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Quando o bebê demora a chegar

Proveta, inseminação artificial, hormônios. Alguns executivos fazem de tudo para ter filhos. Nem sempre é fácil

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h29.

Você está num bom momento da vida. Profissionalmente falando, já superou a fase difícil do começo de carreira e tem boas perspectivas de futuro. No lado pessoal, é bem casado, ou casada. Quanto às finanças, não pode reclamar: mora em um apartamento próprio e de bom tamanho, viaja de vez em quando, conseguiu comprar a casa na praia. Em suma, tudo o que planejou até aqui deu razoavelmente certo. Agora só falta o bebê.

Para a maior parte dos casais, o bebê chega como conseqüência natural da vida em comum. Para outros, o que simplesmente deveria acontecer após algumas tentativas se transforma numa dura e dispendiosa batalha contra a dificuldade de ter filhos. Em cada 5 casais no mundo, 1 não consegue engravidar. Adivinhe quem encabeça essa lista? Acertou: os executivos. Segundo estatísticas mundiais, a decisão tardia do casal em assumir uma gravidez é um dos fatores principais da infertilidade. "Há uma forte tendência por parte dos executivos e executivas em postergar ao máximo a chegada dos filhos para investir na carreira e na estabilidade financeira", diz o médico Dirceu Henrique Mendes Pereira, da Profert, clínica de reprodução humana, de São Paulo. "Só que depois a natureza cobra."

A partir dos 35 anos, os óvulos da mulher já não têm a mesma qualidade que tinham aos 25. O resultado é que as possibilidades de engravidar caem para 60%. (E é por volta dessa idade que muitas executivas consideram o momento adequado para começar a ter filhos.) Aos 40 anos, a mulher tem apenas 50% de chance.

A questão é que hoje a mulher leva o trabalho tão a sério quanto o homem. Ela quer fazer carreira, subir aos cargos mais altos. Ter filhos não deixou de fazer parte dos seus planos, mas ficou para mais tarde - bem mais tarde.

Pergunte a um jovem de 20 anos quando pretende ter filhos e ouvirá algo assim: "Primeiro vou estudar, morar fora do país, cursar um mestrado, me estabilizar na carreira e fazer tudo o que quero na vida". Não dá para fazer isso tudo antes dos 33 ou 34 anos. "A disputa cerrada no mercado de trabalho não dá nenhum desconto para a mulher. É muito em função disso que elas estão chegando aqui cada vez mais velhas", diz Nelson Antunes Jr., médico e coordenador clínico da Unidade de Reprodução Humana do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

MEDICINA REPRODUTIVA - Os avanços da medicina em tudo o que se refere à fecundação e gestação podem acabar sendo outro motivador da gravidez tardia. Sabendo que hoje dispõem de todo um arsenal de recursos e procedimentos antes inexistentes, os casais se sentem mais seguros para ter filhos depois dos 30 anos. A fecundação, por exemplo, que há 20 anos não poderia se dar de outra maneira que não a tradicional, vem sendo contornada por uma série de tratamentos da chamada medicina reprodutiva. Exemplos: inseminações artificiais, provetas e injeções intracitoplasmáticas. (Essas injeções colocam os espermatozóides diretamente no óvulo.)

Considere o casal Armando e Flávia. (Seus nomes são fictícios, assim como todos os outros que aparecem nesta reportagem, com exceção do último casal.) Em 1993, eles passaram por uma bateria de exames. Além dos 36 anos de Flávia na época, a produção de espermatozóides de Armando estava abaixo da média. Os 2 se submeteram a vários tratamentos e agora vão para a segunda proveta. "Até hoje escondemos de ambas as famílias", diz Armando. "Prefiro dizer que não quero saber de filhos para evitar a compaixão alheia." Isso já o colocou em algumas complicações no ambiente de trabalho. Por 2 vezes, Armando deixou de comparecer a importantes reuniões na sede da empresa onde trabalha, em Nova York. Motivo: a coleta do sêmen para a fertilização. "Naquela fase, cheguei a fazer várias jornadas de meio período e, mesmo assim, minha concentração era zero", diz Armando.

