De São Paulo a Cametá: as 214 cidades decisivas para Lula e Bolsonaro
Algumas poucas cidades com mais de 100 mil eleitores concentram metade do eleitorado brasileiro e são o alvo das campanhas nas próximas semanas
Carolina Riveira
Publicado em 13 de outubro de 2022 às 12h03.
Última atualização em 13 de outubro de 2022 às 13h31.
A dimensão continental brasileira força coordenadores de campanhas políticas a fazer escolhas. Afinal, onde os candidatos ao segundo turno para a Presidência da República devem concentrar seus esforços e recursos — com visitas oficiais, cabos eleitorais ou estratégias de mídia digital?
Embora o Brasil tenha mais de 5 mil municípios, a maioria dos eleitores se concentra em poucos lugares, que serão decisivos para o segundo turno da eleição presidencial.
Mais precisamente, segundo levantamento da EXAME, em um grupo de 214 cidades, que responde por mais de 77 milhões de eleitores.
Ou seja, metade do eleitorado nacional vive nesse seleto grupo de municípios com 100 mil ou mais eleitores, segundo dados de julho do Tribunal Superior Eleitoral.
Na lista, a cidade com mais eleitores é São Paulo (mais de 9 milhões) e a menor, Cametá, no Pará, com pouco mais de 100 mil eleitores.
No primeiro turno, Bolsonaro venceu em mais cidades desse grupo, na comparação com Lula. O ex-presidente, por sua vez, reduziu a desvantagem ao obter vitórias em áreas extremamente populosas, como São Paulo capital.
Ao todo, das 214 cidades com mais de 100 mil eleitores no Brasil:
- Lula venceu em 75 municípios (26,1 milhões de votos);
- Bolsonaro venceu em 139 municípios (27,5 milhões de votos);
- Na soma, Bolsonaro teve 1,4 milhão de votos a mais nesse grupo em relação a Lula.
Além de ter vencido de 16 capitais, Bolsonaro teve um padrão de vitórias sobretudo em cidades médias do Sudeste, que concentram muitos votos apesar de estarem no interior. Nas capitais, suas maiores vitórias vieram de Curitiba, Brasília (DF), Manaus, Goiânia e Rio de Janeiro.
Já o resultado de Lula entre as maiores cidades é puxado por cidades médias e capitais do Nordeste: Salvador, Fortaleza e Teresina são as capitais nordestinas onde Lula teve maior saldo de votos frente a Bolsonaro — isto é, a diferença entre ele e Bolsonaro —, ao lado de cidades grandes do interior dos estados, como Feira de Santana (BA), Juazeiro do Norte (CE) e Petrolina (PE).
Lula também levou a melhor em três capitais fora da região Nordeste, Belém, São Paulo e Porto Alegre, que haviam votado mais em Bolsonaro em 2018, mas migraram para o petista em 2022 — e juntas lhe concederam 760 mil votos a mais do que a Bolsonaro.
A disputa por São Paulo e Minas
Uma vez que na eleição brasileira cada voto conta, mesmo lugares em que um candidato perde podem ajudar na eleição nacional.
É essa a estratégia de Lula em São Paulo ou de Bolsonaro em Minas Gerais, onde ambos perderam, respectivamente, mas tentam aumentar seu percentual de votos no segundo turno. Também é o caso de Bolsonaro em estados do Nordeste — onde a campanha do presidente sabe ser improvável a vitória, mas busca ao menos reduzir a vantagem de Lula em votos absolutos.
Até a votação em 30 de outubro, essas 214 maiores cidades do país serão cruciais. Maior colégio eleitoral do país, São Paulo é disparado o estado com maior número de cidades de pelo menos 100 mil eleitores (são 59 cidades nesse status). O estado é seguido de longe por Rio de Janeiro (22 cidades), Minas Gerais (19 cidades) e Bahia (13 cidades).
Em terras paulistas, uma das principais vitórias de Lula foi na cidade de São Paulo, que sozinha tem 9,3 milhões de eleitores (quase um terço dos eleitores de todo o estado). Na capital, Lula recebeu 47,5% dos votos válidos, quase 10 pontos à frente de Bolsonaro. Em número de votos, foram mais de 650 mil a mais para Lula do que para Bolsonaro, o que fez de São Paulo a cidade com maior saldo para Lula contra Bolsonaro, ao lado de Salvador.
