Revista Exame

Como estas empresas aproveitaram a 'tempestade perfeita' das startups para dar novos saltos

Resposta de muitas empresas às incertezas globais é apertar o cinto, enquanto outras aproveitam para investir em tecnologias que as tornam mais competitivas

Sarah Franklin, presidente e CMO da Salesforce: novos tempos para os profissionais de marketing (Divulgação/Divulgação)

Sarah Franklin, presidente e CMO da Salesforce: novos tempos para os profissionais de marketing (Divulgação/Divulgação)

Da Redação
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Redação Exame

Publicado em 26 de abril de 2023 às 06h00.

Se alguém tinha dúvida de que a maré virou para as startups e para as big techs, os layoffs que muitas delas se viram obrigadas a realizar nos últimos meses deram o assunto por encerrado. Motivos para justificar tantos desligamentos não faltam — os mais conhecidos são os distúrbios provocados pela inflação, a retração do mercado global e os problemas registrados nas cadeias de suprimentos, muitas das quais ainda fortemente afetadas pela pandemia. 

A reação imediata de muitas empresas a um conjunto de incertezas é apertar o cinto e olhe lá. Outras, porém, preferem aproveitar o mesmo contexto para se tornarem mais competitivas. É o caso da Natura &Co, que, com a recente venda da Aesop para a L’Oréal, resolveu seu problema de alavancagem e se viu livre para voltar a investir. Detalhe: a transação ocorreu em paralelo ao colapso do Silicon Valley Bank e às turbulências do Credit Suisse e saiu por 2,5 bilhões de dólares em quitação única (eram previstos 2,2 bilhões de dólares, divididos em parcelas).

Em 2020, a companhia de Antônio Luiz Seabra e Guilherme Leal fez outro movimento igualmente ousado, em outra direção. Depois de adquirir a Avon, decidiu investir na plataforma digital de serviços de beleza Singu. O valor aportado, que abre a possibilidade de uma aquisição por completo no futuro, não foi divulgado. Mas o que fez com que a Natura &Co se associasse à Singu, cujo fundador é Tallis Gomes, o mesmo da Easy Taxi, foi alardeado aos quatro ventos. O negócio foi costurado para permitir renda extra às milhares de consultoras de beleza da Natura.

Por meio da Singu, elas podem oferecer serviços de maquiadora, cabeleireira e manicure. E a plataforma é mais um estímulo para que todas se convertam em influenciadoras digitais. Também dona da The Body Shop, a Natura sabe que o tempo das vendas porta a porta ficou no passado. A Singu tem mais de 3.000 profissionais de beleza cadastrados e uma base de 200.000 clientes. No Brasil, estima-se, o mercado de serviços de beleza movimenta mais de 50 bilhões de reais a cada ano.

O que mostram os números?

Sempre que o panorama se mostra menos favorável para os negócios, no entanto, o dilema enfrentado por toda e qualquer companhia continua sendo o mesmo: cortar custos ou aproveitar a tempestade para dar novos saltos? As lideranças de hoje, entretanto, costumam dispor de uma vantagem e tanto para se decidirem: dados e mais dados. De acordo com a Salesforce, porém, 59% dos líderes brasileiros não aproveitam o potencial dos dados para impulsionar seus negócios ou tomar decisões relacionadas, por exemplo, à inflação. Líder mundial em soluções de gestão de relacionamento com clientes (CRM), a companhia chegou a essa conclusão depois de entrevistar os mandachuvas de mais de 1.000 empresas verde-amarelas. 

Constatou também que 58% dos executivos não compreendem os dados à mão e que 36% se dizem incapazes de gerar insights a partir deles. Quantos entrevistados alegam estar sobrecarregados com a quantidade de dados disponíveis que, por sinal, devem dobrar de tamanho até 2026? Quase 26%. Há uma reação em curso, no entanto. E é por isso que 88% das companhias consultadas planejam continuar investindo no desenvolvimento dos funcionários encarregados da análise de dados ou aumentar os gastos com isso. 

