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Renato Krausz: ESG é uma estrada desconhecida e com muitos obstáculos

Pesquisa da Anbima com instituições do setor financeiro mostra que o caminho está só começando — e será muito longo

Ainda existem muitas dúvidas sobre o significado de ESG e inúmeros obstáculos para sua devida implementação. (Thithawat_s/Getty Images)

Ainda existem muitas dúvidas sobre o significado de ESG e inúmeros obstáculos para sua devida implementação. (Thithawat_s/Getty Images)

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Publicado em 27 de janeiro de 2022 às 09h00.

Por Renato Krausz*

Desde que o ESG dominou a pauta do ambiente corporativo, virou comum ouvir empresas dizerem que já nasceram sob este manto ou que não tomam nenhuma decisão sem seguir à risca os seus preceitos. É normal que seja assim, e não que seja de todo ruim, embora um tanto fantasioso.

Alguns olhares mais acurados revelam que ainda existem muitas dúvidas sobre o significado da sigla e inúmeros obstáculos para sua devida implementação, inclusive entre integrantes do mercado financeiro, setor que é tão somente o pai da criança — o ESG surgiu em 2004 num documento elaborado a quatro mãos entre o Banco Mundial e o Pacto Global.

Um desses olhares a que me refiro é a última pesquisa da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), chamada “Retrato da Sustentabilidade no Mercado de Capitais”, concluída no finzinho de 2021.

A pesquisa foi feita com 265 instituições — 209 gestoras de recursos, 30 bancos e 26 empresas de outras atividades, como corretoras ou distribuidoras — e avaliou o estágio de maturidade delas em relação à sustentabilidade e a adoção de critérios ESG na rotina do trabalho.

Apesar de quase a totalidade das 265 ver muita importância no tema, a maioria ainda não implementou ou está em processo de efetivação de práticas ESG. Os percentuais disso e daquilo, revelados pela pesquisa, já foram amplamente veiculados em reportagens, portanto vou focar em outra coisa: saltam aos olhos as dificuldades encontradas por esse pessoal para alcançar a implementação, a começar pela falta de conhecimento.

Os pesquisadores encontraram lacunas na própria capacidade de os executivos definirem o conceito de sustentabilidade. Há quem ache que ela está vinculada à solidez do negócio. Alguns, pasmem, ainda nem sequer ouviram falar de ESG. Essa é a primeira barreira. Depois, ao migrar da conceituação para a prática, outros obstáculos começam a fazer fila.

Um deles é a inexistência de um manual que estabeleça os parâmetros que todos devem seguir. Não há um passo a passo nem um checklist. Determinados objetivos podem parecer adequados para uma empresa e inadequados para outra. Aí complica mesmo.

Outro estorvo surge quando é necessário traduzir para a realidade brasileira o que as instituições financeiras daqui encontram no exterior. O ESG é universal, mas as questões que ele precisa observar e sobretudo as particularidades delas são em grande parte regionais. Ou seja, a chance de dar tilt nisso é grande.

Tem mais: a profusão de réguas e os múltiplos provedores de rating que aí estão acabam dificultando a comparação entre instituições e produtos, deixando o investidor, eu diria, meio grogue.

Diz o relatório da pesquisa: “A minoria de profissionais e instituições que está mais avançada na implementação de ações práticas para os compromissos ESG acaba descobrindo que existe uma multiplicidade de índices, cálculos e metodologias estrangeiras que são utilizadas, por entidades distintas, como forma de aferir, determinar ou verificar o impacto das medidas adotadas por companhias dos mais variados setores”.

Por fim, o risco de greenwashing. Diante da premência do tema, muita gente pode cair na tentação de falar mais e fazer menos. Dourar a pílula. Para os entrevistados na pesquisa, é fundamental a figura do regulador ou do autorregulador para evitar esse problema. Alguém que defina regras e traga algum padrão para medir o potencial de impacto de empresas de setores diferentes.

Penso que a própria Anbima tem um papel fundamental nisso. A entidade já promoveu um grande salto de qualidade no mercado ao organizar a balbúrdia dos fundos de investimento que até o ano passado se autointitulavam verdes (leia). Foi um grande avanço, mas há muito trabalho a ser feito ainda, por todos nós. O que não pode acontecer é ali na frente vermos o foguete intergaláctico do ESG virar para toda gente uma coisa diferente, uma pobre ideia com propensão a enfraquecer e definhar.

*Renato Krausz é sócio-diretor da Loures Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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