadas e outras de perfil conservador, pois tudo isso gera novas e distintas opiniões.
Alia-se a isso, a capacidade de ser acolhedor, para construir times vencedores, pois ninguém alcança o sucesso sozinho. Desta forma, também há abertura para se lidar com diferentes talentos e quem está à frente, percebe no que pode melhorar. Demanda estar mais próximo das equipes, como acontece por aqui, com diálogo amplo e assertivo. Houve uma transformação significativa na forma de se analisar a hierarquia, com menos burocracia, mais interlocução e proximidade entre os envolvidos, com o líder provendo suporte e ajuda.
Eventualmente, o sentimento de frustração, por se desconhecer determinado tema, vem à tona. Mas é inviável conhecer tudo a fundo. Saber lidar com as limitações, superar os eventuais obstáculos é muito importante. As novas gerações também se frustram, porque querem ascender rapidamente, mas isso requer experiência, vivência, maturidade – a carreira é um processo de planejamento.
Ética e resiliência norteiam a trajetória rumo ao sucesso
Dito isto, noto como a constante troca de emprego denota que a pessoa não consegue entregar sequer um projeto, pois está constantemente vislumbrando outras oportunidades – é uma ambição insalubre. Infelizmente, isso é bem recorrente – não raro, analiso currículos de jovens profissionais e me deparo com essas lacunas.
Considero como a resiliência deve sempre prevalecer. Todos convivemos com momentos difíceis, mas ao entregarmos o nosso melhor, em determinado momento o reconhecimento virá. No final, a empresa precisará de resultados robustos, e isso vêm das pessoas, independentemente do grau hierárquico e com a força coletiva.
Precisamos nos escutar, conectar mais, para que as ideias possam fluir. A quantidade de informações que temos hoje em dia é vultuosa – demanda ter um cuidado muito grande, especialmente para zelar pela reputação das empresas. Claro, estar antenado é importante, mas tomando cuidado com a apuração das notícias.
Além disso, assevero como a ética é um valor inegociável e exemplifico com uma passagem popular: “Nunca faça nada que você não tenha coragem de contar à sua mãe”, haja vista como explicita o erro. O nome deve ser honrado no mercado, atrelado à honestidade, ética, retidão, atuando com legalidade. É uma preocupação muito grande que tenho, pois quero ser reconhecida pelos meus valores – o meu legado se constitui a partir destes valores.
Encontrar o caminho da felicidade é o real propósito
“ É comum abordar o conceito do propósito, porém, saliento como o mais importante é a pessoa realmente gostar do que se propõe a realizar. O trabalho não pode gerar desânimo, algo desempenhado somente por obrigação. O primordial é apreciar de fato, com o intuito de gerar impacto na vida, com crescimento pessoal e profissional.
Enfim, o propósito é encontrar o que se ama, porque proverá coisas positivas para quem estará ao seu redor e ao planeta. Sou muito feliz com as minhas atribuições, com harmonia em todos os âmbitos. Todavia, atesto como a nova geração tem enorme dificuldade em encontrar esse ponto de equilíbrio, inclusive por culpa da ansiedade.
Por fim, requer saber dissociar o hobby do trabalho. Todo mundo terá a oportunidade de encontrar um caminho que lhe provenha a satisfação – basta acreditar, com resiliência e determinação. Caso contrário, busque outro caminho, inclusive para ser feliz, respaldando-se em encontrar forças para dar a volta por cima quando necessário.”