Como o Brasil pode se tornar autossuficiente em GLP (gás de cozinha)
Segundo estudo da Gas Energy, o pré-sal tem potencial para quadruplicar a oferta do insumo - considerado item de segurança energética- nos próximos dez anos
Juliana Estigarribia
Publicado em 16 de junho de 2020 às 06h00.
Última atualização em 16 de junho de 2020 às 09h20.
Considerado um item de segurança energética, o gás liquefeito de petróleo (GLP), conhecido popularmente como gás de cozinha, frequentemente fica em evidência: quando o preço ao consumidor sobe ou se há algum risco de desabastecimento.
Recentemente, o tema veio à tona com a declaração do presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, que alertou para o risco de desabastecimento de gás de cozinha caso houvesse aumento de imposto sobre a gasolina, um pleito do setor de etanol em meio à queda do consumo ocasionada pela pandemia do novo coronavírus.
Se a estatal reduz os volumes do combustível, também diminui o escoamento de GLP, porque ambos estão na mesma fase de produção.
O mercado doméstico depende de importações para atender a sua demanda, mas o pré-sal pode tornar o Brasil autossuficiente no insumo pelos próximos dez anos, segundo estudo da consultoria Gas Energy. No entanto, a expansão da infraestrutura do setor é o principal desafio para atingir esse objetivo.
O GLP tem um peso social muito grande no Brasil: cerca de 75% do consumo vem de residências. Atualmente, a produção é concentrada na Petrobras, que fabrica o insumo em suas refinarias.
“Com os desinvestimentos de algumas das refinarias da Petrobras, o GLP pode até perder espaço, a depender da estratégia a ser adotada pelos novos operadores”, afirma Rivaldo Moreira Neto, presidente da Gas Energy.
Atualmente, as refinarias da estatal respondem por cerca de 3,7 milhões de toneladas/ano de produção do GLP e, a importação, por 2,5 milhões de toneladas. Com a expansão da produção no pré-sal, o país tem potencial para atingir 10 milhões de toneladas em 2030, o suficiente para atender a todo o consumo nacional, que é de aproximadamente 7 milhões de toneladas por ano.
Neto explica que, historicamente, o gás natural produzido no Brasil era “pobre” em substâncias que compõem o GLP: propano e butano. Mas o gás do pré-sal é rico nessas substâncias, o que favorece a produção local do gás de cozinha.
Para elevar a oferta de GLP, entretanto, as operadoras dos campos do pré-sal precisariam levantar unidades de processamento de gás natural (UPGNs), cujos investimentos são muito altos. O gás extraído em alto-mar é trazido por meio de uma estrutura própria para a costa, onde é processado.
Além disso, as empresas também demandam mais clareza acerca da regulação do setor para distribuição de gás, que hoje é concentrada majoritariamente na Petrobras. Neto acrescenta que, historicamente, houve dúvidas sobre a ingerência do governo sobre os preços do GLP, por se tratar de um item de segurança energética.
“O maior desafio para expandir a oferta a partir do pré-sal é contratar demanda em volume e prazo suficiente para justificar um investimento que de fato é alto para levar o gás até a costa”, diz Neto.
Oportunidades x riscos
Com a venda de refinarias da Petrobras, há dúvidas sobre a garantia de oferta de GLP no mercado nacional. Neste sentido, o investimento em infraestrutura de escoamento do gás do pré-sal é de suma importância.
A produção no pré-sal vem acompanhada de um grande volume de gás associado e as operadoras não têm conseguido reinjetar todo o insumo, uma vez que não há infraestrutura suficiente para dar vazão à enorme quantidade de gás.
“Em última instância, se não há como escoar o gás, a produção de petróleo também pode ficar comprometida”, diz Neto.
Por outro lado, se houver uma expansão da oferta de GLP, o Brasil pode até exportar o insumo. Hoje, o mercado global é liderado pelos Estados Unidos e pelo Catar.
As projeções levam em conta principalmente os campos já em desenvolvimento, além de áreas em exploração no pré-sal já arrematadas nos leilões conduzidos pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
"Garantindo segurança energética, o país pode sair da condição de importador para exportador de GLP", pondera Neto.