“O segredo para gerar insights é conectar dados com análises”, recomenda Juan ­Perez, chief information officer (CIO) da Salesforce. “Essa combinação permite que as empresas maximizem seus investimentos em tecnologia e descubram oportunidades que impulsionem a estratégia de negócios e fortaleçam a confiança do cliente.” 

Muitas empresas, acredita o executivo, precisam suprir uma lacuna de habilidades digitais para extrair valor dos dados de que dispõem. “Os líderes empresariais enfrentam um dos momentos econômicos mais difíceis dos últimos tempos”, ressalta Perez. “Mas eles têm uma vantagem inexplorada para uma melhor tomada de decisão: seus dados.” 

Avaliação integrada

A Pedra Agroindustrial que o diga. Na ativa desde 1931, produz etanol, açúcar e energia elétrica à base de cana-de-açúcar. As três unidades produtoras da companhia se encontram no estado de São Paulo — nos municípios de Serrana, Buritizal e Nova Independência. Trata-se de uma empresa sempre às voltas com a formalização de contratos, os quais envolvem desde parceiros agrícolas, que cedem terreno para o cultivo da principal matéria-prima do negócio, até fornecedores. 

Henrique Weaver, CEO da Pagaleve: rodada série A apesar de cenário econômico mais adverso (Divulgação/Divulgação)

Ciente das vantagens de usar dados a favor do negócio, a Pedra Agroindustrial passou a utilizar o Customer 360. Trata-se de uma solução da Salesforce que permite a integração das equipes de marketing, vendas, comércio, serviços e TI. O foco atual da companhia paulista é automatizar a avaliação dos contratos que impactam o dia a dia de todos. Deu tão certo que, em alguns casos, o tempo de análise baixou para meros 2 minutos — antes era de até duas semanas. 

O Customer 360 também favorece análises de dados mais precisas e tem evitado que a companhia perca prazos de renovação de contratos, além de azeitar o relacionamento com parceiros e fornecedores. A adoção dos novos processos foi acompanhada de perto pela Nèscara, empresa de consultoria especializada em transformação digital e parceira da Salesforce desde 2015. 

“Desde a implantação, nossa equipe foi capacitada para identificar e corrigir, de forma imediata, os problemas que existiam nos processos de gestão dos contratos”, lembra Alexandre Miranda, que está à frente do setor de controles internos da Pedra Agroindustrial. “A automatização é o alicerce de um projeto mais amplo focado no relacionamento com parceiros agrícolas e fornecedores. Teremos um portal dedicado a esses públicos para um relacionamento cada vez mais assertivo.” 

Novos meios para o consumidor

Outra empresa que conseguiu a façanha de ficar mais competitiva em meio a turbulências foi a Pagaleve. A fintech oferece uma alternativa para quem não tem cartão de crédito, mas quer dividir o pagamento de compras online: parcelamento via Pix em até quatro vezes — quinzenais e sem juros. As 1.300 varejistas que já optam pela solução, como Reserva e Tok&Stok, recebem os valores com apenas um dia de diferença. E, segundo a startup, aumentam a taxa de conversão de 25% a 40% e o tíquete médio em até 50%. De acordo com o Morgan Stanley, o segmento chamado de buy now, pay later (“compre agora, pague depois”) deverá atingir 21 bilhões de dólares em receita no Brasil até 2026.

Em agosto do ano passado, quando os fundos de venture capital já estavam bem mais seletivos, a Pagaleve deu início à rodada série A. A captação foi liderada pelo fundo de venture capital da Salesforce, que ainda não havia investido no Brasil, e acompanhado pelas gestoras Entrée ­Capital, Founder Collective, OIF Ventures, Endeavor Scale-Up Ventures e Janeiro Energy. A rodada foi concluída em dezembro, com um aporte da BB Ventures. Ao todo, a startup captou aproximadamente 25 milhões de dólares.

