OMS cobra Brasil por atraso de repasses de acordo voluntário
O país atrasa repasses prometidos à Organização Mundial de Saúde (OMS) para financiar estudos e reuniões técnicas contra a epidemia do cigarro
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.
Brasília - Inerte na edição de normas mais rígidas de combate ao fumo, o governo federal também tem sido lento para cumprir acordos internacionais. Documentos obtidos pelo jornal O Estado de S.Paulo mostram que o País atrasa repasses prometidos à Organização Mundial de Saúde (OMS) para financiar estudos e reuniões técnicas contra a epidemia do cigarro.
O governo aderiu em 2003 à Convenção-Quadro para Controle do Tabagismo (CQCT), iniciativa de 192 países representados na OMS. Com isso, comprometeu-se a fazer contribuições a cada biênio, mediante faturas enviadas antecipadamente. Ofício da secretaria executiva da convenção, encaminhado ao Brasil em abril de 2011, cobra o pagamento, em dia, de US$ 187,1 mil (cerca de R$ 372 mil, no câmbio atual) para subsidiar as ações de 2012 e 2013. E informa o atraso em doações de anos anteriores.
A transferência para bancar atividades ao longo de 2006 e 2007 (R$ 329,9 mil), por exemplo, só foi feita três meses antes do fim desse período. Em abril de 2011, nenhum centavo para 2010-2011 havia sido enviado. Os R$ 201 mil prometidos só entraram na conta da OMS em 6 de junho de 2012, ou seja, passados seis meses do fim dos exercícios.
Cobrado, o governo justificou, em ofício, que a gestão de pagamentos à OMS havia sido transferida da Saúde para o Planejamento, o que motivou uma revisão de procedimentos e as dificuldades de repasse.
Em e-mail à Secretaria de Assuntos Internacionais do Planejamento, o assessor técnico Alexandre Martins de Lima, da Saúde, citou a saia-justa com a situação: Entendemos que, embora a contribuição seja voluntária, o compromisso assumido foi o de cumprir o que estabelece a referida Convenção-Quadro, mesmo porque pode-se reconhecer o constrangimento político em que o País se situaria, sendo um dos maiores produtores de tabaco do mundo e o maior exportador.
O valor para 2012-2013 ainda não foi pago, mas o governo promete enviá-lo até o fim do ano. A Saúde diz que não há atraso, pois, para financiar as atividades do biênio, os repasses podem ser feitos até 31 de dezembro.
Anvisa perdeu prazo para contestar
A Anvisa baixou uma de suas principais medidas em março passado, proibindo, a partir do fim de 2013, o uso de mais de 5 mil substâncias pela indústria do cigarro. Mentolados ou de cravo, por exemplo, estariam fora do mercado. Seis meses depois, o Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (Sinditabaco) entrou na Justiça Federal pedindo a suspensão da resolução. A agência foi intimada a contestar. A resposta chegou atrasada.
A demora levou o juiz federal substituto Alaor Piacini a conceder liminar ao Sinditabaco em 17 de dezembro. O governo deixou por isso mesmo. Um mês depois, entrou com agravo de instrumento para questionar a decisão. Agora, o caso será julgado por uma turma do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região. Esse vai e vem é pressão das tabaqueiras, disse Antonio Mirra, da Associação Médica Brasileira.
Procurada, a Anvisa enviou nota que não explica o atraso. Para o diretor da agência José Agenor Álvares da Silva, não havia chance de derrubar a liminar na primeira instância. Independentemente de o prazo ter sido descumprido, nossa contestação está muito boa, afirmou.
Na ação, o Sinditabaco diz que a entrada em vigor da resolução retiraria 99% dos cigarros do mercado, geraria desemprego e criminalidade. O juiz acatou o pedido por questões jurídicas: pelo ordenamento brasileiro, não caberia à agência produzir norma que proíba algo, pois somente as leis podem impedir o cidadão de realizar conduta.
Segundo Luiz Carlos Corrêa da Silva, da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, a postura da Anvisa revela descaso. Ele lembra que em novembro o governo chamou de volta quatro integrantes da delegação brasileira na Conferência das Partes da Convenção-Quadro do Tabaco, em Seul.