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Sem salto e sem crise

Katia Simões  Forro e solado de couro, bordados personalizados, uma fita de gorgorão para arrematar – e nada de salto. Foi com esta receita que as empresárias Michelle Lima e Paula Proushan abriram, em 2013, a Blue Bird Shoes, especializada em calçados artesanais. A ideia era deitar por terra a máxima de que para ser […]

MICHELLE E PAULA, DA BLUE BIRD: rompendo com a ditadura do salto entre as marcas de luxo / Divulgação
DR

Da Redação

Publicado em 1 de setembro de 2016 às 18h20.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h59.

Katia Simões

Forro e solado de couro, bordados personalizados, uma fita de gorgorão para arrematar – e nada de salto. Foi com esta receita que as empresárias Michelle Lima e Paula Proushan abriram, em 2013, a Blue Bird Shoes, especializada em calçados artesanais. A ideia era deitar por terra a máxima de que para ser elegante a mulher, necessariamente, deveria se equilibrar sobre saltos. Para provar a tese, apostaram em um único modelo de sapato – o loafer, um dos mais antigos do mundo e o preferido do vaidoso rei francês Luís XV.

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Para garantir uma produção artesanal de qualidade, elas visitaram dezenas de fábricas no sul do país até chegar a um parceiro que topasse a empreitada. Para fabricar cada sapato são necessários 108 processos, todos feitos à mão. Paralelamente, elas importaram da Itália uma máquina para produzir o cabedal (a parte de cima do calçado) e foram atrás de mão de obra especializada em sapatos masculinos a fim de garantir o conforto.

Há quatro anos, quando as sócias decidiram empreender, os saltos altos imperavam nas vitrines. O designer francês Christian Louboutin, conhecido por seus sapados com solado vermelho e saltos de 16 cm, havia aberto sua primeira loja no Brasil em 2009. “Havia um vácuo a ser preenchido no mercado”, lembra Paula. “Ninguém oferecia na época um sapato confortável e elegante, capaz de dividir espaço com a ditadura dos saltos altos”.

Além do design, a ideia era criar uma marca de luxo acessível (os sapatos custam em torno de 400 reais), com bastante influência brasileira nas estampas de cada coleção, como a tradução do jogo do bicho pelo olhar de Lina Bo Bardi ou uma viagem pelas placas de caminhões. O plano era ganhar terreno não só por aqui, mas vender a imagem do Brasil mundo afora.

Michelle passou pela Fórum, pelo grupo Arezzo e foi responsável pela expansão da marca Alexandre Birman, do criador da Arezzo, em Nova York. Paula, por sua vez, estudou na Parsons School of Design, de Nova York, onde trabalhou na Vogue e na Vera Wang. As duas se conheceram no ambiente profissional, viraram grandes amigas e, em 2012, decidiram colocar em prática uma proposta antiga, a de abrir o próprio negócio.

A opção pelo mercado calçadista foi natural pela experiência acumulada, assim como o universo do luxo, que a dupla conhece bem. A única discussão ficou por conta da escolha do nome da marca. A primeira ideia é que se chamasse Arara. Mas, esbarrava no sotaque de Paula. Embora brasileira, ela morou desde os seis anos de idade nos Estados Unidos e, ainda hoje, tem dificuldade em pronunciar o “R” como uma típica paulistana. A saída foi apostar no Blue Bird, em homenagem a ararinha azul.

O caminho escolhido para distribuição da primeira coleção com 12 variações de um único modelo foram as lojas multimarcas online. Em 20 dias venderam toda a produção, 200 pares, a 398 reais cada um. “As mulheres queriam descer do salto e encontraram uma opção”, diz Michelle. “A concorrência não acreditou que uma marca jovem, de produto único, pudesse vingar”.

O peso da crise

Uma desconfiança com fundo de verdade, na visão de Silvio Passarelli, diretor do Programa de Gestão do Luxo da Faap. “No segmento de luxo, o produto único tem de ser encarado como um estágio, como um ponto de partida para testar a marca”, afirma. “Em um determinado momento ele precisa fazer parte de uma família de produtos, para que a empresa prospere e tenha longevidade”. Caso contrário, correm o risco de gerar um ciclo de vida curto para o negócio.

Expandir a família de produtos estava nos projetos da marca, mas só para o futuro, que acabou antecipado pela crise econômica do país. A Blue Bird no início focou no atacado e chegou a somar 50 clientes. Em 2014, em razão da participação em uma feira internacional, a marca abriu as portas do mercado internacional, com exportações para Estados Unidos, Japão, Itália, Bélgica, Inglaterra e Peru. A trajetória superava as expectativas até 2015, quando as sócias enxergaram o fim do sonho muito de perto. “O consumo retraiu e as multimarcas deixaram de comprar”, lembra Michelle. “Nós ficamos sem dinheiro para cobrir os custos fixos.” A saída encontrada pelas sócias foi abrir uma loja própria.

O ponto escolhido ficava na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, conhecida como a rua da decoração e do design em São Paulo. Seis meses depois, dois novos pontos foram abertos, nos Shoppings Higienópolis e Cidade Jardim, ambos em São Paulo, e no início de agosto, a primeira unidade no Rio de Janeiro.

A abertura das lojas próprias exigiu a ampliação da variedade de produtos. Para o verão de 2017 serão 30 modelos entre rasteiras, espadrilles, mules, slip-ons, plataformas e flat forms, com preços que variam de 249 a 898 reais. A empresa ainda lançou sua loja online. Com isso, as vendas crescerem 300% em relação ao início de 2015. A meta é faturar 16 milhões de reais em 2017. Se na crise as coisas deram certo, o fim da crise só deve ajudar.

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