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Como lidar com o uso de gadgets pessoais no seu negócio

Como estabelecer regras para os funcionários que usam tablets e smartphones pessoais para acessar dados da empresa

Diego Ramos, da Teltec: A empresa fez um acordo com os funcionários para monitorar os gadgets particulares (Michel Teo Sin / EXAME PME)

Diego Ramos, da Teltec: A empresa fez um acordo com os funcionários para monitorar os gadgets particulares (Michel Teo Sin / EXAME PME)

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Da Redação

Publicado em 28 de março de 2013 às 12h13.

São Paulo - É  bem provável que você, empreendedor,  depare com maior frequência com a sigla BYOD, que resume a frase em inglês "Bring your own device" ("Traga seus próprios aparelhos"). A sigla vem sendo usada em todo o mundo nos últimos dois anos para definir uma nova tendência — um número cada vez maior de empresas está permitindo que os funcionários tragam seus smartphones, tablets, ultrabooks e laptops para o escritório e os usem para atividades do trabalho.

"Hoje, os aparelhos estão mais sofisticados e fáceis de usar", afirma Roberto Dariva, diretor da Navita, empresa que gerencia custos de telefonia móvel para outras empresas. "A variedade de aplicativos móveis e serviços da nuvem é grande. Quem tem acesso a essas tecnologias em casa não se contenta mais em trabalhar com ferramentas menos potentes."

O engenheiro Diego Ramos, de 36 anos, sócio da catarinense Teltec, percebeu a proliferação de smartphones e tablets em sua empresa há dois anos. "No início, os funcionários que compraram iPhone e iPad acessavam a nossa rede sem fio escondidos, apenas para ler e-mails ou entrar nas redes sociais", diz Ramos. "Passado um tempo, todo mundo já estava usando seus aparelhos em reu­niões e em visitas para prospecção de clientes".

No ano passado, Ramos percebeu que tinha de tomar alguma providência. "Os funcionários estavam circulando para cima e para baixo com aparelhos que continham documentos da empresa sem que tivés­semos nenhum controle", afirma Ramos. Em conversas com os outros sócios, ele decidiu então liberar o uso de gadgets pessoais no expediente. Em troca, os funcionários tiveram de assinar um termo de responsabilidade e passaram a seguir alguns procedimentos de segurança. 

Ficou acertado, por exemplo, que os equipamentos podem ser monitorados e inspecionados pela empresa. "Instalamos um dispositivo que permite apagar remotamente os dados de aparelhos perdidos ou roubados", diz Ramos. "O funcionário pode optar por apagar suas informações particulares também."


Mais recentemente, a Teltec adotou a política de arquivar todos os documentos importantes nos servidores centrais da empresa. Os funcionários podem consultar o material em tempo real de seus tablets e smartphones, mas não podem baixá-lo. Desse modo, só permanecem gravados fisicamente nos aparelhos os arquivos estritamente necessários ou pessoais.

"Notamos um aumento na satisfação e na produtividade dos funcionários, que ganharam a capacidade de alternar entre tarefas pessoais e do trabalho ao longo do dia, seja lá onde estiverem", diz Ramos.

Quando as novas tecnologias levam funcionários e empresas para aquela zona cinzenta em que não se sabe bem onde o domínio de um começa e onde o do outro termina, as empresas passam um tempo sem saber como lidar com a novidade e ficam sem reação. Com o tempo, cada empresa tende a encontrar um ponto de equilíbrio.

"Até dois anos atrás, a maioria das empresas não permitia que seus funcio­nários entrassem nas redes sociais no local de trabalho", afirma Fábio Gaia, presidente da distribuidora de equipamentos de telecom Officer. Atualmente, as próprias empresas mantêm páginas no Facebook para divulgar suas marcas. "Não será diferente com o BYOD", diz Gaia. 

No caso do BYOD, o dilema é controle versus liberdade. Por um lado, para uma empresa é difícil — senão impossível — ter o controle total do que está sendo acessado. Quem pode acessar o quê? Com qual aparelho? O que os técnicos devem fazer  diante da diversidade de sistemas que operam no smartphone de cada um? Por outro, o que o BYOD tem de mau? Por que não deixar que os funcionários usem o mesmo tablet com que leem notícias  no trabalho? 

Na Teltec, Ramos encarou o dilema como uma oportunidade para modernizar a empresa sem muito custo. "Nunca teríamos condições de bancar tantos aparelhos top de linha, como iPhones e iPads que os funcionários trazem para o escritório", diz Ramos. "Além disso, se eu não desse o meu aval, eles arranjariam um jeito de continuar usando seus aparelhos sem autorização."

Uma pesquisa recente, feita pelo instituto americano Forrester com 10.000 trabalhadores, apurou que 43% deles têm usado seus aparelhos pessoais, como smartphones, tablets e minilaptops, para atividades profissionais — mesmo sem nenhuma ajuda de custo e suporte técnico da empresa.


