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Brasília em compasso de espera

Após a divulgação da delação de executivos do Grupo J&F, Brasília vive uma manhã atônita

MICHEL TEMER: torna-se natural que os líderes partidários, os ministros do STF e a elite econômica prefiram postergar a remoção do presidente do cargo /  (Ueslei Marcelino/Reuters)

MICHEL TEMER: torna-se natural que os líderes partidários, os ministros do STF e a elite econômica prefiram postergar a remoção do presidente do cargo / (Ueslei Marcelino/Reuters)

GK

Gian Kojikovski

Publicado em 18 de maio de 2017 às 14h02.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h15.

Brasília vive uma manhã de São Tomé, em que só se acredita vendo. Parlamentares, consultores e empresários esperam as provas materiais das graves acusações de corrupção que atingem o seio do Palácio do Planalto para tomar qualquer decisão.

Ao sabor de sua decisão, o ministro Edson Fachin tem nas mãos a decisão de levantar o sigilo das delações de Joesley Batista com os áudios que comprometem dois dos maiores caciques da política brasileira: o presidente peemedebista Michel Temer e o senador e agora ex-presidente do PSDB, Aécio Neves.

As cúpulas do PSDB da Câmara e Senado estão reunidas desde as 11 horas para alinhar os próximos passos. EXAME Hoje apurou que o partido deve desembarcar do governo assim que os áudios forem liberados pelo Supremo Tribunal Federal.

O clima no Congresso é de apreensão. Na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, só se viam presentes parlamentares da oposição, que pediam a renúncia de Michel Temer por incentivar os pagamentos mensais (e milionários) para comprar o silêncio do ex-deputado preso Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e seu operador Lúcio Funaro.

Na Câmara, a sessão seria em homenagem às defensorias públicas do país, mas o assunto foi outro. No lugar, parlamentares se revezavam em críticas a Temer e ao senador Aécio Neves. “Ninguém esperava isso, não é? É difícil até fazer uma avaliação”, disse à reportagem o deputado federal Pompeo de Mattos (PDT-RS). “Para o Aécio, caiu a casa. A se confirmar, o presidente também não tem mais condições”. O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), na tribuna, pediu a renúncia e, se fosse o caso, a população faça uso da “desobediência civil” contra os atos do presidente Michel Temer. O líder do PSOL, Glauber Braga (PSOL-RJ), afirma que oposicionistas e a bancada do PSB, em tese aliado de Temer, entregarão um novo pedido de impeachment na Mesa Diretora da Câmara, incluindo desta vez o crime de obstrução à Justiça, ausente em todos os outros documentos.

Os debates mais críticos estão na base aliada. Nos corredores do Congresso, membros da aliança de Temer discutem reservadamente quais seriam os cenários para montar uma eleição indireta e quais seriam os candidatos. Todos os partidos estudam um desembarque, mas os mais cautelosos aguardam a liberação dos áudios que comprovam por “a+b” que o presidente está atolado no esquema e como será a defesa dada em seu pronunciamento, marcado para as 16 horas da tarde desta quinta-feira. Partidos menores (ou com menos a perder) são os mais apressados. Segundo o líder do PPS na Câmara, Arnaldo Jordy (PPS-PA), o partido defende a renúncia e vai entregar seus dois ministérios da Cultura, com Roberto Freire, e Defesa, com Raul Jungmann.

A questão é mais delicada nas legendas dominantes. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso dá as pistas dos próximos passos de seu partido em post no Facebook. “É preciso saber com maior exatidão os fatos que afetaram tão profundamente nosso sistema político e causaram tanta indignação e decepção. É preciso dar publicidade às gravações e ao fundamento das acusações”, diz. “Se as alegações de defesa não forem convincentes, e não basta argumentar são necessárias evidências, os implicados terão o dever moral de facilitar a solução, ainda que com gestos de renúncia. O país tem pressa”.

No início da tarde, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) anunciou a paralisação completa da tramitação da reforma trabalhista, um dos principais objetivos do governo para o curto prazo. “A crise institucional que estamos enfrentando é devastadora e precisamos priorizar a sua solução”, diz a nota. “Não há como desconhecer um tema complexo como o trazido pela crise institucional. Todo o resto agora é secundário”. Os sinais de que os parlamentares não serão complacentes com o governo só se acumulam.

O partido é (ou foi) o mais próximo e com mais influência dentre os parceiros do governo Temer, por ironia do destino tem seu presidente envolvido no esquema. Aécio Neves, inclusive, foi o principal alvo da Operação Patmos, deflagrada na manhã desta quinta-feira. Seus imóveis foram vasculhados em ações de busca e apreensão, sua irmã, Andrea Neves, e seu primo Frederico Pacheco de Medeiros foram presos. O mineiro, por fim, foi afastado do mandato de senador e só não foi preso porque o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo, negou pedido de prisão da Procuradoria-Geral da República. Durante a reunião do partido ficou definido também que o tucano seria afastado da presidência do partido, dando lugar ao deputado federal Carlos Sampaio, que assume interinamente para convocar novas eleições.

A realidade é que, segundo analistas, os partidos vão continuar saindo enquanto mensuram os custos de manter o apoio ao presidente em detrimento do retorno do país para a crise política. Apoiar Temer a um ano da eleição não contribui para a imagem dos políticos que almejam uma reeleição. “O governo como era ontem acabou. O mínimo de continuidade da agenda de reformas depende da saída adotada. Uma eleição indireta com um nome de consenso seria o menos traumático”, afirma Wagner Parente, diretor da consultoria política Barral M Jorge. “A aprovação de uma emenda para eleição direta gera uma incerteza imensa. Nesse cenário, com Lula forte, a pressão da iniciativa privada para uma saída que não esfacele a agenda econômica deve ser grande”.

Para a consultoria de risco político Eurasia, uma vez divulgados os áudios, dificilmente Temer teria sustentação até para terminar o mandato. “As alegações são justificativa viável para impeachment. Mas o resultado mais provável seria empurrar para o Tribunal Superior Eleitoral a função de derrubar Temer no processo de cassação em curso”, diz o relatório de hoje.

Há um consenso: a maior chance é de não terminar o mandato. “Se Temer decidir lutar, das duas uma: ou vai tirar o maior coelho da cartola da história do país e ir adiante, ou vai manter um governo completamente inviável e paralisado”, diz Lucas de Aragão, diretor da consultoria Arko Advice. “O áudio vai definir o grau de derretimento da base e se Temer renuncia, resolvendo imediatamente, se vai para o TSE, em curto ou médio prazo, ou se teremos outro processo de impeachment, a longo prazo”.

Independente da aposta, o cenário para o presidente Temer é difícil. Agora, são duas contagens regressivas: a liberação dos áudios de Joesley e o pronunciamento de Temer às 16h.

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