A vitória de Lula na capital paulista veio puxada por mudanças nos votos nas periferias em relação às eleições de 2018. Além disso, nos arredores da capital, Lula também venceu em 25 das 38 cidades consideradas como região metropolitana, enquanto, em 2018 (quando Fernando Haddad e Bolsonaro se enfrentaram), o PT venceu em só uma dessas cidades, Francisco Morato.
Bolsonaro, por sua vez, leva forte vantagem nos polos regionais do interior paulista, numerosos em eleitores. Em São José dos Campos, Sorocaba e Ribeirão Preto, todas cidades na casa dos 500 mil eleitores e polos econômicos de suas regiões, Bolsonaro teve de 15 a mais de 20 pontos percentuais de vantagem para Lula. A chegada à chapa de Lula de Geraldo Alckmin (PSB), que por décadas foi vitorioso nas regiões do interior, não foi ainda suficiente para que Lula mudasse a rejeição nesses lugares.
Fora da região metropolitana de São Paulo, a única grande cidade do interior paulista conquistada pelo PT foi Araraquara (mais de 180 mil eleitores), onde governa o prefeito Edinho Silva (PT), que é um dos responsáveis pela comunicação da campanha de Lula. Mesmo lá, a vitória foi apertada, de pouco mais de 3 pontos percentuais para Lula.
Há ainda as cidades com cenário aberto para o segundo turno e onde Lula teve derrota estreita, como pontos da Baixada Santista no litoral (em São Vicente e Praia Grande, Bolsonaro venceu, mas com menos de 4 pontos) e onde a campanha petista tentará reduzir a desvantagem. Na região, há influência forte de nomes como Márcio França (PSB), também aliado na chapa lulista.
Nesta terça-feira, 11, também esteve na Baixada o candidato ao governo de São Paulo pelo PT, Fernando Haddad (PT), que ficou no primeiro turno atrás do ex-ministro de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Como a EXAME mostrou, Lula tem concentrado a agenda em São Paulo neste início de campanha do segundo turno, tendo já passado por cidades como São Bernardo do Campo (SP), onde venceu, ou Campinas (SP), onde perdeu. Só na quarta-feira, 12, Lula fez grandes atos fora do estado no segundo turno, indo ao Rio de Janeiro (onde visitou Belford Roxo e o Complexo do Alemão) e a Salvador, na Bahia.
Já em Minas, a preferência dos eleitores foi mais dividida nas grandes do interior do que em São Paulo, com 11 cidades para Bolsonaro e sete para Lula.
A maior vitória de Lula nas cidades grandes e médias foi em Juiz de Fora (onde venceu por 18 pontos), enquanto a maior vitória de Bolsonaro foi em Ipatinga (onde venceu por 25 pontos). Bolsonaro, por sua vez, levou a capital Belo Horizonte, que sozinha tem 2 milhões de eleitores.
Na somatória do estado, incluindo as pequenas cidades, Lula venceu por 48,3% dos votos válidos, ante 43,6% de Bolsonaro (o placar mineiro praticamente replicou o nacional).
Pequenas cidades também definem o pleito
A concentração de eleitores em alguns municípios não significa que os demais são desimportantes na estratégia dos candidatos. Pelo contrário: se a eleição ocorresse só nas cidades com mais de 100 mil habitantes, o resultado do primeiro turno seria diferente, com vitória de Bolsonaro, e não de Lula.
Em Minas, por exemplo, Lula só venceu no estado graças às pequenas cidades, e o contrário vale para Bolsonaro em São Paulo.
Pequenos municípios do interior do Brasil, somados, totalizam a outra metade dos 156 milhões de eleitores, uma fatia importante e onde os candidatos não podem perder votos caso queiram vencer no segundo turno.
Mas, com uma eleição que caminha para ser acirrada e menos de três semanas de campanha pela frente, alguns pontos percentuais nos maiores municípios podem ser grandes o bastante para influenciar a eleição nacional. A artilharia das campanhas estará concentrada como nunca nesse pedaço do Brasil.