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"Não faz sentido gastar bilhões para combater a mudança climática"

Para seguir os preceitos do Protocolo de Kyoto, países e empresas de todo o mundo vão gastar 150 bilhões de dólares por ano. Para o polêmico cientista político dinamarquês Bjorn Lomborg, além de inútil, fazer isso é burrice

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

O cientista político dinamarquês Bjorn Lomborg costuma provocar arrepio nos ambientalistas mais ortodoxos. Professor adjunto da Escola de Administração de Copenhague, ele lançou no final de 2007 o livro Cool It - The Skeptical Environmentalist's Guide to Global Warming (em português, algo como "Calma lá - o guia do ambientalista cético para o aquecimento global").

A obra é uma espécie de libelo contra a tese vigente de que as emissões de carbono devem ser reduzidas a qualquer custo em prol da sobrevivência do planeta. Lomborg não nega o aquecimento global. Questiona, porém, se empresas e governos deveriam mesmo gastar bilhões de dólares para combatê-lo quando tantos problemas prementes, como fome e doenças tropicais, ainda assolam o mundo. De seu escritório, na Dinamarca, ele concedeu a seguinte entrevista a EXAME.

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A sensação que temos ao ler o livro é que estamos vivendo uma espécie de histeria. O senhor acha isso mesmo?
Há um pânico generalizado sobre o aquecimento global porque as pessoas acreditam que ele é um perigo imediato e absoluto. E estamos sendo bombardeados com a informação de que, se diminuirmos as emissões de CO2 e seguirmos os termos do Protocolo de Kyoto, teremos feito o bastante para consertar o estrago. Temos de pensar que o aquecimento global é real, é um problema, mas não é uma catástrofe. E nada que fizermos trará resultados nos próximos dez anos.

Por que o senhor diz que essa histeria é perigosa?
Quando há pânico, ficamos mais propensos a adotar soluções ruins, que farão muito pouco para resolver o problema - e que sempre terão custo muito elevado. Um exemplo desse sentimento de pânico é o etanol. Diferentemente do que ocorre no Brasil, onde é possível argumentar sobre a viabilidade do investimento no combustível, a maioria do etanol que está sendo produzido no mundo trará conseqüências ruins para o meio ambiente e fará muito pouco ou quase nada pela redução das emissões de gás carbônico. Acho moralmente questionável usarmos o milho de maneira ineficiente para suprir uma demanda do Ocidente por combustível quando tanta gente ainda morre de fome.

O economista Nicholas Stern é um grande defensor da tese de que vale a pena fazer alguma coisa sobre o aquecimento global agora porque o preço a pagar por não fazermos nada seria muito maior. O que há de errado com a tese dele?
Há muitas coisas erradas. Todos os estudos econométricos de custo-benefício mostram que fazer muito pela mudança climática não vale a pena. O artigo de Stern chega a uma conclusão bem diferente. Mas o artigo dele - que, é bom lembrar, não foi publicado cientificamente - foi uma encomenda governamental. O governo britânico queria que alguém renomado escrevesse e dissesse que sua decisão de combater o aquecimento global era correta. E foi isso que Nicholas Stern fez. Eu o conheço pessoalmente. Ele é uma pessoa inteligente, mas definitivamente queria vir a público com a resposta desejada, correta.

Mas, concretamente, em que aspectos a tese dele está errada?
Primeiro, ele superestima dramaticamente os danos do aquecimento global à economia. A maioria dos estudos econômicos mostra que os danos do clima serão de aproximadamente 3% do PIB mundial no final do século. Stern diz que será de quase 20%. Em contrapartida, ele subestima o custo de fazer alguma coisa contra o aquecimento, dizendo que esse custo é de provavelmente 1% do PIB. Estudos da ONU dizem que esse custo deve estar em algum ponto entre 3% e 5% do PIB.

Devemos então cruzar os braços e esperar para ver como o aquecimento global vai afetar o planeta?
Não, mas não precisamos despejar um caminhão de dinheiro nisso. Por exemplo, mesmo que aceitemos que os ursos polares serão negativamente afetados pelos impactos da mudança climática, o que é provavelmente verdadeiro no longo prazo, será possível fazer muito pouco para salvá-los por meio de uma política climática. Talvez consigamos salvar um urso polar por ano em uma população de 22 000. Mas, se proibíssemos a caça dos animais, salvaríamos entre 300 e 500 ursos polares por ano, de forma muito mais barata e rápida. Estamos investindo bilhões para cuidar dos problemas errados.


