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Mercado vê uso político de estatais em leilão do rio Madeira

Consórcio vencedor do leilão da usina Santo Antonio, no Rio Madeira, é encabeçado pela estatal Furnas e ofereceu deságio de 35% no preço da energia

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.

As ações do setor elétrico despencaram com o resultado do leilão da usina hidrelétrica de Santo Antonio, a primeira a ser licitada no completo do Rio Madeira, nesta segunda-feira (10/12). Venceria o leilão quem apresentasse a menor tarifa para o mercado cativo - aquele formado pelas distribuidoras de energia. O consórcio vitorioso, liderado pelo grupo Odebrecht e pela estatal Furnas, apresentou uma tarifa de 78,90 reais por megawatt/hora. O preço significou um deságio de 35% em relação ao teto estabelecido pelo governo, de 122 reais. O mercado, que apostava em um preço final entre 100 e 110 reais, foi pego de surpresa, e viu indícios de influência política no resultado. "A oferta, em nossa visão, sofreu uma clara pressão do governo para baixar o preço da energia no longo prazo", afirma um relatório da corretora Ativa.

O reflexo do descontentamento dos investidores em relação ao resultado do leilão foi a queda generalizada dos papéis do setor elétrico na bolsa de valores. Por volta das 16h10, as ações preferenciais da Cemig - que também compõe o consórcio vencedor do leilão, com 10% de participação - caíam 3,09%; e as preferenciais da Cesp (CESP6) recuavam 1,55%. O papel mais castigado, porém, é o da Eletrobrás: suas ações ordinárias caíam 4,83%, e as preferenciais, 3,98%. A estatal controla a Furnas Centrais Elétricas, que detém 39% do consórcio Madeira Energia, o vencedor do leilão de hoje.

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"O resultado é muito ruim para a Eletrobrás, mas é especialmente negativo para o setor elétrico e para a economia, na medida que o modelo do setor elétrico ainda não se traduz em um setor dinâmico de competição saudável", conclui a Ativa.

O diretor do Centro Brasileiro de Infra-estrutura, Adriano Pires, também vê o resultado com cautela. "Podemos estar diante de um caso de populismo tarifário", diz.

A região Norte do país, onde serão implantadas as usinas de Santo Antonio e Jirau - a segunda do Complexo do Madeira - é a que detém o maior potencial inexplorado de energia hidrelétrica. Sendo a última fronteira hidrelétrica do Brasil, o preço da energia praticado nos projetos que serão implantados por lá tem reflexos para todas as geradoras. "Se os projetos sinalizam preços baixos, é um indicativo para todos os geradores. O preço menor tem impacto no fluxo de caixa das empresas", diz Diego Núñez, analista de energia da corretora Brascan.

Difícil de fechar

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, avalia que o investimento necessário à construção da usina de Santo Antonio é de 9,5 bilhões de reais. A conta é bem semelhante aos 10 bilhões de reais estimados pelo diretor da Odebrecht Investimentos em Infra-estrutura, Irineu Meireles.

A construção das usinas do Madeira receberão atenção especial do governo, pois foi incluída no Pacote de Aceleração do Crescimento (o famoso PAC), e contarão com condições diferenciadas de financiamento - juros de TJLP mais 0,5% ao ano; prazo de 20 anos para amortização, com carência de 1 ano; além de possibilidade de financiar 70% da obra pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Apesar de todas as facilidades, o preço oferecido pelos vencedores para o mercado cativo - 78,90 reais por megawatt/hora - torna a conta difícil de fechar, segundo os especialistas. No geral, os analistas costumam trabalhar com taxas de retorno real (que já desconta a inflação) de 12% a 15% para projetos de geração de energia. Essa taxa, aplicada ao leilão de hoje, permitiria que o preço da energia saísse por 100 a 110 reais por megawatt/hora no mercado cativo.

O governo permitiu também que 30% da energia gerada fosse negociada pelo consórcio no mercado livre - aquele composto por grandes consumidores industriais, como mineradoras, siderúrgicas e fabricantes de alumínio. Para se ter uma taxa de retorno de 15%, a energia no mercado livre ficaria em 180 reais por megawatt/hora. Se a taxa caísse para 12%, o valor ficaria em 142 reais, segundo cálculos do Centro Brasileiro de Infra-estrutura.

Como o preço no mercado cativo foi bem baixo, há duas alternativas: ou os vencedores cobrarão muito alto pela energia no mercado livre, para manter uma taxa de retorno razoável; ou abriu mão da taxa de retorno para garantir o leilão. "Está difícil de fechar a conta. Nessas condições, pode haver até dificuldade para encontrar quem financie o projeto", diz Pires, do Centro Brasileiro de Infra-estrutura. "Nossa expectativa era de que o consórcio vencedor oferecesse um preço de 100 reais no mercado cativo, para poder cobrar até 130 no mercado livre", afirma. O segundo colocado no leilão - o grupo composto pela Suez e Eletrobrás, ofereceu um lance de 98 reais por megawatt/hora no mercado cativo. O terceiro consórcio, formado pela Camargo Correa, Chesf, CPFL e Endesa, chegou a 94 reais.

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