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Em busca do melhor preço

Para aumentar a rentabilidade e evitar erros comuns ao definir quanto cobrar pelos produtos e serviços de sua empresa

Fabiana Decnop e Paula Novaes, donas da confecção Mundo de Oz.  (Marcelo Correa)

Fabiana Decnop e Paula Novaes, donas da confecção Mundo de Oz. (Marcelo Correa)

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Da Redação

Publicado em 14 de abril de 2011 às 10h12.

Encontrar o preço cer­to para os produtos e serviços é um delicado exercício de equilíbrio. Não se pode cobrar caro demais a ponto de espantar a clientela. Nem tão barato a ponto de corroer as margens de lucro. É preciso que as vendas rendam o bastante para cobrir os custos. Mas, ao mesmo tempo, os ganhos não podem significar a perda de competitividade diante da concorrência. Não é de estranhar que a maioria dos empreendedores tenha dificuldade em descobrir qual é, afinal, o melhor preço a cobrar por aquilo que fazem. Precificar é quase uma ciência, algo que vai muito além da mera intuição empresarial. Segundo a consultoria internacional McKinsey, de todas as variáveis ao alcance do empreendedor, o preço é aquela em que uma pequena variação pode trazer os melhores resultados. Um estudo realizado com 1 000 grandes empresas americanas mostra que um aumento de 1% nos preços leva a lucros operacionais 8% maiores. “Para encontrar e cobrar o preço ideal, é preciso conhecer os custos do negócio em detalhes, saber quanto o cliente está disposto a pagar e acompanhar os passos dos competidores”, diz o consultor de finanças Márcio Iavelberg. Nas próximas páginas, oito empreendedores contam como cometeram enganos comuns ao definir seus preços e de que forma conseguiram reagir para recuperar a rentabilidade de seus negócios. 

Sem medo de cobrar mais caro

Muitos empreendedores gostam de dizer aos clientes que seus preços estão entre os mais competitivos do mercado. Mais raros são os que sustentam com orgulho a fama de cobrar mais caro, como é o caso de Otto Nogueira Jr., de 57 anos. Nogueira é dono da Vogler, distribuidora paulista que faturou 70 milhões de reais no ano passado vendendo ingredientes que grandes empresas, como Nestlé, Unilever e Ambev, usam para colorir doces, deixar a massa de pães e bolos fofinha e a espuma da cerveja mais cremosa. “Temos preços mais altos do que a média”, afirma Nogueira. Estima-se que alguns produtos da Vogler custem até 10% mais que os da concorrência.

Para conseguir cobrar mais, Nogueira transformou sua empresa numa espécie de laboratório de testes. Com frequência, funcionários da Vogler passam dias nos laboratórios da empresa pesquisando receitas de alimentos que levam na composição algum ingrediente novo para apresentá-los aos concorrentes. Nogueira também faz com que sua equipe — formada por engenheiros, químicos e nutricionistas — ajude a clientela nos processos de registro de novas receitas em órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. “São serviços que não aumentam muito meus custos, mas que servem de argumento na hora da negociação”, afirma.

Graças aos serviços que presta aos clientes, a Vogler vem conseguindo manter preços mais altos em setores como o de alimentos e bebidas, nos quais a competição entre os fabricantes gera uma pressão imensa para a redução de custos. “Muitas pequenas e médias empresas abrem mão da rentabilidade por acreditar que cobrar mais é uma espécie de heresia”, diz Roberto Nascimento, professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing, de São Paulo. “Mas muitos clientes concordariam em contratar fornecedores mais caros desde que os custos maiores trouxessem algum retorno para seus negócios.”


Uma trégua na guerra de preços

Durante mais de 40 anos, a indústria de alimentos Stival, de Campo Largo, no Paraná, tratou suas margens de lucro sem piedade. “Eu queria ter os preços mais baixos do mercado para vender em grandes volumes”, diz Alexandre Stival, de 47 anos, filho do fundador da empresa. Para piorar a situação, a Stival não era a única empresa em seu setor que mantinha o comportamento camicase. “Vivíamos em guerra com os concorrentes”, afirma Stival. Há pouco mais de um ano e meio, ele percebeu as cicatrizes que as batalhas pelo menor preço haviam causado ao negócio da família. A rentabilidade despencara e a empresa enfrentava dificuldades. “Raramente sobrava dinheiro para investir em novos produtos ou comprar máquinas novas”, diz ele. Foi quando Stival decidiu que a queda de braço com os concorrentes havia chegado ao limite. Sua decisão foi abandonar a estratégia do menor preço e passar a competir com os produtos mais caros do mercado. Para isso, por exemplo, mudou as embalagens e ampliou a linha de arroz, lançando alimentos mais caros, como arroz-cateto — uma variedade integral rica em fibras — e arroz arbóreo, usado em receitas de risoto. Após a mudança, a empresa viu as vendas de arroz cair 25%, mas quatro meses depois o faturamento retornou ao patamar anterior, com margens de lucro 50% maiores. “Há situações em que é aceitável baixar os preços durante certo tempo para ganhar mercado”, diz Sérgio Simonetti, da Anima Consultoria, contratada pela Stival para reposicionar suas marcas. “Mas a empresa não pode se tornar refém disso.”