Como aplicar esse dinheiro?
Muitas pessoas dizem que o aquecimento global atingirá predominantemente o Terceiro Mundo, o que é verdade. Mas acho que, se você se importa com as pessoas do Terceiro Mundo, deve se perguntar o que seria melhor: reduzir um pouco o aumento da temperatura em 100 anos ou dar a essas pessoas outras oportunidades agora? Prefiro a segunda opção. Milhões de mortes ainda decorrem de doenças infecciosas facilmente tratáveis.

Podemos muito bem evitar todas essas mortes. Podemos tornar as pessoas muito mais saudáveis, muito menos desnutridas e podemos dar a elas oportunidades econômicas se lidarmos com a Aids, com a malária, com a desnutrição, e se assegurarmos o livre comércio. Essas são quatro questões muito simples, facilmente controláveis. O Protocolo de Kyoto custará cerca de 150 bilhões de dólares por ano e adiará os efeitos do aquecimento global em apenas sete dias no final do século. Não é curioso que tenhamos decidido impactar o século 21 gastando bilhões de dólares para obter resultados apenas irrisórios daqui a 100 anos? A ONU estima que com cerca de 75 bilhões de dólares seria possível resolver os principais problemas do mundo: água potável, saneamento básico, saúde e educação.

Por que não há muita gente pensando como o senhor?
Estamos simplesmente nos esquecendo de ser inteligentes porque, não importa qual seja a pergunta, parece haver apenas uma única resposta: corte as emissões de carbono. E há algo de errado em uma conversa quando a resposta para todas as perguntas é dada de antemão. Essa pode ser a resposta certa, sim, mas, com certeza, não é sempre a resposta correta.

O senhor não acha que todo esse barulho em torno da questão ambiental, por tabela, impulsiona melhorias sociais? Um exemplo: no Brasil, empresas de distribuição de energia elétrica estão financiando ou doando refrigeradores novos à população carente de maneira que ela passe a consumir menos energia.
Não tenho dúvida de que as pessoas que receberam as geladeiras estão em uma situação melhor do que estavam antes. A pergunta é se essa é a melhor coisa que poderia ser feita com esse dinheiro. Não conheço a fundo os problemas brasileiros, mas suponho que o fato de as pessoas terem geladeiras velhas que consomem muita energia não seja um dos maiores problemas do país. Talvez fosse melhor investir esse dinheiro na melhoria da educação, da saúde, para tirar as pessoas da rua e para reduzir a injustiça social.

Muitas empresas estão economizando dinheiro ao diminuir suas emissões de CO2. Um exemplo são as companhias que estão substituindo combustíveis fósseis por biomassa para manter suas fábricas funcionando. Ou seja, não é sempre que os esforços para diminuir a emissão de gases tóxicos têm custo elevado e pouco benefício, não é mesmo?
Definitivamente, não. Mas o ponto a que devemos atentar nessa questão é que, se há empresas que economizam implantando alguma política ambiental, elas poderiam ter feito essa mudança de qualquer modo - como resultado de uma boa gestão, e não por causa da histeria em torno do tema. Uma das coisas mais negligenciadas hoje é que todo ano empresas e economias no mundo reduzem cerca de 1% a quantidade de CO2 emitido na produção. Até determinado ponto, esses cortes serão vantajosos para as empresas. Mas, a partir do momento em que seja necessário fazer cortes realmente agressivos, que exijam investimento alto e pouco retorno financeiro, as companhias vão preferir colocar seu dinheiro em outra coisa.

O que o senhor faz pessoalmente pela diminuição de emissão de carbono?

Tenho opções inteligentes em relação a isso. Troco minhas lâmpadas quando posso. Ando de bicicleta. Mas a pergunta deveria ser: o que eu faço para melhorar o planeta? Uso meu dinheiro para ajudar o mundo, mas, em vez de gastar para neutralizar emissões de carbono, que tem impacto reduzido, prefiro gastar na Cruz Vermelha, cujo trabalho impacta realmente muita gente.

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