“Entre os últimos dez anos, 2022 foi o mais difícil para empresas como a nossa levantar dinheiro”, registra Henrique Weaver, CEO e um dos fundadores da startup. “O escrutínio é cada vez maior.” O executivo está coberto de razão. A última edição da pesquisa Fintech Deep Dive, feita pela PwC Brasil em parceria com a Associação Brasileira de Fintechs (­ABFintechs), concluiu que 80% das startups financeiras do país estão em busca de capital — e que 69% delas financiam suas atividades com recursos próprios. 

Desafios globais

Para as equipes de marketing, as incertezas econômicas trouxeram desafios sem precedentes. De acordo com a oitava edição do relatório State of Mar­keting, que se debruça sobre as principais tendências do setor para 2023, 81% dos profissionais da área acreditam que o trabalho deles é mais valorizado hoje em dia do que há um ano. O peso sobre os ombros, porém, também é muito maior. Elaborado pela Salesforce, o relatório tem como base as respostas de 6.000 gerentes, diretores e vice-presidentes de marketing, além de CMOs, de 35 países, incluindo o Brasil. 

Desnecessário dizer que os profissionais desse meio estão sendo obrigados a fazer cada vez mais com orçamentos e recursos cada vez menores. “Empresas em todo o mundo estão de olho em suas equipes de CMOs e marketing para atender às expectativas digital-first dos clientes, e fazer render mais com menos, tudo isso diante das guinadas econômicas”, lembra Sarah Franklin, presidente e CMO da Salesforce. “São novos tempos para os profissionais de marketing, de profunda transformação, que exigem reinventar como nos conectamos com nossos clientes e personalizamos todas as interações.”

Como se não bastassem as metas orçamentárias bem mais desafiadoras, há as leis dinâmicas de privacidade de dados que conduzem a um futuro sem cookies. “Temos notado duas grandes mudanças nas empresas ao redor do mundo que visam corresponder às expectativas digitais dos clientes: fazer mais com menos diante do cenário econômico e aprimorar a gestão de dados em linha com os requerimentos de privacidade”, observa Daniel Hoe, head de marketing para a América Latina da Salesforce.

De maneira global, a maior parte dos orçamentos da área costuma ser drenada pela publicidade, que nunca teve tantas opções para investir. Mas há outros campos que precisam ser cobertos, o que obriga os responsáveis a tirar o máximo proveito dos recursos disponíveis. Quase 27% dos entrevistados do estudo, por sinal, reclamaram de restrições orçamentárias, e 73% disseram que as expectativas dos clientes estão mais altas do que há um ano. Daí a importância, defende a big tech, da aposta em ferramentas e tecnologias que ajudem a aprimorar processos e acabar com a ineficiência. 

De acordo com o relatório da companhia, um dos maiores desafios enfrentados atualmente pelas equipes desse meio envolve o chamado retorno sobre investimento (ROI). Demonstrar a eficiência dos gastos em meio a tantas turbulências, afinal, é uma tarefa cada vez mais crucial. Com as preferências do consumidor em constante transformação, as mudanças nos comportamentos de compra e o aumento das expectativas dos clientes, o único jeito é inovar. 

Não à toa, o estudo concluiu que experimentar novas estratégias de mar­keting virou a segunda maior prioridade para as equipes da área — a primeira é o aprimoramento do uso de ferramentas e tecnologias. O impulso pela inovação, ao que parece, vem de cima. Entre os CMOs ouvidos pela Salesforce, 91% sustentam que precisam continuar inovando — do contrário, correm sérios riscos de se tornarem menos competitivos. Por outro lado, criar e reter a confiança dos clientes continua a ser uma preocupação constante.

Por sorte, nunca os profissionais de marketing dispuseram de tantos dados e ferramentas tecnológicas, além de estratégias reconhecidas para criar relacionamentos duradouros com os clientes. No Brasil, os departamentos da área continuam apostando na combinação de canais e tecnologias. Ferramentas como ligações por voz, TV e mensagens móveis foram as que registraram maior crescimento no último ano. O bom e velho e-mail, no entanto, continua imbatível. Representa mais de 80% dos trilhões de mensagens enviadas por meio do Salesforce Marketing Cloud. Não há tempestade, afinal, que impeça a leitura de um bom e-mail.


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