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Comprar startups dá resultados?

A pergunta de um bilhão de dólares é: vale a pena adquirir uma startup? A resposta é mais complexa do que um sim ou não. Ela depende de vários fatores.

 (Annie Spratt/Unsplash)

(Annie Spratt/Unsplash)

O Instagram foi lançado em 2010. Se tornou um fenômeno de crescimento, aproveitando a crescente melhoria das câmeras dos celulares e oferecendo filtros criativos. A ideia era tornar qualquer pessoa um fotógrafo profissional. Dois anos depois de sua criação, o Instagram era adquirido pelo Facebook, por 1 bilhão de dólares, pagos em dinheiro e ações. Na época, o Facebook tinha quase 1 bilhão de usuários, cerca de 30 vezes o volume da empresa adquirida. Mark Zuckerberg foi extremamente criticado pela decisão, especialmente pouco antes da oferta pública inicial da empresa.

(Statistacharts/Instagram)

A pergunta de um bilhão de dólares é: vale a pena adquirir uma startup? A resposta, como sempre, é mais complexa do que um sim ou não. Ela depende de vários fatores.

Mundialmente, observamos um aquecimento deste movimento, impulsionado pela pandemia e rápida mudança do mercado, caracterizado pela crescente digitalização dos produtos e serviços, além do contato com os consumidores. Um dos poucos legados positivos da crise que estamos vivendo é a aceleração de diversas tendências.

Em questão de algumas semanas, a adoção de contratos digitais e consultas via telemedicina se tornou praticamente padrão no mercado. Estes movimentos iriam acontecer de qualquer modo, mas a pandemia acelerou em alguns anos várias dessas tendências.

Nas grandes empresas brasileiras, observamos uma profissionalização considerável das áreas de M&A (mergers and acquisitions, ou "fusões e aquisições", em português) e Corporate Venture Capital (o investimento minoritário em startups por parte das empresas) nos últimos dois anos. Comparando 2019 com 2020 (usando as bases Crunchbase, Dealhub e Slinghub), percebemos um crescimento de 17% no volume de negócios nos períodos equivalentes.

Os maiores compradores, nestes últimos dois anos, foram empresas e grandes startups relacionadas ao mercado digital, ou que utilizam os canais digitais como fonte de aquisição e relacionamento com clientes. Se destacaram o Magalu (com cinco aquisições), Vtex, XP e Loft (com quatro startups cada uma).

Observamos uma correlação direta entre a intensidade das aquisições e a performance de mercado ou crescimento dos compradores. Acreditamos que as empresas mais agressivas em suas estratégias de inovação combinam várias formas de execução, desde a construção de negócios dentro de casa até a parceria e, eventualmente, acordos societários com parceiros.

Essa lógica vale para quando uma empresa quer criar um novo canal de distribuição, lançar um novo produto ou serviço agregado, obter mais eficiência operacional, ou trazer novas competências para a companhia. Muitas vezes, são vários destes fatores somados. Sem dúvida, uma das grandes vantagens de adquirir uma startup é também o time talentoso que vem junto nesse processo.

Com o Facebook não foi diferente. Mark Zuckerberg investiu pessoalmente horas do seu tempo para conhecer e conquistar a confiança dos fundadores do Instagram, Kevin Systrom e Mike Krieger. O Facebook foi criado um pouco antes da revolução da mobilidade. Em pouco tempo o mundo todo começou a utilizar smartphones e toda a tecnologia e a forma de pensar do Facebook estava voltada para o mundo do desktop. O Instagram nasceu móvel e soube criar um produto que rapidamente conquistou os corações e mentes dos jovens.

O valor da aquisição do Instagram foi praticamente o faturamento do Facebook naquele ano. Na época da aquisição, a startup ainda não possuía modelo de negócios. Se fôssemos utilizar um método de valuation (precificação do negócio) tradicional, utilizando o fluxo de caixa descontado, o valor final seria muito inferior à quantia oferecida. Ironicamente, a empresa tinha acabado de recusar uma oferta de 500 milhões de dólares do Twitter, o principal concorrente do Facebook na época.

Deixando o time do Instagram operando de forma autônoma e, ao mesmo tempo, oferecendo todos os recursos que a jovem startup necessitava para crescer, além de um forte apoio na aquisição de usuários utilizando a plataforma do Facebook, fez com que as sinergias levassem o número de usuários ativos rapidamente a novos patamares.

Ao ligar a máquina comercial já existente na empresa-mãe para comercializar espaço no aplicativo, foi gerada uma nova fonte de receita bilionária para a empresa já consolidada. Hoje, estima-se que a contribuição do Instagram para o valor de mercado do Facebook tenha sido de aproximadamente 152 bilhões de dólares, tornando a aquisição muito bem-sucedida.

Acredito que a aquisição de startups pode ser uma estratégia de rápida aquisição de competências e aceleração das estratégias de digitalização. Existem dezenas de casos de geração de valor desproporcional neste tipo de negócio. Entretanto, este movimento é muito mais complicado do que parece. Já acompanhamos dezenas de processos de fusões e aquisições e percebemos que uma das principais características dos acordos bem-sucedidos é a correta escolha entre a independência e/ou integração dos negócios.

Nos casos em que o interesse é trazer uma competência nova para a empresa, ou um produto que complemente o portfólio atual, faz sentido pensar na integração da startup ao negócio existente. E, acreditem, fazer este movimento não é trivial.

Os principais inimigos são as diferenças culturais entre os negócios, o tamanho desproporcional de um em relação ao outro e o baixo preparo técnico e metodológico da empresa que está adquirindo. O alinhamento de expectativas entre os envolvidos é um dos pontos cruciais. Em diversos casos, faz sentido que os sócios da startup permaneçam na empresa, muitas vezes em posições não relacionadas ao seu negócio.

A compra de startups é apenas um elemento de uma boa estratégia de inovação. Em várias ocasiões, faz sentido a construção das competências dentro de casa. O mercado digital é muito dinâmico e em 2016 um aplicativo chamado Snapchat estava se tornando uma clara ameaça ao Facebook. Com forte apelo ao público jovem, o Snapchat criou uma experiência divertida, onde o conteúdo ficava durante horas disponível aos usuários e depois sumia.

Era uma abordagem bem diferente do resto do mercado. Depois de tentar, sem sucesso, criar opções concorrentes, o Facebook decidiu incluir esta funcionalidade dentro de seus produtos, especialmente o Instagram. Em poucos meses, a funcionalidade tornou-se uma sensação e reduziu consideravelmente a curva de crescimento do rival.

Nos tempos atuais, pensar estrategicamente e velocidade na execução se tornam fundamentais. Fazer boas parcerias e extrair o melhor destas relações é o que vai diferenciar as empresas que se manterão relevantes daquelas que lentamente perderão mercado para a concorrência. No mundo dos negócios, o óbvio só se torna óbvio quando olhamos no retrovisor.

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