Sem tempo a perder para melhorar os resultados

No início de 2008, o médico Rogério Ramirez, de 42 anos, deparou com um problema. Sócio do Femme, laboratório paulista especializado em saúde feminina, ele fizera um diagnóstico das finanças. A empresa havia crescido 90% no ano anterior — e, se houvesse qualquer descuido, os custos poderiam disparar. Aumentar os preços — a primeira tentação que surge diante de um empreendedor numa situação dessa — poderia ter efeitos colaterais desastrosos. Boa parte das pacientes do Femme tem convênio com planos de saúde, que, em 2010, responderam por 80% dos 14 milhões de reais em receitas da empresa. “No nosso negócio, as operadoras dizem quanto estão dispostas a pagar pelos exames”, diz Ramirez. “Elas poderiam me descredenciar se eu aumentasse os preços.”


Casos como o do Femme são comuns entre pequenas e médias empresas, que muitas vezes se encontram na posição desconfortável de quem sofre a pressão dos fornecedores por reajustes, enquanto os clientes não se mostram dispostos a pagar mais caro. “Num mercado competitivo, é muito difícil que o empreendedor transfira para o cliente todos os aumentos nos custos”, diz Márcio Iavelberg, da Blue Numbers, consultoria especializada em finanças para pequenas e médias empresas. “Nesses casos, é preciso descobrir como se tornar mais eficiente para manter as margens.”

Ramirez não queria cortar pessoal nem prestar menos serviços, duas medidas que poderiam proporcionar um vultoso corte de custos, mas que prejudicariam o atendimento. “Nossas clientes não aceitariam esse tipo de economia”, diz. Como, então, fazer com que receitas e despesas fechassem novamente? Ramirez percebeu que, para manter seus preços sem perder dinheiro, era preciso ser mais ágil. “Vi que muitos dos exames que fazíamos tomavam mais tempo de nossa estrutura do que o necessário. Essa era a nossa principal fonte de ineficiência.”

Cada vez que os funcionários do laboratório demoravam mais do que deviam para fazer um exame, perdiam o tempo em que poderiam atender outro paciente. Perdiam, assim, a chance de contribuir com mais receitas e de diluir os custos. Trata-se de uma lógica parecida com a das companhias aéreas, que deixam de ganhar dinheiro cada vez que um avião decola com assentos vazios — no caso do Femme, era como se cada cliente ocupasse o lugar de mais alguém, diminuindo a capacidade da empresa de gerar novas receitas. 

Em busca de uma solução, Ramirez passou a registrar cada passo de seus funcionários no laboratório para descobrir onde os atrasos aconteciam. Ele descobriu, por exemplo, que poderia acelerar o atendimento substituindo equipamentos que demoravam demais para concluir um diagnóstico. Ocorriam também problemas no agendamento dos pacientes — num mesmo momento, poderia haver uma fila de clientes esperando para fazer um exame com um especialista enquanto em outro ponto do laboratório havia capacidade ociosa e funcionários de braços cruzados. 

Ao corrigir essas distorções, Ramirez conseguiu elevar a rentabilidade em quase 18%, o que permitiu manter as finanças da empresa saudáveis sem precisar aumentar o preço dos exames. “Hoje conseguimos atender mais pacientes sem que os custos tenham crescido na mesma proporção”, diz ele. 


O exterminador de custos invisíveis

Há pouco mais de três anos, o engenheiro agrônomo Carlos Watanabe passou a temer pelo futuro de sua empresa, a exterminadora de cupins Termitek, de São Paulo. “Estávamos trabalhando com prejuízo e precisando de empréstimos bancários para pagar as contas”, diz ele. Watanabe passou a investigar as causas do mau desempenho. Mas, por mais que tentasse, não conseguia descobrir onde estava o ralo por onde escoava sua rentabilidade. 

