Tecnologia

Os wereables estão mortos?

Os dispositivos vestíveis surgiram como a nova onda na tecnologia, mas encontram dificuldades em encontrar uma aplicação

ÓCULOS EM EVENTO DO GOOGLE: até 50% dos dispositivos são abandonados depois de seis meses de uso / Justin Sullivan/ Getty Images

ÓCULOS EM EVENTO DO GOOGLE: até 50% dos dispositivos são abandonados depois de seis meses de uso / Justin Sullivan/ Getty Images

GK

Gian Kojikovski

Publicado em 23 de março de 2017 às 12h08.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.

Quando o Google anunciou, em 2013, o Google Glass, um de seus projetos de hardware mais ousados, o mundo da tecnologia se viu de frente para o que poderia ser uma nova revolução. Os dispositivos tecnológicos, dizia-se, estava se aproximando dos seres humanos, e se incorporando ao nosso dia-a-dia. Era a hora de vestir os dispositivos. Os “wearables” iriam finalmente acoplar de vez a tecnologia às pessoas, e o Glass era o primeiro passo.

Jornalistas, consultores e especialistas em tecnologia, poucas vozes se levantaram para dizer que a tendência estava errada, ou ao menos exagerada. Nos anos seguintes, sob essa promessa, não faltaram wearables sendo lançados no mercado – de pulseiras monitoras de atividades físicas a relógios inteligentes. No fim das contas, chegamos a 2017 e a promessa, basta olhar a seu redor, não passou de uma promessa mesmo. Quantos colegas de trabalho usam óculos, relógios e pulseiras inteligentes?

Vários motivos estão por trás do fracasso dos wearables. Para começar, eles não fazem jus ao “wear” (vestir, do inglês), de seu nome. Normalmente são acessórios feios, ou que não vinham mais sendo usados no dia-a-dia, como pulseiras e relógios. Os produtos também fazem o consumidor sofrer com baterias que acabam rápido, além de ainda serem limitados para o que se propõe, sem falar no preço, acima do que era esperado. “Quando foram lançados os primeiros produtos, eles estavam aquém do que o mercado esperava. Não eram feitos para ser de massa, pareciam mais uma curiosidade”, diz Ricardo Chisman, diretor-executivo da consultoria Accenture.

Tudo isso leva a um abandono de até 50% dos dispositivos depois de seis meses de uso, de acordo com uma pesquisa feita pela consultoria Frost & Sullivan. Outras consultorias especializadas em tecnologia também encontraram números parecidos. “Em nossa última pesquisa anual, feita em 2016, encontramos evidências de que há uma grande taxa de abandono para wearables. Muitos usuários ficam entediados depois de alguns meses usando o dispositivo, mesmo que eles estivessem interessados quando compraram”, diz Annette Zimmermann, diretora de pesquisas em wearables da consultoria americana Gartner. “Isso é algo que os fornecedores precisam abordar, eles precisam criar produtos mais atraentes e manter os usuários engajados”.

Um exemplo claro de como a venda de wearables foi superestimada no início é o relógio inteligente Apple Watch. No início de 2015, os bancos de investimento que analisam números da Apple tinham previsões bem otimistas para o produto. Na visão do Bernstein, a empresa terminaria 2016 vendendo 20 milhões de smartwatches; de acordo com o UBS, seriam 40 milhões. A Apple não divulga os números, mas segundo a consultoria Canalys, especializada em análise de mercado no setor de tecnologia, foram vendidos menos de 12 milhões de Watches durante o ano. Mesmo assim, a empresa com sede em Palo Alto ainda é dona de metade do mercado.

Mas nem tudo são notícias ruins. Depois de ver os números do segundo trimestre de 2016 caírem até 55% em relação ao mesmo período de 2015, o Apple Watch teve seu melhor trimestre da história nos últimos três meses de 2016, vendendo cerca de 6 milhões de unidades, 12% a mais que no mesmo período do ano anterior. Essa recuperação traz a esperança de que, enfim, cinco anos depois de os primeiros produtos serem anunciados, os wearables podem estar tomando tração no mercado.

Com a demora para que a tecnologia decole, as primeiras empresas já estão ficando pelo caminho. Foi o que aconteceu com a canadense Pebble, a primeira grande promessa do setor. O único produto da empresa era um smartwatch – o primeiro com esse conceito, depois copiado por diversos concorrentes – que levava o mesmo nome. Com dificuldades para receber dinheiro em uma época em que os investidores não davam muita bola para startups de hardware, o criador da empresa, Eric Migicovsky, resolveu colocar sua ideia na plataforma de financiamento coletivo Kickstarter. O resultado foi a campanha de maior sucesso do site até então, reunindo 10,3 milhões de dólares.

A partir daí, foram quase 60 milhões de dólares levantados, mais de 100 funcionários contratados e mais de 2 milhões de smartwatches vendidos. Mas os números não se mostraram suficientes para ganhar dinheiro e a startup passou a ter problemas durante o ano de 2016, até ser vendida para a Fitbit, que produz monitores de atividade física, principalmente pulseiras. A própria Fitbit reportou um prejuízo de 102 milhões de dólares em 2016 e, no último trimestre, vendeu quase 2 milhões de dispositivos a menos que no mesmo período de 2015, embora o número de produtos vendidos ao longo de todo o ano tenha sido um pouco superior.

Existe salvação?

Se existe uma esperança para os fabricantes, é a de que os wearables podem ser apenas uma tecnologia que demorou a pegar. Os smartphones também levaram tempo para chegar ao grande público. Primeiro, se tornaram uma solução para executivos que precisavam estar conectados por mais tempo aos seus e-mails. Só com a chegada do iPhone, em 2007, o produto se tornou uma unanimidade para o grande público. O mesmo pode acontecer agora. “A tendência é de que os wearables sejam adotados primeiro no mercado corporativo, onde já começam a ter mais funções, e depois venham para o mercado consumidor geral”, diz Márcia Ogawa, líder da área de tecnologia, mídia e telecomunicações da consultoria Deloitte.

Mas, enquanto os smartphones se transformaram em um produto que tem como principal função reunir atividades (ligar, chamar o táxi, usar o banco, jogar, etc?), os wearables precisam encontrar uma função específica para serem úteis. “Tem que ficar claro o benefício que o produto tem e as empresas precisam trabalhar nisso. É preciso uma função clara para fazer alguém mudar um hábito. Claramente, os wearables estão demorando a decolar porque não resolvem um problema, são produtos genéricos ainda, e isso precisa mudar”, diz Chisman, da Accenture, que aposta que a adoção dos vestíveis deve acelerar a partir deste ano.

A prova de que funções específicas podem salvar essa tecnologia são os óculos de realidade virtual, como o PlayStation VR, da Sony. Embora especule-se diversas funções para esses produtos, a primeira delas é trazer mais imersão para os videogames. De acordo com o Gartner, o número de dispositivos como esse vendidos vai saltar de dois milhões de unidades em 2016 para 40 milhões em 2020, com um faturamento de 30 bilhões de dólares no total.

O crescimento nas vendas de wearables pode criar um ciclo virtuoso, já que quanto mais produtos no mercado, mais funções são criadas para eles. As pulseiras, por exemplo, são usadas em parques de diversões e grandes eventos para identificação e pagamentos. Pode ser que, enfim, os wearables encontrem sua função no dia-a-dia das pessoas.

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