O setor agrícola de Gaza, arrasado pela guerra
Em 2022, a Faixa de Gaza exportou 44,6 milhões de dólares (R$ 245,1 milhões na cotação atual) em produtos agrícolas, especialmente para Cisjordânia e Israel
Agência de notícias
Publicado em 7 de julho de 2024 às 19h40.
Os rastros de um tanque ainda estão frescos em um terreno na região costeira de Al Mawasi, no sul da Faixa de Gaza , onde Nedal Abu Jazar lamenta os danos causados pela guerra às suas colheitas.
"Olhe para a destruição", disse este agricultor de 39 anos à AFP enquanto segurava um pé de tomate arrancado, dentro de uma área designada pelo Exército israelense como zona humanitária.
"Havia pessoas trabalhando pacificamente em suas terras (...) e de repente os tanques chegaram e começaram a disparar contra nós. Depois houve bombardeios aéreos", relatou.
Abu Jazar afirmou que a operação israelense no final de junho destruiu cerca de quatro hectares de terra e matou cinco trabalhadores.
O caso dele não é isolado. Ao longo de Gaza, 57% das terras aráveis foram danificadas desde o início da guerra, de acordo com uma avaliação conjunta publicada em junho pelas agências agrícola e de satélite (Unosat) da ONU.
Os danos ameaçam a soberania alimentar de Gaza, disse à AFP a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), já que 30% do consumo de alimentos no território palestino vêm de suas terras produtivas.
"Se quase 60% da terra agrícola tiver sido danificada, isso poderia ter um impacto significativo em termos de segurança alimentar e fornecimento de alimentos", afirmou.
Em 2022, a Faixa de Gaza exportou 44,6 milhões de dólares (R$ 245,1 milhões na cotação atual) em produtos agrícolas, especialmente para Cisjordânia e Israel. Morangos e tomates representaram 60% desse total, segundo a FAO.
Essa cifra caiu para zero após os ataques de 7 de outubro do movimento islamista palestino Hamas contra Israel, que resultaram em 1.195 mortes, em sua maioria civis, de acordo com um balanço da AFP baseado em números israelenses.
A retaliação israelense tirou a vida de pelo menos 38.098 pessoas, também na maior parte civis, de acordo com dados do Ministério da Saúde de Gaza, território governado pelo Hamas desde 2007.
O sistema da ONU de avaliação da fome estimou em junho que 96% de Gaza enfrenta um alto nível de insegurança alimentar aguda.
Contatado pela AFP, o Exército israelense afirmou que "não danifica intencionalmente as terras agrícolas" e também indicou em um comunicado que o Hamas "frequentemente opera dentro de pomares, campos e terras agrícolas".
Sem trabalho, sem renda
O impacto é pior no norte do território palestino, onde 68% das terras agrícolas foram danificadas, embora o sul, que inclui partes de Al Mawasi, tenha registrado o maior aumento devido às operações militares.
Lars Bromley, da Unosat, disse à AFP que os danos geralmente ocorrem "devido ao impacto de atividades como a presença de veículos pesados, bombardeios, projéteis e outras dinâmicas do conflito".
Perto da cidade de Rafah, no sul da Faixa, o agricultor Ibrahim Dheir, de 34 anos, ficou desanimado depois que dois hectares de terra que ele arrendava foram destruídos, junto com todo o seu equipamento agrícola.
"Assim que entraram escavadeiras e tanques israelenses, começaram a destruir as terras plantadas com árvores frutíferas diversas, incluindo frutas cítricas, goiaba, e cultivos como espinafre, melão, berinjela, abobrinha, abóbora e girassóis", contou.
Dheir, cuja família exportava para a Cisjordânia e Israel, sente os efeitos da guerra.
"Antes dependíamos da agricultura para sobreviver, mas agora não há trabalho nem renda", lamentou.
Danos duradouros
O agricultor Abu Mahmoud Za'arab também ficou "sem fonte de renda".
O homem de 60 anos tinha 1,5 hectare de terra, no qual cultivava vegetais e frutas.
"O Exército israelense passou pela terra e arrasou completamente as árvores e plantações", disse à AFP.
Os danos causados às terras agrícolas durarão mais do que os rastros de tanques e as explosões, indicou Bromley, da Unosat.
"Com armas modernas, certa porcentagem delas falhará. Existem projéteis de tanque que não explodem, projéteis de artilharia que não explodem (...) e limpar esses materiais não detonados é uma tarefa cansativa", disse.
Apesar dos riscos, Dheir quer voltar à agricultura.
"Queremos que a guerra acabe e que as coisas voltem ao que eram, para que possamos voltar a cultivar a terra".
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