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Ciência Sem Fronteiras: programa de bolsas de estudo ainda existe?

A partir de 2011, o programa ofereceu bolsas de estudo para iniciação científica em universidades de excelência fora do país

Intercâmbio: o Estudar Fora explica as etapas das discussões em torno do programa, até chegar ao modelo atual (william87/Thinkstock)

Intercâmbio: o Estudar Fora explica as etapas das discussões em torno do programa, até chegar ao modelo atual (william87/Thinkstock)

Luísa Granato

Luísa Granato

Publicado em 28 de outubro de 2018 às 06h30.

Última atualização em 28 de outubro de 2018 às 06h30.

O Ciência sem Fronteiras foi criado em julho de 2011, durante o governo Dilma Rousseff. Financiado pela Capes, CNPq e empresas parceiras, o objetivo inicial era expandir e internacionalizar a ciência, a tecnologia e a inovação, além de promover a competitividade brasileira a partir do intercâmbio.

Nos primeiros anos, o CsF ofereceu bolsas de estudo para iniciação científica em universidades de excelência fora do país.

No entanto, em 2014, o programa para graduação encerrou com o último edital de 2014, no governo Dilma, motivado por altas dívidas da gestão anterior. Na época, o número de bolsistas remanescentes deste edital no exterior e visitantes no Brasil chegava a 4 mil.

Em abril de 2017, o MEC (Ministério da Educação) anunciou o encerramento definitivo do CsF para graduação, mas, na mesma nota divulgada, afirmou que a iniciativa teria 5 mil bolsas para pós-graduação. O Estudar Fora explica as etapas das discussões em torno do programa, até chegar ao modelo atual.

Um histórico do programa

De 2012 a 2016, o Ciência sem Fronteiras financiou cerca de 93 mil bolsas de estudo integrais para estudantes brasileiros no exterior, sendo 73% delas destinadas à graduação. Contudo, quando anunciou o fim do CsF para essa modalidade, o MEC divulgou uma estimativa que teria usado como base, de que cada graduando custava R$ 100 mil por ano ao governo, ao mesmo tempo em que o repasse em merenda escolar para alunos de escolas públicas girava em torno de R$ 94 anuais.

Para ter uma ideia, somente em 2015 foram destinados R$ 3,7 bilhões pela pasta para manter a iniciativa. O mesmo valor foi investido na merenda escolar de 39 milhões de alunos da educação básica no Brasil.

Institucionalização

No mesmo ano de 2015 teve início uma discussão para tentar institucionalizar o programa (ou seja, torná-lo permanente). A ideia foi proposta pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT).

Em agosto do mesmo ano aconteceu a primeira audiência pública, que reuniu os senadores, pesquisadores, professores e estudantes. Entre eles estava Guilherme Rosso, ex-bolsista do Ciências sem Fronteiras e um dos fundadores da Rede CsF, organização não governamental que visa a integração e troca de experiência entre participantes do programa e parceiros que queiram juntar esforços.

Segundo Guilherme, a audiência serviu para quebrar alguns estereótipos criados a respeito do programa, como o argumento de que ele não dá retorno para o Brasil, assim como para mostrar casos de sucesso de estudantes que aprimoraram suas pesquisas por conta da oportunidade de trocar experiências em outro país.

Guilherme fez parte do primeiro edital do Ciência Sem Fronteiras e chegou aos Estados Unidos em 2012. Passados cinco anos da turma pioneira do programa, ele fez um balanço, em 2016, do que, em sua visão, poderia ser melhorado.

“A principal crítica que faço – e que fez parte, inclusive, da minha pesquisa de mestrado – é a falta de avaliação do programa. Sei que o Ciência sem Fronteiras é bom para o Brasil e que vai dar retorno, mas falta uma avaliação de forma estruturada.”, comentou.

Ele argumentou, por exemplo, que deveria ter sido feita uma pesquisa antes da ida do estudante para o exterior, a fim de possibilitar um comparativo histórico ao longo do tempo.

