Carreira

6 mitos e verdades sobre o consumo das classes A e B

Pesquisa exclusiva confronta crenças antigas, mas nem sempre reais, sobre os hábitos financeiros do brasileiro

Felipe Rizzo, cirurgião-dentista: como boa parte dos brasileiros, ele pensou primeiro nas parcelas e não nos juros (Marcelo Spatafora/EXAME.com)

Felipe Rizzo, cirurgião-dentista: como boa parte dos brasileiros, ele pensou primeiro nas parcelas e não nos juros (Marcelo Spatafora/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.

São Paulo - A pedido da VOCÊ S/A, a Boa Vista Serviços reuniu informações sobre os hábitos de consumo das classes A e B para saber como esse grupo se comporta quando vai às compras. A Boa Vista é a administradora do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), banco de dados com mais de 350 milhões de dados comerciais sobre consumidores que têm Cadastro de Pessoa Física (CPF) no Brasil.

O levantamento considerou famílias com renda média mensal de 2 565 a 12 926 reais. As respostas de 1 300 brasileiros de todo o país foram confrontadas com afirmações repetidas e disseminadas sobre a forma como as pessoas investem e gastam seu dinheiro. O resultado é um painel de mitos e verdades sobre a maneira como consumimos.

“Percebi que repetimos frases e ideias que foram sendo desmontadas ao longo da pesquisa”, diz Fernando Cosenza, diretor de inovação e sustentabilidade da Boa Vista, responsável também pelas principais conclusões desse levantamento. Essas conclusões foram submetidas à avaliação de especialistas em finanças pessoais, que apontam algumas lições que podemos extrair desses mitos e verdades. 

O consumidor não pensa em juros, mas no valor da parcela Verdade

O cirurgião-dentista Felipe Rizzo, de 28 anos, é um trocador de carros compulsivo. Em três anos, chegou a ter três carros diferentes. Sempre de olho para ver se as parcelas — e nunca os juros — cabem no seu bolso, Felipe não resiste à tentação quando vê uma máquina nova na frente. Em 2007, descontente com seu Ford Ka, resolveu trocá-lo por um Fiat Strada 1.4. Assumiu um financiamento de 60 meses, com parcelas de 667 reais mensais e taxa de 1,2% ao mês. Em troca, Felipe deu seu Ka de entrada. Ele agiu como boa parte dos brasileiros: pensou primeiro nas parcelas.

“Não considerei os juros e fiz uma compra emocional”, diz. Não bastasse assumir parcelas que tornariam o carro 43% mais caro, Felipe caiu em tentação de novo, em 2010, a 20 meses de quitar o carro. “Atraído por um Fiat Strada Adventure zero, de 50 000 reais, fui à concessionária e pedi a avaliação do meu carro. Com 12 000 reais no bolso, peguei novo financiamento de 48 meses, parcelas de 1 245 reais e taxa mensal de 1%. O carro ficou 10 000 reais mais caro.” 

Opinião do especialista

O problema de ignorar os juros é que, quanto maior o prazo do financiamento, mais caro o produto. “O brasileiro é imediatista, não guarda dinheiro para comprar à vista e ter desconto”, diz Miguel de Oliveira, da Anefac, a associação dos executivos de contabilidade.  

Renda das classes A e B é estável Mito

O gerente de marketing e produtos da Telefônica Vivo Eduardo Santin, de 28 anos, de São Paulo, recebe bônus anual por desempenho desde a época em que era analista sênior na empresa. Boa parte da grana extra, que chega a três vezes o salário mensal, é utilizada para engordar o investimento que tem na bolsa de valores. “O bônus dá mais flexibilidade para investir”, diz.


Um hábito que adotou para economizar ainda mais foi deixar o carro na garagem e usar o metrô para ir ao trabalho. “Em 2011, apliquei todo o dinheiro extra.” Em outras oportunidades, ele aproveitou para viajar. Neste ano, uma das possibilidades que Eduardo cogita é usar parte dos recursos em um fundo imobiliário.

O caso de Eduardo caracteriza um movimento que começou a se acentuar no país nos últimos 15 anos, quando a política de pagamento de bônus, participação nos lucros, stock options e comissões se consolidou nas grandes empresas para a retenção de talentos. Essa oscilação na renda é considerada positiva pelo pesquisador Fernando Cosenza, da Boa Vista Serviços, no caso de executivos como Eduardo. Mas pode ser ruim para as classes mais baixas, o que era observado mais nitidamente no passado do que hoje, já que a volatilidade pode comprometer o orçamento de famílias inteiras.

Opinião do especialista

“Dinheiro na mão é vendaval.” A letra de Paulinho da Viola serve de alerta para profissionais que recebem comissões e participação nos lucros da empresa. Usar essa grana para consumir só em último caso. “Separe 15% da soma do salário mensal e do bônus para investimentos”, orienta Ricardo Fairbanks, da Dinheiro em Foco. Para o consultor, Eduardo é um bom exemplo. “Como ele é jovem, usar parte do bônus em ações é uma boa opção de aplicação de longo prazo.”