Esse tipo de casal tem sido a razão da proliferação de clínicas especializadas. No Brasil existem 80 delas, 30 só no Estado de São Paulo. Sidney Glina, chefe da Unidade de Reprodução Humana do Hospital Albert Einstein, recebe uma média de 15 novos casais por mês em seu consultório. Algumas vezes a história se resolve com um bom papo. Glina conta que após uma longa conversa descobriu a causa da "infertilidade" de um casal de executivos. Eles trabalhavam muito durante a semana e reservavam os finais de semana para as relações sexuais. Acontece que a ovulação da mulher não ocorre apenas aos sábados e domingos. A dica de Glina foi manter relações também durante a semana. Após 2 meses, veio a notícia da gravidez.

No Brasil, há a cada ano 3 500 tentativas de conseguir bebês por provetas. (Nos Estados Unidos são 30 000.) Encarar um tratamento desses está longe de ser uma coisa simples. Primeiro porque é indispensável dispor de uma boa reserva financeira. Uma fecundação através de proveta não sai por menos de 6 000 reais. Como as chances de chegar lá são de 1 para 4, os gastos podem ser bem pesados.

Isso sem contar o estresse da incerteza. "A maioria dos meus clientes são casais de executivos acostumados a controlar tudo em suas vidas", diz Pereira. "De repente, eles se vêem diante de algo que não depende só de seus esforços e vontade." A economista Mônica está sentindo isso na pele. "Pela primeira vez na vida, tenho um problema que não posso resolver sozinha", diz ela. Aos 40 anos e ocupando um alto cargo num dos principais bancos de São Paulo, Mônica tenta ter filhos há 2 anos. "Sempre priorizei minha carreira e, quando achei que estava preparada para ser mãe, tinha passado da hora", afirma ela.

Um rápido giro por algumas clínicas de fertilização de São Paulo revela características comuns entre os pacientes. Homens na faixa dos 40 anos, com ternos bem cortados e celular ligado o tempo todo. Mulheres entre 35 e 40 anos, sempre apressadas em ir ou voltar para o escritório.

FRACASSO - Algumas dessas clínicas chegam a mudar os horários de atendimento a fim de se adequar à rotina dos pacientes. A Profert começa a funcionar às 7 horas da manhã. O consultório de Antunes Jr. atende o último paciente às 22 horas. A flexibilidade no horário facilitou a vida da executiva Lidia Siqueira Toscano de Brito, de 40 anos. Gerente de negócios da Caixa Econômica Federal, onde trabalha 10 horas por dia, em média, Lidia madrugou muitas vezes na clínica Profert para cumprir as etapas do tratamento. Valeu a pena. Após anos de tentativas ela e o marido, Agnaldo Toscano de Brito Filho, também executivo, realizaram o desejo de ser pais. Em maio último nasceram os trigêmeos Leonardo, Luiza e Giulia.

"O casal precisa estar emocionalmente preparado para o sucesso e também para o fracasso", diz a psicóloga Marcia Bittar Nehemy, cuja especialidade é acompanhar casais durante os tratamentos. Em 1990, ela passou 1 ano na França trabalhando com a equipe de Renè Frydman, o primeiro médico a fazer proveta ali. "Às vezes o casal não consegue lidar com a frustração e isso acaba desestruturando a carreira e o casamento", diz ela.

O fato é que a medicina reprodutiva continua avançando em busca de novas soluções, uma vez que ninguém mais quer ter filhos aos 20 anos. A última novidade neste campo é tão lógica quanto polêmica. Há cerca de um ano, médicos ingleses e australianos estudam o congelamento de óvulos. A idéia é retirar alguns óvulos da mulher aos 25 anos, deixá-los hibernando enquanto cuida da carreira e recolocá-los quando ela decidir engravidar, aos 35 ou 40 anos.

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