Como muitos empreendedores, ele sofria de uma espécie de miopia em relação aos próprios custos. Ao calcular as margens para formar o preço de seus serviços, Watanabe ignorava itens que chegavam a representar 10% dos gastos. Um dos custos escondidos estava relacionado às despesas para substituir, de tempos em tempos, os equipamentos que seus funcionários usavam. Ao calcular quanto devia cobrar pelos serviços, Watanabe também não levava em conta o tempo que seu pessoal ficava parado no trânsito a caminho da casa ou do escritório do cliente. “Os congestionamentos paulistanos eram o que mais encarecia nosso atendimento sem que eu percebesse”, diz. Refeitas as contas, os preços da Termitek precisaram ser reajustados em até 15%. “Perdi alguns clientes, mas os contratos que ficaram hoje são rentáveis”, diz Watanabe. Antes da mudança, a Termitek chegou a pagar 60 000 reais em juros por ano para cobrir empréstimos tomados para recompor o caixa. Depois de dois anos com prejuízos, em 2010 o lucro líquido da empresa foi de 20% sobre as receitas de 1,5 milhão de reais.

O mesmo preço em diferentes canais

Saber se uma loja online deve cobrar menos que o varejo tradicional é uma dúvida recorrente entre os donos de pequenos e médios negócios que vendem das duas formas. Para o contador Gilberto Leandro, de 49 anos, a resposta é não. Ele é dono da Banca de Camisetas, empresa que vende camisetas e acessórios por meio de uma rede de dez lojas próprias e franqueadas e também por site na internet. Sua decisão foi cobrar o mesmo preço, ainda que os custos no comércio eletrônico sejam menores. “Eu não queria que o site se tornasse um concorrente de meus franqueados”, afirma Leandro. 

É possível que, numa situação semelhante, outros empreendedores concluam ser vantajoso ter preços diferentes nas lojas tradicionais e no varejo virtual. Mas o caso da Banca de Camisetas é um bom exemplo do tipo de risco a evitar quando se atua em diferentes canais de venda. O principal temor de Leandro é que, cobrando menos no site, sua empresa tenha pouco a ganhar — os mesmos clientes deixariam de comprar nas lojas físicas para fazer pedidos pela web, sem que necessariamente o negócio ampliasse seu mercado.

Leandro decidiu fazer da loja virtual uma ferramenta para ajudar na expansão das franquias. O site permite à Banca de Camisetas chegar a consumidores em cidades onde a marca ainda não tem pontos de venda. Leandro tem utilizado dados obtidos com a loja virtual, como número de acessos e de pedidos, para apontar aos candidatos a franqueados quais regiões parecem mais promissoras para abrir uma unidade.


Quando o preço complica

Até três anos atrás, o analista de sistemas Marcelo Barcelos, de 47 anos, dava uma canseira em quem queria contratar os serviços de sua empresa, a Arcon, que faturou 29,2 milhões de reais em 2010 ao gerenciar sistemas corporativos de segurança da informação. Antes de fechar negócio, Barcelos submetia seus potenciais clientes a uma extensa sabatina. “Eu perguntava tudo”, diz ele. Os candidatos a cliente dos serviços da Arcon respondiam a um questionário com mais de 30 itens, que incluíam perguntas como quantas horas os computadores ficavam ligados por dia, quantos funcionários usavam a mesma máquina e quantos teriam contato com a central de operação da Arcon. Era um processo demorado, que emperrava as negociações. “Alguns clientes até se intimidavam com o tamanho do questionário”, diz Barcelos. “Vários desistiram da compra antes de responder.”

Para deixar de espantar os clientes sem perder o sono pensando se havia cobrado o preço certo, Barcelos decidiu investigar se era mesmo preciso analisar tantas variáveis. Após quase um ano de estudo, concluiu que havia apenas três custos que mudavam de um contrato para outro — a quantidade de computadores do cliente, a localização dos equipamentos (no caso de a empresa ter mais de uma unidade em cidades diferentes) e os serviços que eram contratados, como antivírus e monitoramento contra hackers. O novo cálculo entrou em vigor em 2008. Com a forma mais simples de calcular o preço, as negociações com os clientes, que antes chegavam a demorar até nove meses, caíram para seis meses, em média. “Passamos a fechar mais contratos depois da mudança”, diz Barcelos. “Desde então, as receitas têm crescido, em média, 70% ao ano.”

Barcelos passou um ano observando com lupa as operações em cada cliente. O mesmo procedimento pode ser útil para muitas pequenas e médias empresas que prestam serviços em diferentes setores. “Na área de prestação de serviços, é recomendável que o empreendedor faça uma avaliação a cada três meses para saber se os contratos continuam rentáveis”, diz o consultor Iavelberg. 

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