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Jornada pelo mundo real

Em Roadside MBA, um trio de professores americanos percorre os Estados Unidos para contar as histórias de empreendedores que souberam adaptar conceitos de administração à sua realidade

Copos do Starbucks em uma loja da rede na Coreia do Sul (SeongJoon Cho/Bloomberg)

Copos do Starbucks em uma loja da rede na Coreia do Sul (SeongJoon Cho/Bloomberg)

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Da Redação

Publicado em 16 de outubro de 2014 às 12h21.

São Paulo - Numa passagem pela seção de negócios de qualquer livraria de bairro, é possível encontrar inúmeros títulos que tentam esmiuçar as estratégias que fizeram grandes empresas, como Apple, Google e Toyota, tornar-se o que são hoje. Menos comuns são os autores que lançam um olhar à realidade dos pequenos e médios negócios.

Quando muito, os especialistas tentam catequisar donos de empresas emergentes para copiar certos aspectos do modelo de expansão de grandes companhias — o que frequentemente soa mais forçado do que didático.

Relatar histórias inspiradoras de pequenos empreendedores pouco conhecidos é o maior trunfo de Roadside MBA: Back Road Lessons for Entrepreneurs, Executives and Small Business Owners (“MBA de beira de estrada — lições de estradas secundárias para empreendedores, executivos e donos de pequenos negócios”, numa tradução livre), lançado recentemente pelos autores Michael Mazzeo, Paul Oyer e Scott Schaefer.

O ponto de partida do livro é uma viagem feita por Mazzeo, Oyer e Schaefer — três professores de prestigiados cursos de MBA dos Estados Unidos — por 30 cidades de 27 estados americanos. Da jornada por mais de 8 000 quilômetros surgiram exemplos de pequenas empresas com estratégias simples mas efetivas.

São histórias como a de Robin Crawfors, fundadora da Dogma Dog Care, hotelzinho para bichos de estimação da cidade de Smyrna, na Geórgia. Cansada de ouvir clientes pedindo descontos, Robin resolveu estudar o perfil dos que pechinchavam mais. Sua conclusão foi que, em geral, eram habitantes de bairros distantes que buscavam alguma vantagem que justificasse percorrer a cidade para deixar seus bichinhos aos cuidados da Dogma Dog Care.

Ela passou, então, a publicar anúncios com cupons de desconto em jornais que circulavam apenas nos bairros afastados — um jeito de agradar aos que moram longe sem perder receita com quem está disposto a pagar o preço cheio.

Pode parecer óbvio, mas, na visão dos autores, a parte mais inspiradora da história não é sua solução — e sim o caminho percorrido até encontrá-la. “Não basta saber que determinada estratégia funcionou. É preciso entender por que ela funcionou”, dizem.

No livro também há casos de empresas emergentes que adaptam premissas clássicas da administração à sua realidade. Uma delas é a cafeteria Silk Espresso, de Gresham, no Oregon. A empreendedora Leah McMahon, que ganhou diversos prêmios regionais pela qualidade de suas bebidas, chegou a abrir quatro unidades da Silk Espresso nos arredores de Gresham.

Mas ela logo percebeu que seria difícil obter a mesma qualidade em mais de uma unidade sem contratar profissionais bem formados e investir pesadamente em treinamento. É que manter o padrão de seus cafés exige uma atenção redobrada na armazenagem e na moagem dos grãos, além de um cuidado extremo com condições como a temperatura da água.

Por isso, Leah decidiu dar um passo atrás e ficar com apenas uma unidade. Alguém pode dizer que ela contrariou a regra segundo a qual é preciso sempre perseguir ganhos de escala para diluir custos e aumentar a rentabilidade. E quem disse que a estratégia da Silk Espresso era se tornar uma grande marca de café com milhares de lojas? “Optei por um negócio menor para ter total controle sobre meu produto”, diz Leah.

A história da Silk Espresso ilustra bem um ponto de vista defendido pelos autores de Roadside MBA. Segundo eles, é pouco provável que a mesma estratégia de gestão dê certo em empresas diferentes e em momentos distintos. “Não existe resposta definitiva para determinar o melhor caminho para os negócios”, afirmam.

Para ficar num exemplo do mesmo mercado da Silk Espresso, Mazzeo, Oyer e Schaefer relembram um pouco da trajetória da Starbucks. Sob a liderança do empreendedor Howard Schultz — que comprou a empresa no fim dos anos 80 —, a Starbucks espalhou pelo mundo seu conceito de ponto de encontro descontraído onde os clientes podem tomar um café com os amigos ou apenas comprar uma bebida para viagem.

A arrancada se deu nos anos 90, e hoje a Starbucks tem mais de 20 000 lojas em 64 países. A enorme diferença entre a Silk Espresso e a Starbucks é uma demonstração de que por trás de empresas que disputam o mesmo mercado pode haver empreendedores satisfeitos ao seguir estratégias opostas.

O fato de três acadêmicos terem caído na estrada em busca de novos exemplos de boa gestão para contá-los a seus alunos é um sintoma de uma discussão sobre a efetividade dos programas de MBA que ganhou força nos Estados Unidos. Alguns críticos apontam que não há formação que resista aos efeitos nefastos de uma crise como a que varreu a economia americana a partir de 2008.

Em The MBA Bubble (“A bolha do MBA”, numa tradução livre), a autora Mariana Zanetti usa o exemplo de líderes que nunca pisaram em uma escola de negócios — como Mark Zuckerberg, do Facebook, e Amancio Ortega, da Zara — para questionar a real necessidade de ter um título no currículo.

Outro livro que reforça esse debate é MBA? Não, Obrigado, de Henry Mintzberg, que analisa o que há de errado com os cursos de negócios e por que muitas vezes as lições não resultam em benefícios práticos para as empresas.

Mais do que uma crítica aos programas de pós-graduação, Roadside MBA é uma ode à agilidade das pequenas e médias empresas. Mazzeo, Oyer e Schaefer não chegam a descrever se os negócios que visitaram são lucrativos nem sequer se estão crescendo. (As finanças das empresas não entraram na conversa, para evitar que os empreendedores se intimidassem ao falar de suas estratégias.)

As principais lições que seus personagens deixam é que os que conseguem decifrar os desafios de seus mercados de atuação são os mais capazes de alcançar resultados extraordinários.

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