Eles também usam ferramentas da nuvem, como o Gmail e o Dropbox, para armazenar documentos de trabalho sem consultar o chefe. Num outro estudo, da empresa americana Cisco, mais da metade dos 1.400 universitários de 18 a 23 anos entrevistados respondeu que trocaria de emprego se recebesse propostas de empregadores que liberam o uso de aparelhos pessoais em suas redes wi-fi e, ao mesmo tempo, dão flexibilidade para tocar projetos a distância.

"Os tablets e os smartphones são um elo de ligação do profissional com o trabalho, com a família e com os amigos", diz Gaia, da Officer. "Portanto, não é uma questão de decidir se uma empresa deve apoiar o movimento BYOD, mas quando e como." Estimativas do instituto ABI Research mostram que o volume de tráfego de dados móveis, gerados principalmente de tablets e smart­phones, deve aumentar 18 vezes até 2016 no mundo, superando o volume de dados que circulam nas redes fixas,

De acordo com os especialistas, o primeiro passo é criar uma política com regras claras para o acesso móvel (veja quadro na página seguinte). A empresa precisa esclarecer, por exemplo, quais requisitos de segurança devem ser cumpridos, bem como  as obrigações e os limites por parte da empresa e do funcionário. 

Há questões de ordem prática. “A rede da empresa deve estar preparada para fazer uma varredura instantânea nas configurações dos aparelhos a cada tentativa de conexão”, diz Camillo Di Jorge, diretor da empresa de segurança Eset. “Isso ajuda a bloquear vírus e outros arquivos contaminados que os funcionários possam trazer da rua para dentro da empresa”, diz ele.

Outra recomendação é ter regras de como armazenar documentos em serviços de terceiros na internet. “As pessoas estão acostumadas a usar nuvens, como iCloud e Evernote, para armazenar informações pessoais, mas precisam tomar cuidado para não transferir, até sem querer, dados confidenciais, como fotos de produtos em testes ou conteúdo de apresentações internas”, diz Di Jorge.


Para evitar esse tipo de problema, é possível colocar um atalho no celular  que centralize o login a todos os serviços da nuvem autorizados para uso no trabalho. "É preciso evitar a formação de ilhas, em que cada funcionário escolhe um serviço diferente e elimina a possibilidade de compartilhar o conteúdo com os colegas", diz Di Jorge.

Um cuidado especial é transformar todas as regras em cláusulas de contrato e pedir aos funcionários que assinem os novos termos. "É importante ressaltar no contrato que a responsabilidade pelos dados armazenados é do dono do aparelho e que o acesso aos aplicativos não necessariamente significa sobreaviso ou hora extra de trabalho", diz Patrícia Peck, advogada especializada em direito digital.

O objetivo é se precaver contra processos trabalhistas. Outra questão é evitar que a empresa seja corresponsável por eventual uso indevido de soft­wares piratas. "Para evitar riscos legais, muitas empresas tratam o assunto de forma híbrida: o equipamento é do usuário, mas todos os softwares de trabalho são fornecidos por elas", diz Patrícia.

Já há no mercado softwares de gerenciamento de aparelhos móveis acessíveis a pequenas e médias empresas. Os fornecedores costumam cobrar de 5 a 10 reis por mês para cada equipamento monitorado. Batizados de MDM (sigla em inglês para mobile device management, ou "gerenciamento de aparelhos móveis"), esses sistemas permitem determinar níveis de acesso remoto de acordo com a posição ocupada pelo funcionário na empresa.

"O administrador da rede pode liberar ou não o acesso a determinados arquivos, dividindo as autorizações por grupos de profissionais e tipos de aparelho", diz Daniel Pereira, da GVP,  especializada em gerenciamento de mobilidade.

Um estudo do instituto Gartner indica que até 2017 cerca de 65% das empresas vão adotar tecnologias de MDM para tornar mais seguro o acesso às redes corporativas. "Do ano passado para cá, muitas empresas começaram a abrir os olhos para a importância de ter o controle sobre a proliferação de aparelhos pessoais móveis", diz Pereira. 

O fato é que gerenciar diversos tipos de equipamentos particulares é complicado mesmo. "A maioria das empresas ainda prefere comprar um único tipo de aparelho para os funcionários",  diz Deriva, da Navita.  "Quando dão início a alguma flexibilidade, começam oferecendo um número bastante limitado de dispositivos considerados aceitáveis para uso".  

É o caso da construtora paulista Lock Engenharia. Há dois anos, a empresa passou a distribuir tablets Android para os 150 engenheiros que ficam espalhados pelas obras tocadas em São Paulo e no Rio de Janeiro. "É o aparelho que o nosso suporte técnico estava preparado para gerenciar", diz Eduardo Menezes, de 38 anos, sócio da Lock.

No ano passado, alguns funcionários pediram para usar seus próprios iPads no lugar do Android. "Fizemos adaptações em nossa rede e acabamos cedendo", diz Menezes. O argumento dos funcionários foi bastante simples. "Eles disseram que já estavam acostumados com o sistema da Apple e que a produtividade deles cairia se fossem proibidos de usá-lo", diz Menezes. 

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