Dirk Schneider, diretor-geral da fabricante de bebidas Leão: corte na diretoria e mais lançamentos no portfólio (Germano Lüders/Exame)
Rodrigo Caetano
Publicado em 12 de setembro de 2019 às 05h38.
Última atualização em 12 de setembro de 2019 às 10h28.
Uma síntese do esforço da Leão, tradicional fabricante de chás e sucos, para resistir à crise está numa espécie de metamorfose de sua diretoria executiva. Desde 2014, na empresa controlada pela americana Coca-Cola, foram eliminadas cinco diretorias. Em abril, uma decisão ainda mais radical mudou de vez a hierarquia da Leão: a extinção do nível de diretor — só sobrou o financeiro. Hoje ele e quatro gerentes executivos respondem diretamente ao presidente, o alemão Dirk Schneider.
É uma reação proporcional ao encolhimento das receitas no período. Desde 2015, o faturamento da companhia caiu 25% (o valor não é divulgado). Naquele mesmo ano, passou a valer uma meta que vem sendo cumprida ano após ano: reduzir 2% dos custos, com medidas como a terceirização da produção. Ao mesmo tempo, a Leão abriu uma nova frente de investimentos.
Desde 2018, colocou no mercado 60 itens, entre novos produtos e versões modificadas dos antigos. O número de lançamentos deste ano já supera em 15% o do ano passado e inclui três novas linhas: na área de chás, aposta na infusão a frio e no chá em cápsulas, que pode ser preparado em máquinas de Nespresso. Na área de sucos, a novidade é o Del Valle concentrado, versão mais econômica de sua linha de néctares, que pode ser preparada na casa do consumidor.
Ao mesmo tempo, a fábrica da companhia em Linhares, no Espírito Santo, vem recebendo atualizações para se tornar mais flexível e abrigar uma linha mais extensa de produtos. A unidade foi construída para produzir em larga escala. “Com as mudanças, buscamos agilidade”, afirma Schneider, diretor-geral da Leão. O tempo de desenvolvimento de produtos, que era de mais de um ano, caiu pela metade. Novos modelos puderam ser testados, como parcerias com pequenas indústrias locais, permitindo levar a produção de certos itens para mais perto do ponto de venda e reduzindo os custos de logística.
Um estudo lançado neste ano pela consultoria Bain & Company, que analisou mais de 1.500 companhias de capital aberto nos Estados Unidos de 2012 a 2017, aponta que as mais eficientes em políticas de redução de despesas são as que não se restringem a ações pontuais, com benefícios de curto prazo, e evitam medidas que interfiram na experiência dos consumidores. Das companhias pesquisadas, no entanto, apenas 5% adotaram essa abordagem conjunta nos últimos anos. As que seguiram esse caminho, porém, obtiveram ganhos de desempenho em todo o período analisado e retorno ao acionista seis vezes maior do que as demais.
Assim como no caso da Leão, a siderúrgica anglo-indiana ArcelorMittal buscou uma saída sustentável para o dilema ao investir em linhas de produtos mais rentáveis. A siderúrgica não passou incólume pela crise profunda no mercado de aço — neste ano, o consumo deve retornar ao patamar de 2014. Para reagir, tem investido no desenvolvimento de aços mais resistentes, que permitem mais retorno, apesar de exigir um esforço financeiro de pesquisa e desenvolvimento. Ao todo, a ArcelorMittal dedicou mais de 1 bilhão de reais à renovação de sua estrutura nos últimos dois anos. Ao mesmo tempo, houve um aumento de produtividade por meio da adoção de tecnologias da indústria 4.0.
Sensores instalados nas máquinas coletam informações em tempo real que são analisadas por sistemas de big data. Isso permite, por exemplo, antecipar a troca de peças antes de causarem paradas não programadas. Na usina de Tubarão, no Espírito Santo, a capacidade mais que dobrou e ultrapassou 7 milhões de toneladas por ano. “Trabalhamos com uma commodity, portanto, só podemos controlar parte dos custos”, diz Paulo Wanick, diretor financeiro da divisão de aços planos da ArcelorMittal. Outra medida importante de corte de despesas foi a adoção de impressoras 3D para produzir peças sobressalentes nas unidades de produção. Além de reduzir o tempo necessário para reparos de máquinas, a empresa eliminou o estoque de peças de reposição. O uso de drones para monitoramento diminuiu o número de acidentes, tradicionalmente elevado no setor, também resultando em custos menores.
Por vezes, a constatação de que o investimento em tecnologia também reduz custos resolve a equação, embora seja preciso ter fôlego para colher os frutos só depois de desembolsar o dinheiro. Foi o que aconteceu com a agência de viagens CVC, que vem sofrendo pressão com o surgimento de novos modelos de negócios digitais no setor. Para a CVC, a automação do atendimento, com a adoção de tecnologias como chatbots e inteligência artificial, garantiu uma diminuição de cerca de 20% nos custos de atendimento nos últimos três anos. Adicionalmente, foram feitas revisões de processos para que se adequassem melhor ao ambiente digital, propiciando cortes de até 15%.
Um exemplo foi o desenvolvimento da nova plataforma de vendas da Rexturadvance, consolidadora de bilhetes aéreos que pertence ao grupo, lançada em 2018. A empresa atende outras agências de viagem, com serviços de reserva e emissão de passagens. O novo sistema automatizou as transações, antes intermediadas por atendentes. Desde o ano passado, elas passaram a ser feitas diretamente pelos clientes. “É um segmento com margens baixas”, afirma Luiz Fernando Fogaça, presidente da CVC. Com a economia, a empresa pôde abrir mais de 140 lojas no ano passado. Outra centena de pontos deverá ampliar a rede neste ano. As vendas chegaram a 1,5 bilhão de reais em 2018 — 32% acima do registrado no ano anterior. Eis uma mostra de que, embora difícil, o equilíbrio é possível.