Há criança no celular, mas pisando no esgoto, diz chefe da BRK Ambiental
É inconcebível que o país já tenha universalizado o serviço de telefonia enquanto 100 milhões ainda estão sem esgoto, diz executiva
Estadão Conteúdo
Publicado em 13 de maio de 2019 às 13h58.
Última atualização em 13 de maio de 2019 às 14h03.
Brasília - Os investimentos na construção de redes de água e tratamento de esgoto podem dar um salto se o Congresso aprovar um novo maior legal para o setor, diz Teresa Vernaglia, presidente da BRK Ambiental, a maior empresa privada de saneamento do País.
Segundo ela, é inconcebível que o País já tenha universalizado o serviço de telefonia e de energia enquanto 100 milhões de pessoas ainda estão sem esgoto.
Teresa diz que a empresa, que hoje está presente em 180 cidades, quer expandir sua operação, mas não encontra projetos para disputar. Por isso, acompanha com ansiedade a tramitação da Medida Provisória 868, que muda as regras do setor e tem até o dia 3 de junho para ser aprovada.
Por que o setor de saneamento segue tão atrasado?
Há 20 anos, declarávamos o telefone fixo no Imposto de Renda e fazíamos fila para conseguir um. Hoje é um serviço universalizado, como o de energia. A primeira coisa que vemos de diferente em relação ao saneamento é que, nesses dois setores, não existem 49 agências reguladoras dizendo, no nível municipal, como será feito o contrato, quais são as metas de universalização, questionando tarifas já acordadas e mudando regras a cada período eleitoral. Isso explica em grande medida o atraso. Além disso, não existe escala, porque cada um dos 5.565 municípios pode decidir ou não fazer seus investimentos em infraestrutura, sendo regulado de forma descentralizada, o que torna o processo muito ineficiente.
A MP não ataca essa questão.
Sim, mas ela traz um ponto muito importante: através da Agência Nacional de Águas (ANA) serão criadas diretrizes nacionais que vão permitir que as regulações locais operem de forma padronizada. A ANA vai traçar metas de redução de perdas, a metodologia dos reajustes, o modelo tarifário. E haverá incentivo para que isso aconteça. Isso trará padronização e racionalidade ao setor.
A medida provisória prevê divisão de Estados para que licitações ocorram por blocos de municípios. Por que é importante?
Volto à comparação com outros setores da infraestrutura. Por que hoje todo mundo tem acesso no País à energia e a serviço de telefonia? Porque tudo é uma questão de como se modela e se gera escala. Agora há condição de se criar blocos, gerando escala, tornando municípios menores economicamente viáveis. Falava-se muito de municípios que seriam o "filé" e outros que seriam o "osso". Agora, teremos uma bisteca acebolada que funciona muito bem.
A definição de blocos ficará a cargo de Estados, dependerá de negociação com municípios. Há otimismo excessivo sobre os efeitos da medida provisória?
É difícil termos cenário pior do que o atual. Em pleno século 21, temos 100 milhões de pessoas sem acesso à rede de esgoto. Tem um retrato que gosto de ilustrar: vivemos num País onde vemos criança encostada num poste de energia elétrica, com antena parabólica ao fundo, falando ao celular, mas pisando no esgoto.
O governo diz que a abertura do setor a partir da MP trará investimentos de R$ 800 bilhões nos próximos 14 anos. É crível?
A BRK sozinha já investiu, nos últimos 18 meses, R$ 1,5 bilhão. Com os contratos que temos hoje, serão R$ 20 bilhões por 20 anos. É absolutamente factível esse nível de investimento. E o Brasil precisa.
O consumidor pode esperar aumento nos preços do serviço?
Hoje todo mundo paga por conta da energia e pacote de celular sem qualquer problema. Todo serviço precisa ser pago, mas é lenda dizer que as tarifas ficarão mais caras. Caro é pagar por um serviço que você não recebe.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.