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Os trambolhões do futebol durante a segunda onda

"O consenso geral entre os decisores do futebol é de que fechar os olhos é a melhor solução, ao menos por enquanto"

(Internet/Internet)
VL

Vinicius Lordello

Publicado em 8 de dezembro de 2020 às 09h08.

* Por Pedro Oliveira e Marco Sirangelo

A segunda onda de infecções causadas pelo Coronavírus é uma realidade em todo o mundo. Do ponto de vista esportivo, há uma mudança significativa entre o atual momento e o estouro inicial da pandemia – o futebol não faz parte desse novo lockdown e mundo afora as temporadas permaneceram em curso, mesmo sem a presença de público. No Brasil, mesmo sem nenhum lockdown institucionalizado, o futebol foi interrompido por meses, mas agora segue a pleno vapor, mesmo com o risco cada vez maior de novas infecções.

Há um sentimento de “ o show não pode parar ” que, embora compreensível do ponto de vista financeiro e emocional, ignora fundamentos racionais em um momento de combate a uma crise sanitária sem precedentes. Temos aqui um conflito entre reduzir riscos à saúde de diversos atletas e de suas famílias e, também, procurar reduzir impactos de uma retração econômica próxima à R$ 2 bilhões, como demonstra o cenário mais pessimista do estudo realizado pela EY sobre os Clubes brasileiros.

No mundo inteiro, o futebol não é uma atividade econômica das mais sustentáveis. Notadamente, exceto um pequeno punhado de marcas com status de “potência global”, os Clubes possuem enorme dificuldade em gerar novas receitas e, ao unirmos isso ao  desaparecimento de uma das principais fontes de recursos tradicionais (receita com bilheteria e tudo relacionado ao matchday que hoje no Brasil é responsável, em média, por 16% do faturamento dos Clubes, segundo dados referentes aos times de primeira divisão em 2019), os Clubes reportarão prejuízos substanciais em 2020, sendo esperado que o futuro do esporte seja mais austero do que nos acostumamos especialmente ao longo da última década.

De qualquer forma, outro período alongado sem jogos poderá ser mortal para os clubes, dependentes cada vez mais de recursos da televisão (hoje responsável por quase 40% da receita média dos Clubes) que, é importante que se diga, estão atrelados à realização das partidas. É um ciclo complexo e que resulta em uma normalização do grande risco a que atletas e demais profissionais do esporte estão expostos. Neste contexto há, ao que parece, um consenso geral entre os decisores do futebol de que fechar os olhos é a melhor solução, ao menos por enquanto.

Com isso, atualmente, nos acostumamos a somar casos de COVID-19 às tradicionais listas de desfalques por lesão. Há uma dose de surrealismo nisso. Um levantamento realizado por Roberto Meleson do Globo Esporte mostrou que, até o dia 27 de novembro de 2020, um total de 341 atletas da Série A do Brasileirão foram infectados pelo Coronavírus. Além disso, novembro foi o mês com maior aumento de casos em relação ao mesmo período anterior, com 114 novos positivos até o momento. Nove equipes, quase metade do campeonato, tiveram ao menos 19 jogadores infectados, com destaque para o Vasco, com impressionantes 43 casos registrados apenas em jogadores. Resta aos Clubes se virarem com garotos de categorias de base, continuarem com protocolos rígidos e torcerem para que nenhuma tragédia aconteça no futuro.

Em meio a uma situação complexa é paradoxal que o próximo grande assunto a ser tratado no mundo do futebol seja o retorno do público aos estádios. Em conjunto com o Primeiro Ministro Boris Johnson, a Premier League acatou alguns pedidos de Clubes e atuou para que houvesse um afrouxamento nas medidas que fecham os portões dos estádios. Com isso, após o fim do lockdown nacional em 2 de dezembro, é esperado que alguns jogos tenham liberação de público em regiões da Inglaterra que estejam mais controladas.

Embora um pouco controversa, a volta de torcedores nos estádios da Premier League foi estudada em conjunto com Clubes e com o poder público, e faz parte de todo um plano nacional voltado ao combate à pandemia. Plano este que, inclusive, já está avançado no que diz respeito aos procedimentos necessários para a vacinação em massa da população assim que possível. Neste sentido, considerando que organização e bom senso não são os pontos fortes do Brasil e, também, de seu futebol, não seria espantoso que o debate pela volta de torcedores voltasse à tona por aqui, mesmo que a pandemia ainda esteja longe de ser controlada.

Além disso, o calendário de jogos permanece um problema para depois, como sempre acontece. Já sabemos que, como decorrência do término da temporada 2020 em fevereiro de 2021, a temporada 2021 será extremamente tumultuada, sem pausa para jogos internacionais e também torcendo para que nenhum evento extraordinário, como outra necessidade de pausa em decorrência da pandemia, aconteça. Mas, por mais paradoxal que seja, a atual temporada nacional parece mais agradável do ponto de vista esportivo do que o esperado. É possível dizer que ou o futebol está suprindo a lacuna por entretenimento ou, então, que estamos tão entediados a ponto de achar graça na nossa dura realidade.