Guilherme também destacou a falta de planejamento na implementação das bolsas e na meta política que fez com que editais enviassem 7 mil bolsistas de uma vez. Com isso, foram suspensos critérios importantes na seleção dos estudantes, como desempenho acadêmico mínimo, participação em projeto de iniciação científica, dentre outros.

Por fim, também faltava um acompanhamento dos bolsistas depois do seu retorno ao Brasil: “Depois que a gente volta, ainda não há uma rede de pesquisa. Não existe uma avaliação para dizer quais os benefícios pós-ciências sem fronteiras”, explica. Ele ressaltou que a crise econômica e política agravaram a situação do programa.

Apesar de reconhecer essa falhas, Guilherme reafirmou a importância do programa para o país, destacando o impacto que o programa teria em alguns indicadores importantes, como o fato de termos poucos pesquisadores no Brasil e de que o investimento em pesquisa e desenvolvimento é de cerca de 1,2% do PIB; em outros países, como Estados Unidos, China e Israel, essa taxa supera 2%.

“É necessário que o Brasil tenha inserção internacional, principalmente em ciência e tecnologia, e para isso é preciso estar entre as redes globais de pesquisa e desenvolvimento, o que o Ciência sem Fronteiras proporciona”, contou.

A polêmica das bolsas canceladas

Em 2016, o programa Ciência sem Fronteiras passou a ser alvo de atenção por conta de denúncias de estudantes de pós-graduação que estariam com suas bolsas atrasadas. A Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG), que participa do Conselho Superior da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) , afirmou em nota, na época, estar negociando com a instituição o restabelecimento da normalidade do programa.

Em junho daquele ano, a Capes publicou um regulamento com atualizações de normas para bolsas no exterior. Um dos pontos que gerou mais apreensão por parte dos bolsistas foi o Art. 86, que dizia: “A concessão poderá ser suspensa ou cancelada a qualquer momento, em função da ausência de disponibilidade orçamentária e financeira da Capes, do desempenho do (a) bolsista ou ainda decorrente de qualquer situação considerada desabonadora, podendo ser exigida a devolução parcial ou total do investimento realizado em favor do (a) bolsista”.

Após este lançamento, que deixou dúvida quanto ao futuro das bolsas, foi lançada uma nota oficial, no dia 01/07,  afirmando que o Regulamento não trazia “nenhum prejuízo aos beneficiários com bolsas vigentes” e que todos os atuais bolsistas teriam “garantia de terminar seus estudos” desde que possuíssem mérito e estivessem cumprindo com as obrigações previstas, conforme termo de compromisso assinado no ato da aceitação da bolsa.

Ainda em nota, a Capes afirmou que, em 2016, 715 bolsistas submeteram pedidos de renovação de bolsa. Deste número, 22 (3%) não conseguiram renovação da bolsa pelos consultores, mas entraram com um pedido de reconsideração.

O novo regulamento teria como função apenas unificar e sistematizar normas. Ainda assim, o futuro do programa Ciência sem Fronteiras seguiu instável, tanto para quem é bolsista quanto para os alunos que pretendiam se candidatar no futuro.

O Ciência sem Fronteiras, em números

Em um balanço de 2016, o Ciência sem Fronteiras havia concedido, ao todo, 101.446 bolsas, sendo que 92.862 destas foram implementadas nas modalidades graduação sanduíche, mestrado, doutorado sanduíche, doutorado pleno, pós-doutorado e apoio a pesquisadores estrangeiros visitantes. Os principais destinos dos estudantes foram os Estados Unidos e o Reino Unido, sendo a Engenharia e as demais áreas tecnológicas as que mais tiveram bolsistas (45,1 mil).

Em novembro do ano passado, uma reportagem do jornal O Estado de S.Paulo revelou que o número de intercâmbios entre alunos de graduação e universidades públicas brasileiras caiu 99% com o fim do CsF.

Atualmente, segundo o MEC, a Capes discute novas estratégias de internacionalização e apoio à excelência nas universidades.

Este artigo foi originalmente publicado pelo Estudar Fora, portal da Fundação Estudar.

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