Estudos comprovam: pessoas têm mais empatia por cachorros do que por gente
Reação ao caso da morte do cachorro no Carrefour foi enorme, mas não inesperada: as pessoas realmente sentem grande empatia pelos cães
Gustavo Gusmão
Publicado em 5 de dezembro de 2018 às 07h01.
Última atualização em 5 de dezembro de 2018 às 07h01.
São Paulo — O caso recente da morte cruel de um cachorro em uma unidade do Carrefour gerou comoção pela internet. De publicações de ativistas até um boicote online promovido nos comentários da página da empresa no Facebook, foram muitas as reações negativas dos (agora ex-) clientes da rede de supermercados. E essa reação enorme não foi inesperada. É um fato, dizem estudos, que sentimos muita empatia pelos bichinhos de quatro patas — por vezes, mais até do que por outras pessoas.
Uma das pesquisas mais famosas sobre o assunto foi publicada em abril de 2017 no jornal científico Society & Animals. O artigo é assinado pelos pesquisadores Jack Levin, Arnold Arluke e Leslie Irvine, das universidades Northeastern e do Colorado, ambas nos EUA. Chamado "Are People More Disturbed by Dog or Human Suffering?" ("As pessoas são mais afetadas pelo sofrimento de um cachorro ou de um ser humano?"), o estudo avaliou reações de 240 estudantes de cursos de graduação a casos de espancamentos de cães e pessoas.
Os participantes precisavam primeiro ler uma notícia fictícia, que podia ser sobre um cachorro filhote ou adulto ou sobre uma pessoa (um bebê de 1 ano ou um adulto de 30). Os textos eram quase idênticos; as únicas mudanças eram nas identificações das "vítimas". Depois de ler, os estudantes tinham que informar o nível de empatia sentido.
Os pesquisadores esperavam que a idade das vítimas hipotéticas causasse mais comoção do que a espécie, mas viram que a hipótese não estava totalmente certa — pelo menos no caso dos cães. Para os seres humanos, o nível de empatia era alto só quando a notícia envolvia bebês. Mas para os caninos, a idade não importava: a comoção, ainda que menor do que a gerada por um bebê humano, era grande tanto nos casos citando filhotes quanto nas situações (novamente, fictícias) com cachorros mais velhos.
Uma história real
Um teste conduzido pela instituição de caridade britânica Harrison's Fund chegou a uma conclusão similar dois anos antes, usando um método um pouco menos científico. O grupo, que financia pesquisas para tratamento de distrofia muscular de Duchenne, veiculou por uma semana dois anúncios diferentes na internet do Reino Unido pedindo doações.
Um dos banners trazia um cachorro com feições tristes, enquanto outro mostrava Harrison, o menino de então 8 anos que dá nome à fundação. "Não surpreendentemente, o anúncio com o cão foi clicado duas vezes mais do que o que mostrava meu filho", escreveu, na época, Alex Smith, pai de Harrison e fundador do grupo.
Levin, Arluke e Irvine, autores do primeiro estudo, têm uma explicação para essa empatia a mais dedicada a cães. Em seu artigo, os pesquisadores dizem que "cães, sejam eles jovens ou adultos, são vistos como detentores das mesmas qualidades associadas a bebês humanos; eles são vistos como incapazes de se proteger totalmente". Harrison não era um adulto, é claro. Mas também não era um bebê para despertar tanta comoção de possíveis doadores.
Via de mão-dupla
O curioso é que o inverso, de certa forma, também acontece. Um estudo publicado em julho deste ano no jornal científico Learning & Behavior mostrou que cães realmente sentem empatia por seres humanos, especialmente por pessoas que estão tristes. As pesquisadoras Emily Sanford, Emma Burt e Julia Meyers, do Macalester College, nos EUA, tiraram a prova ao colocar pessoas chorando ou cantarolando atrás de uma porta. As reações psicológicas e comportamentais dos cachorros, que ficavam do outro lado, eram então registradas.
Os cães que ouviam o som da pessoa chorando foram mais rápidos na hora de abrir a porta, porque controlavam melhor as próprias emoções no momento necessário. Os outros cachorros, que ouviam uma pessoa cantarolando, já abriam a porta mais por curiosidade e vontade de contato social, de acordo com o estudo. A pesquisa não é exatamente conclusiva, porque só avaliou 34 animais. Mas ao menos dá indícios de que os caninos parecem se importar conosco tanto quanto nós nos importamos com eles.