*Pedro Oliveira é sócio-fundador da OutField Consulting, consultoria focada nos negócios do esporte e do entretenimento.

*Marco Sirangelo  - Head de conteúdo e educação na OutField Consulting

* Por Pedro Oliveira e Marco Sirangelo

A segunda onda de infecções causadas pelo Coronavírus é uma realidade em todo o mundo. Do ponto de vista esportivo, há uma mudança significativa entre o atual momento e o estouro inicial da pandemia – o futebol não faz parte desse novo lockdown e mundo afora as temporadas permaneceram em curso, mesmo sem a presença de público. No Brasil, mesmo sem nenhum lockdown institucionalizado, o futebol foi interrompido por meses, mas agora segue a pleno vapor, mesmo com o risco cada vez maior de novas infecções.

Há um sentimento de “ o show não pode parar ” que, embora compreensível do ponto de vista financeiro e emocional, ignora fundamentos racionais em um momento de combate a uma crise sanitária sem precedentes. Temos aqui um conflito entre reduzir riscos à saúde de diversos atletas e de suas famílias e, também, procurar reduzir impactos de uma retração econômica próxima à R$ 2 bilhões, como demonstra o cenário mais pessimista do estudo realizado pela EY sobre os Clubes brasileiros.

No mundo inteiro, o futebol não é uma atividade econômica das mais sustentáveis. Notadamente, exceto um pequeno punhado de marcas com status de “potência global”, os Clubes possuem enorme dificuldade em gerar novas receitas e, ao unirmos isso ao  desaparecimento de uma das principais fontes de recursos tradicionais (receita com bilheteria e tudo relacionado ao matchday que hoje no Brasil é responsável, em média, por 16% do faturamento dos Clubes, segundo dados referentes aos times de primeira divisão em 2019), os Clubes reportarão prejuízos substanciais em 2020, sendo esperado que o futuro do esporte seja mais austero do que nos acostumamos especialmente ao longo da última década.

De qualquer forma, outro período alongado sem jogos poderá ser mortal para os clubes, dependentes cada vez mais de recursos da televisão (hoje responsável por quase 40% da receita média dos Clubes) que, é importante que se diga, estão atrelados à realização das partidas. É um ciclo complexo e que resulta em uma normalização do grande risco a que atletas e demais profissionais do esporte estão expostos. Neste contexto há, ao que parece, um consenso geral entre os decisores do futebol de que fechar os olhos é a melhor solução, ao menos por enquanto.

Com isso, atualmente, nos acostumamos a somar casos de COVID-19 às tradicionais listas de desfalques por lesão. Há uma dose de surrealismo nisso. Um levantamento realizado por Roberto Meleson do Globo Esporte mostrou que, até o dia 27 de novembro de 2020, um total de 341 atletas da Série A do Brasileirão foram infectados pelo Coronavírus. Além disso, novembro foi o mês com maior aumento de casos em relação ao mesmo período anterior, com 114 novos positivos até o momento. Nove equipes, quase metade do campeonato, tiveram ao menos 19 jogadores infectados, com destaque para o Vasco, com impressionantes 43 casos registrados apenas em jogadores. Resta aos Clubes se virarem com garotos de categorias de base, continuarem com protocolos rígidos e torcerem para que nenhuma tragédia aconteça no futuro.

Em meio a uma situação complexa é paradoxal que o próximo grande assunto a ser tratado no mundo do futebol seja o retorno do público aos estádios. Em conjunto com o Primeiro Ministro Boris Johnson, a Premier League acatou alguns pedidos de Clubes e atuou para que houvesse um afrouxamento nas medidas que fecham os portões dos estádios. Com isso, após o fim do lockdown nacional em 2 de dezembro, é esperado que alguns jogos tenham liberação de público em regiões da Inglaterra que estejam mais controladas.

Embora um pouco controversa, a volta de torcedores nos estádios da Premier League foi estudada em conjunto com Clubes e com o poder público, e faz parte de todo um plano nacional voltado ao combate à pandemia. Plano este que, inclusive, já está avançado no que diz respeito aos procedimentos necessários para a vacinação em massa da população assim que possível. Neste sentido, considerando que organização e bom senso não são os pontos fortes do Brasil e, também, de seu futebol, não seria espantoso que o debate pela volta de torcedores voltasse à tona por aqui, mesmo que a pandemia ainda esteja longe de ser controlada.

Além disso, o calendário de jogos permanece um problema para depois, como sempre acontece. Já sabemos que, como decorrência do término da temporada 2020 em fevereiro de 2021, a temporada 2021 será extremamente tumultuada, sem pausa para jogos internacionais e também torcendo para que nenhum evento extraordinário, como outra necessidade de pausa em decorrência da pandemia, aconteça. Mas, por mais paradoxal que seja, a atual temporada nacional parece mais agradável do ponto de vista esportivo do que o esperado. É possível dizer que ou o futebol está suprindo a lacuna por entretenimento ou, então, que estamos tão entediados a ponto de achar graça na nossa dura realidade.

*Pedro Oliveira é sócio-fundador da OutField Consulting, consultoria focada nos negócios do esporte e do entretenimento.

*Marco Sirangelo  - Head de conteúdo e educação na OutField Consulting

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