Como esta família mantém seu restaurante — e sua sociedade — há 30 anos
O Nagayama foi criado em 1988. Mario Nagayama e sua família refletem sobre como fazem o restaurante e sua convivência empresarial darem certo
Mariana Fonseca
Publicado em 26 de dezembro de 2018 às 06h00.
Última atualização em 26 de dezembro de 2018 às 06h00.
São Paulo - Quando os irmãos Mario eCecíliaNagayama quiseram abrir seu próprio restaurante japonês, em 1988, escolheram um nome qualquer. Mas os agricultores Teru e Hachiro Nagayama, seus pais, pediram que o local carregasse o nome da família. Era uma grande responsabilidade - e um alerta de que os filhos deveriam colocar todos os seus esforços em fazer o negócio dar certo.
Assim nasceu o Nagayama. Se depender da família, o restaurante japonês cumprirá o que seu nome promete: ser uma “montanha eterna”. O negócio acabou de completar 30 anos, expandindo para nove unidades, com diferentes estilos de restaurante, e mais de 250 funcionários.
Ao ser perguntado sobre os novos projetos do Nagayama, Mario responde que quer passar outros 30 anos à frente do restaurante. Ao mesmo tempo, prepara o filho e o sobrinho para uma futura sucessão da empresa familiar.
Início e crescimento
Mario trabalhou durante três anos em Miami (Estados Unidos), incluindo trabalhos em lanchonetes e restaurantes japoneses. Aos 20 anos de idade, voltou ao Brasil. Mudou-se comCecília,irmã historiadora e tradutora, para São Paulo.
Mario queria montar um comércio e resolveu aproveitar tanto sua experiência e ascendência japonesa quanto a falta de restaurantes japoneses em seu bairro, o Itaim Bibi. Com a ajuda financeira dos pais, o Nagayama nasceu em 1988.
Havia apenas quatro mesas e um balcão, com sushis e sashimis preparados pelo próprio fundador.No começo, Mario eCecíliafaziam de tudo: compras dos ingredientes, idas ao banco, anotações de pedidos, preparo das comidas e cobranças de contas. A esposa de Mario,Mirian, também se uniu ao negócio.
Pouco tempo depois, surgiram dois funcionários para o horário de almoço. De lá para cá, o grupo Nagayama possui mais de 250 empregados espalhados por seus nove estabelecimentos. Apenas no Itaim, o primeiro Nagayama divide espaço com o mais sofisticado e contemporâneo Naga e o mais simples Nagayama Café. O grupo também possui um Nagayama no bairro paulista Consolação e outro Naga na Barra da Tijuca (Rio de Janeiro).
Como sobreviver às crises
Vinte dos mais de 250 membros estão no primeiro Nagayama. Já foram 28, mas ter uma força de trabalho enxuta é essencial para um restaurante sobreviver aos momentos de crise, diz Mario. Em compensação, o salário e as condições de trabalho devem agradar.
“Vejo uma briga entre patrão e empregado nesse ramo de restaurantes, gerando uma alta evasão. Acho que você tem de confiar na sua equipe e dar condições para que eles construam um patrimônio em longo prazo”, diz Mario.
O cuidado deve se refletir na arquitetura dos restaurantes, desde um gerador próprio até uma equipe pronta para consertar o ar condicionado. Outro ponto crucial é estabelecer uma boa central de compras dos ingredientes. O fundador não faz mais a aquisição dos peixes frescos, mas repassou a atividade a um funcionário de confiança.
Uma última dica de Mario é investir em pesquisa, inclusive com idas a estabelecimentos no exterior. Dessas viagens surgiram decorações inspiradas nos restaurantes japoneses de Nova York, da arquitetura à escolha das músicas, e os conceitos do Naga e do Nagayama Café. Há dois anos, o grupo Nagayama decidiu apostar no potencial das redes sociais e já criou o próprio Instagram.
Há uma linha tênue, porém, entre prestar atenção nas preferência de consumidores globalizados e exigentes e, ao mesmo tempo, manter os princípios que catapultaram seu restaurante ao patamar atual.
“Eu digo que o restaurante tem que continuar tendo alma. É algo que vai além dos essenciais de qualidade do atendimento e dos produtos, e que o cliente consegue sentir. Sinto que a alma do Nagayama vem dos meus pais”, diz Mario. O Nagayama original é um espaço intimista, de 40 lugares e com um balcão de frente aos sushimen, e está na sua terceira geração de clientes. Continuam os móveis de madeira clara, os tatames e os pratos mais pedidos: os peixes atum, buri, salmão e carapau; o crustáceo centolla; e pratos quentes como teishoku, tempura, teppanyaki e sukiyaki.
Sucessão e empresas familiares
A família prepara para fevereiro de 2019 a abertura de um Nagayama no estilo de bar japonês, com drinks e pratos como ostras e robatas (espécie de espetinhos orientais). Enquanto o ticket médio no Nagayama original é de 165 reais, o bar deverá ter uma conta de 70 a 80 reais por pessoa.
O filho e o sobrinho de Mario devem tomar as rédeas da operação, em um exercício para uma futura sucessão. Como saber se eles seguirão a experiência da geração anterior? “Conversamos sempre e damos nosso exemplo. É tudo que podemos fazer.”
Será mais um teste para a família Nagayama provar que negócios familiares podem dar certo. “No Japão é um modelo comum. Mexemos com pessoas, e nesse sentido vemos a empresa familiar como uma estratégia interessante de relacionamento.”
Com tantos investimentos, das pesquisas à expansão e valorização de funcionários, não dá para tirar margens polpudas. Para Mario, nessa hora vale aplicar as filosofias japonesas de pensar a longo prazo e não dar um passo maior do que a perna. “O desejo por dinheiro pode se tornar uma prisão”, sintetiza. A tranquilidade monetária um dia chegará - nem que demore 30, talvez 60, anos.