No futuro, o diploma de ensino superior ainda será necessário?
Em entrevista, o vice-presidente de Educação da Pearson fala sobre tendências para a educação e a Aprendizagem Criativa
Luísa Granato
Publicado em 22 de dezembro de 2019 às 06h00.
Última atualização em 6 de janeiro de 2020 às 13h46.
São Paulo - “O conhecimento deixa de ser acumulado para ser via streaming, ele está passando por você. Você tem que ser igual a um canal do YouTube e Instagram”, fala Juliano Costa, vice-presidente de Educação da Pearson, sobre o futuro da educação .
Segundo o estudo realizado em 2019 pela empresa, o Global Learning Survey, a confiança nas instituições tradicionais de ensino está abalada. A maioria ainda valoriza um ensino superior, mas 68% das pessoas no mundo acreditam que cursos técnicos ou profissionalizantes dão melhores chances na carreira.
Quando fala em conhecimento via streaming, Costa faz um contraponto com a ideia de conhecimentos acumulados. Para ele, no passado, um diploma era considerado vitalício. Agora, ele aponta que a necessidade de atualização é constante e as fontes de formação se diversificaram.
De acordo com o vice-presidente, escolas e universidades precisam se adaptar ao mundo mais ágil, porém encontram dificuldades para flexibilizar seus currículos e atender às demandas do mercado.
Uma saída que ele aponta na formação de jovens são as iniciativas extracurriculares, como a da escola de inglês Yázigi: o programa Explore Aprendizagem Criativa oferece espaço bilíngue de desenvolvimento de habilidades socioemocionais e digitais para crianças e adolescentes.
No lugar de aulas com conteúdos fechados, os jovens podem desenvolver projetos de maneira criativa com foco em arte, tecnologia e corpo.
“A criança ocupa o espaço e é orientada para desenvolver as habilidades necessárias ao longo do processo, mas pode executar seu projeto com autonomia e construir o seu currículo. Junto ao lúdico, as crianças são donas de sua própria aprendizagem”, explica Costa.
Ele alerta que não é possível substituir a escola com esse programa novo, mas muitas das habilidades do futuro, como o pensamento crítico e empatia, são formadas ali.
Confira a entrevista do vice-presidente:
EXAME: Quais são as tendências para o ensino?
Juliano Costa: Desde 2016, a Pearson fez uma sequência de pesquisas sobre o futuro do trabalho em 2030. A segunda pesquisa foi sobre como alunos do ensino superior está se preparando para o futuro do trabalho. Depois, lançamos a Global Leaders, sobre a visão do futuro da aprendizagem. São três grandes pesquisas que mostram sinais claros.
A primeira coisa é que, a partir de agora, não existem mais blocos de conhecimento, como antes você era graduado em História ou Filosofia e não existia data de validade. O conhecimento acumulado, você ser doutor em tal universidade em 1999, valia por toda a vida. Com as mudanças tecnológicas, o conhecimento acumulado perde seu valor. Se fiz engenharia de dados em 2009, o que isso significa para 2019 com tecnologia que não existia há 10 anos?
O conhecimento deixa de ser acumulado para ser via streaming, ele está passando por você. Você tem que ser igual a um canal do YouTube e Instagram. Aprendendo a toda hora e reaprendendo a toda hora. Aprender a aprender é central para o século XXI.
A segunda condição, como estudantes, trabalhador ou empresário, é: você nunca está pronto. Em toda a sua vida útil até achar que tem idade para se aposentar, o aprendizado vai ter durante toda a vida, não para toda a vida. A tecnologia vai empoderar a aprendizagem de modo nunca antes visto e não vai deixar de ser importante.
EXAME: Como a Aprendizagem Criativa se encaixa nesse contexto e nas tendência de educação?
Juliano Costa: Dentro do século XXI, a Harvard Business Review construiu um conceito de Mundo VUCA, esse mundo complexo, que faz com que você trabalhe com um estado diferente de instabilidade. Também temos o conceito de Bauman da liquidez da modernidade, onde tudo flui. A qualquer hora seu conhecimento pode ser ameaçado, com um câncer curado ou um buraco negro descoberto. O que você precisa ensinar às pessoas para que tenham conhecimento fluído? Que habilidades?
Nós pensamos em três grandes pilares: a aprendizagem socioemocional, o domínio de tecnologia e a criatividade. E nós estamos trabalhando com a aprendizagem criativa. Com o Explore, queremos ajudar o estudante a aprender coisas semelhantes de formas diferentes, de maneira expositiva, por movimento e com tecnologia. Apresentamos situações problema e damos autonomia para aprender usando seus próprios meios e ideias que não tinha antes.
Para adultos, existe a concepção de que é mais difícil aprender com a idade. Pesquisas mostram que as pessoas podem reaprender habilidades sempre. O que percebemos é que as pessoas têm dificuldade de aceitar o estado de mudança. Elas foram educadas em estado estável e projetadas para achar que vão trabalhar e morar no mesmo lugar a vida toda. Os jovens já não pensa assim, no lugar da mentalidade fixa temos a mentalidade de crescimento.
Mas temos evidências que todos podem aprender ao longo da vida, só precisam ajustar sua disposição para a aprendizagem. Aos 45 anos pensar em reconstruir a vida, refazer o portfólio, ir atrás de cursos.
EXAME: E você acredita que hoje as escolas ensinam as habilidades necessários para navegar essa nova sociedade?
Juliano Costa: Primeiro precisamos entender que a escola tem flexibilidade só depois que cumpre o que aparece na legislação. Assim, não pode tirar matemática para colocar habilidades socioemocionais. A escola de educação básica precisa cumprir a lei, que é muito cognitiva e fica amarrada nos blocos. Com a Base Nacional Comum Curricular, a BNCC, temos uma mudança no processo, que não é radical. Ela não diz que temos que dar menos matéria, mas além das aulas de matemática, história, geografia, também teremos cultura digital, empatia e letramento digital.
Com a mudança da lei, a escola tem que se adaptar e é um avanço, mas precisaremos de 5 a 10 anos para incorporar em todas as escolas. No Yázigi, com a aprendizagem criativa, encontramos um caminho para que estudantes de qualquer idade criem mecanismos para resolver problemas com um currículo paralelo que desenvolve competências de forma integrada ao idioma.
EXAME: A decisão de que carreira seguir durante a adolescência sempre pareceu difícil. Acha que é mais difícil hoje, com tantas incertezas e mudanças no mercado?
Juliano Costa: Acho que está mais complexo e mais difícil. Não só para escolher a profissão, mas para qualquer coisa. Por outro lado, quando era adolescente, você tomava a decisão e era parte da cultura uma pressão para terminar o curso de qualquer jeito. A ideia de terminar para ter um diploma e ter um emprego. Hoje, para trabalhar no Google ou em uma startup não precisa ter um diploma.
Uma carreira de Data Science não tem muita relação com um diploma. Então, escolher está mais difícil, mas trocar sua área de formação é mais fácil. Você pode entrar na faculdade, sair e fazer outra. Pode fazer um bootcamp e aprender apenas o que precisa de um tema específico.
E a faculdade está com dificuldade também para acompanhar a mudança, a mesma dificuldade do ensino básico, pois precisa aprovar mudanças no currículo no MEC. E estão tentando ter mais flexibilização com a aprovação de cursos livres com cargas menores, de 60 ou 30 horas. Até o modelo de pós-graduação não entrega o que o mercado precisa na velocidade que precisa.