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O desafio de não deixar pegadas

Maior fabricante de celulares do mundo, a Nokia está à frente de uma disputada corrida pela reciclagem de equipamentos descartados

EQUIPAMENTOS USADOS DA NOKIA: A EMPRESA RECICLA 2% DOS APARELHOSDESCARTADOS TODOS OS DIAS (.)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

Poucos aparelhos eletrônicos se tornaram tão descartáveis quanto o celular. Hoje, cerca de 3 bilhões de pessoas - o equivalente à metade da população do planeta - têm uma linha móvel. Em média, essa multidão troca o aparelho em até dois anos. O descarte acelerado desses equipamentos representa um dos problemas ambientais mais graves da atualidade.

Uma pesquisa da americana ReCellular, uma das maiores recicladoras de celulares do mundo, mostra que mais de 100 milhões de aparelhos são descartados por ano. Esse volume equivale, considerando o peso médio de 130 gramas por celular, a 13 000 toneladas de placas, circuitos, plásticos e baterias com substâncias tóxicas como PVC, além de metais pesados como chumbo, lítio e cromo. Com a crescente pressão de ONGs e dos próprios consumidores, a capacidade de não deixar (ou pelo menos diminuir) essas pegadas no meio ambiente se tornou a mais nova base de competição entre as grandes fabricantes de celulares. Além de lançar o modelo mais fino, leve, colorido, funcional e inovador, essas empresas agora correm para criar os equipamentos mais verdes do mercado - que consomem menos energia e possuem menos materiais tóxicos e mais peças recicláveis.

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Por trás dessa corrida existe uma mudança radical na maneira como as empresas pensam e estruturam seu negócio - desde a concepção dos produtos até a criação de novos caminhos para trazê-los de volta, num movimento conhecido como logística reversa. A pioneira nesse campo é a finlandesa Nokia, maior fabricante de celulares do mundo, com vendas de 57 bilhões de dólares em 2007. O pontapé inicial em seu programa de reciclagem aconteceu em 1995, com uma então tímida iniciativa de coletar aparelhos em lojas de assistência técnica - antes mesmo que existisse uma legislação a esse respeito. (A fabricante de celulares americana Motorola, por exemplo, iniciou a coleta de aparelhos usados em 2004.) Hoje, até 80% de um celular Nokia pode ser reciclado, 15 pontos percentuais acima da atual norma da União Européia, a mais rigorosa e avançada do mundo.

A empresa estima que é responsável pela coleta de 2% dos celulares de todas as marcas descartados anualmente - algo como 2 milhões de aparelhos (parte do material reciclado é reaproveitada pela própria empresa e o restante é vendido a terceiros). Num levantamento trimestral realizado pela ONG Greenpeace desde agosto de 2006, a Nokia foi a primeira colocada em todas as edições. (A única exceção ocorreu na pesquisa realizada em dezembro de 2007, na qual a fabricante perdeu a liderança para as concorrentes Sony Ericsson e Samsung porque a ONG não conseguiu devolver aparelhos da marca em cinco países: Argentina, Filipinas, Índia, Rússia e Tailândia.) "É um movimento que envolve diversas áreas da empresa e concentra cada vez mais esforços", diz o finlandês Markus Terho, diretor mundial de relacionamento ambiental da Nokia. "O levantamento do Greenpeace nos motivou a fazer uma auditoria para avaliar padrões e definir as necessidades de treinamento."


Uma das etapas mais críticas para fazer a estratégia verde dar certo é uma preocupação absolutamente inédita para essas fabricantes - convencer os consumidores a devolver os aparelhos em vez de eles simplesmente colocá-los na gaveta ou jogá-los no lixo. "Trata-se de uma variável fundamental que está fora dos muros das empresas e por isso é mais difícil de controlar", diz André Carvalho, professor da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, especialista em logística reversa.

A Nokia não divulga o investimento para estimular o retorno de aparelhos, mas hoje realiza campanhas em países da Europa, da América do Norte e da Ásia. Mais recentemente, a companhia intensificou a atenção aos países asiáticos, uma das regiões do mundo onde o consumo de aparelhos mais cresce. (No ano passado, as vendas da Nokia na Ásia cresceram mais de 40%.) Uma de suas primeiras campanhas na região foi lançada em dezembro de 2005, na China, em parceria com a Motorola e a China Mobile, maior operadora do mundo, com 360 milhões de clientes. Cada aparelho devolvido à operadora dava direito a minutos de ligações e créditos para envio de mensagens por celular. Só nos dois primeiros meses, mais de 30 000 celulares foram recolhidos e, no ano seguinte, a parceria foi ampliada para incluir Panasonic, NEC e fabricantes chineses. "Neste momento estamos com uma campanha na Indonésia em que plantamos uma árvore para cada celular retornado", diz Terho, que coordenou o plantio de 100 000 mudas de árvores nativas. No Brasil, a Nokia nunca realizou uma campanha. Segundo Terho, a companhia está articulando a primeira delas em parceria com operadoras de telefonia do país.

A ampla rede de distribuição e assistência técnica da Nokia, com mais de 4 000 lojas em todos os 85 países em que atua, é um trunfo para ampliar a escala de coleta, mas ao mesmo tempo a torna mais complexa. (Para aumentar ainda mais o escopo de sua coleta e reduzir os custos fixos da logística reversa, a Nokia não faz restrição de marca para receber aparelhos usados, ao contrário de suas concorrentes.) Tão difícil quanto fazer o consumidor entregar seu celular usado para reciclagem é garantir que os postos de coleta de aparelhos operem de maneira eficiente. Essa é também a parte mais cara de todo o processo. Estima-se, por exemplo, que as empresas instaladas nos países da União Européia invistam até 600 milhões de euros por ano na coleta de equipamentos.


Apesar do pioneirismo, a Nokia começa a enfrentar dificuldades para se manter na dianteira da corrida pelo desenvolvimento de produtos verdes. Um de seus mais recentes lançamentos, o Nokia 3110 Evolve, que chegou ao mercado em novembro do ano passado, tem uma estrutura plástica feita de matéria-prima orgânica que garante a possibilidade de reciclar mais de 50% do produto. A Sony Ericsson lançou na mesma época um modelo com percentual semelhante de materiais recicláveis - mas com uma bateria que funciona por mais tempo. "Agora, estamos estudando como atingir 100% de biomaterial nesse plástico", afirma Terho, que planeja usar o produto em outros lançamentos da empresa ainda neste ano.

Entre as melhores do mundo
A Nokia teve de repensar alguns dos aspectos mais relevantes de seu negócio para montar seu programa de reciclagem de aparelhos

1. PROMOÇÃO
Para estimular a devolução de aparelhos usados, a Nokia oferece uma gama de incentivos — desde créditos para ligações, em parceria com operadoras, até o plantio de árvores por produto retornado. Já foram plantadas 100 000 mudas de árvores nativas na Indonésia. Neste ano, a companhia dará desconto na compra de um aparelho novo na Europa e na Ásia.

2. LOGÍSTICA
A Nokia recolhe celulares usados, de qualquer marca, nos 85 países em que tem escritórios e fábricas. Para isso, conta com uma rede de mais de 4 000 assistências técnicas.A empresa estima recolher 2% dos celulares descartados pelos clientes.

3. PRODUÇÃO
Hoje, entre 65% e 80% das peças dos celulares da Nokia podem ser recicladas — percentual que varia de acordo com o modelo. Há uma década, apenas um terço das peças era reciclado. O material também pode ser reaproveitado em outras indústrias. Os metais, por exemplo, viram jóias e material de construção.

fonte: empresa

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