Classes mais altas também preferem a caderneta de poupança Verdade

O investimento em poupança começou cedo para Pedro Henrique Delalibera, de 29 anos, sócio da Mútuos, desenvolvedora de software, de Itajubá, Minas Gerais. O responsável por esse hábito foi seu avô. “Ele abriu a conta na poupança quando eu tinha 7 anos. Até a adolescência, eu colocava lá todo o dinheiro que ganhava de meus pais e com a venda de pipocas em festas da cidade”, diz.

Desde então, Pedro jamais abandonou a velha e boa poupança. Com 16 anos, auxiliado pelo tio, transferiu parte dos 2 500 reais da poupança para um CDB. Ficou pouco tempo e logo migrou para um fundo de ações. Hoje, Pedro tem 12 000 reais na poupança, a maior fatia de seus investimentos, como faz grande parte dos brasileiros. Ele ainda mantém 10 000 reais em fundos de ações da Drogasil, da Vale e da Petrobras.

Opinião do especialista

Para Conrado Navarro, sócio do site Dinheirama.com, o hábito de investir em poupança é justificado pela alta liquidez. “Além disso, é um investimento com apelo cultural forte no Brasil.” Segurança, baixo risco, taxa zero e isenção de imposto completam as vantagens. Mas nem sempre ela é a aplicação mais adequada. “Serve para metas de curto prazo.”

Quem tem cartão de crédito está no rotativo Mito

Três cartões de crédito para administrar, contas a pagar e uma vida financeira organizada. Com uma renda mensal de 6 000 reais, o engenheiro naval João Ferreira Netto, de 26 anos, paga as faturas dos cartões em dia e ajuda a quebrar o mito de que quem tem cartão está no rotativo. Para tanto, João atualiza diariamente a planilha de gastos. “Guardo todos os comprovantes de compra e assim fico sabendo quanto usar sem estourar os limites”, diz. João define também com qual finalidade será usado cada cartão. Para gastos rotineiros, usa o da TAM, com limite mensal de 1 900 reais. 


Se a ideia é adquirir algo mais caro, recorre ao do Bradesco, que lhe oferece o dobro. “E se rola um show no Credicard Hall, tenho desconto pagando os ingressos com o cartão da casa.” Os gastos ainda servem para acumular milhas. Foi assim que ele viajou ano passado para Buenos Aires e irá para o Nordeste no fim deste ano.

Opinião do especialista

O consultor financeiro Mauro Calil, sócio da consultoria Calil&Calil, recomenda o uso de até dois cartões, cuja soma dos limites mensais seja de, no máximo, 50% da renda pessoal. “É preciso conseguir antever, planejar e controlar os gastos, como faz João, que ainda aproveita as milhas para viajar. Ponto para ele”, afirma.

Classes A e B têm menos dívidas Mito

Há dois anos, o engenheiro paulistano Antonio Carlos Viaro, de 34 anos, tinha um bom emprego, ganhava 7 000 reais por mês, mas usava grande parte do dinheiro em viagens, festas e compras. Na época, tinha acabado de receber um aumento de 60% no salário ao deixar a função de trainee para assumir como engenheiro de processos na multinacional francesa Cray Valley.

Quanto mais a renda aumentava com os bônus que recebia, mais Antonio gastava. As dívidas foram aumentando e o engenheiro viveu uma fase pela qual muitos brasileiros estão passando. A renda elevada não garante que essas pessoas deixem de se endividar. Em 2010, Antonio acumulava débitos de 20 000 reais contraídos desde 2008.

Classes mais altas controlam bem o orçamento Mito

Após conviver com uma dívida de 20 000 reais por quatro anos, o engenheiro Antonio Carlos Viaro comemora a recente quitação das contas — o que pode ser precipitado, pois sua vida financeira ainda é muito confusa. Ele não consegue planejar seus gastos. Mesmo quando ganha mais — sua renda varia de 7 000 a 20 000 reais por mês, conforme comissões —, nunca descarta entrar no vermelho.

Depois de pagar contas básicas como água, luz, telefone, condomínio e a escola da filha, Antonio vai às compras com exagero. Ele tem 15 relógios e, sem saber o motivo, compra um novo a cada dois meses. “Hoje, não tenho dívidas, mas o fim de ano é um convite às compras, fazer uma viagem... e aí, já viu”, diz, bem-humorado.  Seu orçamento continua o caos.

Opinião do especialista

Ganhar bem é sinônimo de tranquilidade financeira? Nem sempre. As pessoas que têm renda maior entram em financiamentos para comprar bens caros. “Elas trocam de carro o tempo todo, compram produtos caros, como iPad, e adquirem cada nova versão do iPhone”, diz Mário Amigo, professor de finanças pessoais da Fipecafi. A compra se dá por desejo, e não por necessidade. Para o consultor Erasmo Vieira, da Planilhar, nas classes mais altas, grande parte da renda vai para gastos mais elevados, como escola particular dos filhos .

Acompanhe tudo sobre:Classe AClasse BComportamentoConsumoEdição 173educacao-financeiraImigração

Mais de Carreira

O alvo dela é o pódio das Olimpíadas 2024: a história de Ana Luiza Caetano, do tiro com arco

Olimpíadas 2024: Veja seis lições de atletas olímpicos que podem inspirar carreiras corporativas

Olimpíadas 2024: 'Meu foco e minha cabeça estão 100% em Paris', diz a ginasta Rebeca Andrade

Como o RH pode contribuir para o desenvolvimento da inteligência emocional dos colaboradores

Mais na Exame