Revista Exame

Sai uma, senta outra na cadeira de CEO

A troca de uma mulher por outra no comando de grandes empresas no Brasil, como aconteceu na J&J e na General Motors, chama a atenção por ainda ser exceção

Maria Eduarda e Suzan, da J&J: pela primeira vez em 80 anos da subsidiária, uma mulher passa o comando para outra (Germano Lüders/EXAME.com)

Maria Eduarda e Suzan, da J&J: pela primeira vez em 80 anos da subsidiária, uma mulher passa o comando para outra (Germano Lüders/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 25 de maio de 2011 às 06h00.

Quando foi promovida ao cargo de diretora de mar­keting da divisão de consumo da subsidiária brasileira da Johnson&Johnson, em 2003, a baiana Maria Eduarda Kertész teve de se acostumar a ser a exceção.

À frente de marcas como Band-Aid, Sundown e Neutrogena, Duda, como é mais conhecida, assumiu a responsabilidade por uma área vital para uma das maiores empresas de consumo do país e se tornou, aos 29 anos de idade, a mais jovem profissional na história do comitê executivo da J&J. Além da juventude, outro fator destacava Duda de seus colegas de comitê: ela era a única mulher do grupo.

Em abril passado, convidada a assumir a presidência da fabricante de bens de consumo no Brasil, segunda maior operação da empresa americana no mundo, a executiva encontrou uma situação bem diferente.

Não apenas Duda foi a sucessora de outra executiva — a paulistana Suzan Rivetti, que, após três anos no cargo, foi alçada à vice-presidência da J&J para a América Latina — como também encontrou cinco mulheres entre os oito diretores que compõem o atual comitê executivo.

Pela primeira vez em quase 80 anos de história no país, uma mulher sucede outra no comando da Johnson. “Cheguei aqui por uma progressão natural”, diz ela.

A sucessão feminina que aconteceu na presidência da J&J repetiu-se, também em abril, na subsidiária brasileira da General Motors. A montadora escolheu a americana Grace Lieblein para substituir Denise Johnson no comando — a primeira transição do gênero desde que a empresa se estabeleceu por aqui, em 1925.

As duas mudanças são simbólicas do avanço da presença das mulheres no ambiente de negócios do país. Embora ainda sejam minoria, elas avançam com consistência, sobretudo na base. É o que mostra uma pesquisa exclusiva realizada pela consultora Betania Tanure, especializada em comportamento organizacional.

Hoje, 5% dos cargos de presidência de grandes empresas são ocupados por executivas. Uma década atrás, havia apenas uma mulher em 100 presidentes. Nos postos de média gerência, elas já são 41% do total de executivos — ante 22% em 2000. Quando se trata de trainees, homens e mulheres têm participação praticamente igual.


Um levantamento realizado pela consultoria DMRH/Cia de Talentos a pedido de EXAME mostra que as mulheres representaram, no ano passado, 44% dos eleitos para os programas de trainee de 15 grandes companhias brasileiras. (Em empresas como a J&J, elas são maioria e representaram 51% dos 25 integrantes da turma de 2010.)

Flexibilidade

O movimento que agora se vê no Brasil vem acontecendo nos Estados Unidos há mais tempo — também seguindo um ritmo lento como aqui, é verdade. Entre executivos seniores e vice-presidentes, a participação das mulheres é de 26%.

Entre presidentes, o índice cai para 14% — e o primeiro caso de sucessão de uma mulher para outra numa grande corporação americana só ocorreu em 2009, com a indicação de Ursula Burns para a presidência mundial da Xerox, no lugar de Anne Mulcahy. “O que assistimos hoje é resultado de um processo iniciado décadas atrás, quando as mulheres começaram a ter uma carreira”, afirma Betania Tanure.

Algumas mudanças de comportamento no ambiente de trabalho vêm ajudando a ascensão feminina. Em boa parte das empresas já não causa surpresa se um executivo ou uma executiva saem no meio do expediente para comparecer a um compromisso escolar do filho — desde que ele ou ela deem um jeito de bater suas metas no fim do mês, claro.

Aliás, de acordo com uma pesquisa realizada neste ano pela consultoria McKinsey nos Estados Unidos, algumas atitudes de homens e mulheres nesse sentido estão convergindo: 50% de pais com filhos disseram que não aceitariam um novo trabalho que reduzisse o equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho — entre as mulheres, a proporção foi praticamente a mesma, 55%.

Isso permite que profissionais como Andrea Alvares, que, em janeiro deste ano, assumiu a presidência da divisão de bebidas da Pepsico no Brasil, consigam conciliar os papéis de mãe e executiva sem ter de optar por apenas um deles.

Meses após ter assumido sua primeira missão internacional, como líder da área de marketing de bebidas da companhia na Argentina, em 2006, Andrea engravidou de seu terceiro filho. “Sempre quis ter mais de um filho, e minha opção nunca trouxe conflitos no trabalho”, afirma ela.


No entanto, a experiência exigiu malabarismos. Andrea decidiu, por exemplo, participar de algumas decisões da companhia mesmo durante a licença-maternidade. “Depois dos primeiros meses de licença, mesmo em casa, eu já trocava e-mails com pessoas do escritório.”

Mesmo em setores tradicionalmente masculinos, as mulheres começam a ganhar espaço. A paulistana Andrea Bertone, de 49 anos, é um exemplo. Em 2009, após oito anos de carreira na subsidiária brasileira e na matriz da americana Duke Energy, a advogada Andrea recebeu o convite para presidir a divisão internacional do grupo americano.

Com faturamento de 1,2 bilhão de dólares em 2010 — metade desse valor vindo do Brasil —, a área tem apenas duas mulheres na diretoria, de um total de 15 homens. “Ainda sou exceção, mas espero que minha trajetória possa incentivar outras mulheres na empresa”, afirma Andrea.

Estudos mostram que estimular a diversidade — não apenas de gênero — traz efeitos positivos para as empresas. Segundo a McKinsey, as companhias que têm de 19% a 44% de mulheres no conselho têm retorno sobre capital 26% maior do que as que não têm mulher alguma nesse nível.

Porém, os especialistas alertam que estabelecer um regime de cotas, como a França fez no ano passado, é um enorme erro. (O governo francês determinou  que, até 2016, empresas com mais de 500 funcionários ou com receita superior a 50 milhões de euros tenham pelo menos 40% de seu conselho formado por mulheres.)

“Já vi empresas promovendo executivas apenas como trunfo de marketing”, diz Fátima Zorzato, sócia da empresa de headhunting Russell Reynolds. “O resultado é que as executivas incompetentes acabam deixando o cargo.” Nesse tipo de mudança, para o bem e para o mal, não há espaço para atalhos.

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