Lula deseja “nome de diálogo” na presidência da Câmara, mas Lira ainda terá peso na escolha
Impactos da desistência de Marcos Pereira (Republicanos-SP) de disputar o cargo e a escolha de Hugo Motta (Republicanos-PB) para substituí-lo no pleito mudaram o tabuleiro político
Repórter especial de Macroeconomia
Publicado em 5 de setembro de 2024 às 18h38.
Os impactos da desistência de Marcos Pereira (Republicanos-SP) de disputar o cargo e a escolha de Hugo Motta (Republicanos-PB) para substituí-lo mudaram o tabuleiro político para uma candidatura mais “amigável” ao governo, afirmaram à EXAME técnicos da ala política. Entretanto, os mesmos governistas admitem que nada está definido, diversos acordos precisam ser feitos e o aval de Lira ao escolhido também será necessário. A eleição para o novo presidente da Câmara, vale lembrar, acontece apenas em fevereiro de 2025.
Pereira, que preside o Republicanos, sofria forte resistência do PT e de membros do governo pela relação estreita que mantém com o bispo Edir Macedo, da igreja Universal. Macedo, que já foi próximo de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff, fez campanha para tentar reeleger Jair Bolsonaro em 2022.
“Diante deste cenário, abri mão de minha candidatura e decidi colocar ao presidente Arthur Lira a opção do líder da bancada do Republicanos, Hugo Motta, para que ele seja o nome de consenso entre todas as alas políticas do plenário. Uma decisão em prol da Câmara, de todos os deputados e do Brasil”, informou Pereira, em nota divulgada na última terça-feira.
Já Motta, que lidera o Republicanos na Câmara, é um político jovem de 34 anos, não possui o carimbo de membro da Universal, transita entre líderes do Centrão, do bolsonarismo e do dos partidos de esquerda. Além disso, sua candidatura depende de vários acordos com diversos partidos e autoridades, o que reduziria seu poder na largada, disse um auxiliar de Lula. “O que se pretende é não ter um outro presidente da Câmara com o perfil de Lira”, disse o mesmo assessor do presidente da República.
Lucas de Aragão, sócio da empresa de análise política Arko Advice, afirmou que Motta parece ter maior capacidade de atrair apoio e simpatia dos governistas e do grupo liderado por Lira para disputar a presidência da Câmara. Segundo ele, a tendência é que o deputado alagoano será pragmático e apoiará o candidato que agregará maior apoio entre os partidos. Entretanto, Aragão disse que as tratativas ainda levarão algum tempo.
Acordos para viabilizar um sucessor
Até a decisão do Supremo Tribunal Federal ( STF ), em agosto, de restringir o pagamento de emendas parlamentares, afirmou outro técnico governista, Lira tinha forte influência sobre os deputados e mantinha uma base fiel ao ponto de escolher seu sucessor, sem grande interferência do governo. Com a suspensão dos repasses, o presidente da Câmara mudou de postura e, nas últimas semanas, se reuniu diversas vezes para tratar a sua sucessão. “Mesmo dizendo que não interferiria no processo, Lula passou a ser consultado e terá voz ativa na sucessão para a Câmara”, disse um interlocutor.
No Planalto, a avaliação é de que Lira mudou de postura, quer negociar e poderia até ser ministro do governo, se os acordos permitissem. Os ministérios da Saúde e das Comunicações seriam opções. “Ele não quer deixar a presidência da Câmara e voltar para a planície”, disse um parlamentar próximo do deputado alagoano.
Duas vagas no Tribunal de Contas da União ( TCU ) também devem ser moedas de troca na sucessão da Câmara já que o governo pretende convencer o ministro Aroldo Cedraz a antecipar a aposentadoria. Ele completa 75 em 2026 e deixaria o posto compulsoriamente. A outra é do ministro Augusto Nardes, que tem sinalizado a disposição de se candidatar ao governo do Rio Grande do Sul pelo PL nas próximas eleições e anteciparia a aposentadoria.
Essas vagas, afirmam auxiliares de Lula, poderiam atender alguns dos pré-candidatos. Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e Antonio Brito (PSD-BA), que não tem sinalizado disposição em desistir de disputar a sucessão de Lira. Elmar se reuniu nesta quarta-feira em São Paulo com Gilberto Kassab, presidente do PSD, segundo informou O Globo.
No caso do Brito, afirmaram auxiliares de Lula, o desejo é de conquistar uma vaga no TCU. Nascimento não pretende abrir mão da candidatura e o governo cogita oferecer a ele uma vaga no tribunal. Entretanto, Pereira também deseja um acento na corte de contas, confidenciaram técnicos da ala política. Esse arranjo ainda precisa ser acertado. Publicamente, Pereira nega o interesse pelo TCU, conforme afirmou à Folha de S. Paulo. Num próximo passo, Pereira mira uma vaga no STF, segundo EXAME apurou.
Enquanto Motta surge como uma alternativa para a presidência da Câmara, Nascimento tenta convencer os petistas de que será um nome de diálogo. Ele tem trabalhado para se aproximar do ministro da Casa Civil, Rui Costa, e do senador Jaques Wagner (PT-BA), históricos adversários políticos na Bahia.
O deputado do União Brasil é histórico aliado de Antonio Carlos Magalhães Neto, que libera um grupo no partido que não aderiu a base governista. ACM Neto, inclusive, tem sinalizado disposição em embarcar na gestão petista caso Nascimento seja o próximo presidente da Câmara. Essa possibilidade, entretanto, sofre forte resistência de Costa e Wagner.
“Todos os jogadores no tabuleiro são profissionais. As reuniões de Lira com o presidente da República mostram que Lula passou a ser peça chave no processo. Mas nada está definido”, completou um técnico da ala política.