No Brasil, pessoas pagam mais IR que empresas
Carga tributária das companhias brasileiras é bastante elevada, mas, ao menos em relação ao IR, as pessoas físicas podem sofrer ainda mais com a taxação
Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2011 às 15h13.
São Paulo – Nos últimos meses, as declarações do bilionário Warren Buffett de que o sistema tributário americano era injusto causaram grande polêmica. O investidor fez as contas e chegou à conclusão que o governo ficava com 17% de seus ganhos enquanto seus funcionários, na média, pagavam impostos equivalentes a 36%. A distorção era gerada pelo fato de a renda dos investimentos ser taxada com uma alíquota menor, o que beneficia diretamente quem já detém o capital – ou seja, os mais ricos.
Ainda que no Brasil o governo não forneça dados suficientes para que seja realizado um estudo que mostre a alíquota efetiva de impostos que são pagos por cada classe, existem diversos indícios de que as pessoas físicas são proporcionalmente muito mais tributadas que as empresas.
A distorção aparece pouco porque a Receita Federal estipulou quatro alíquotas para a cobrança do Imposto de Renda Pessoa Física no Brasil: 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. Estão isentos apenas os rendimentos mensais inferiores a 1.499,16 reais. Acima desse valor, quanto mais uma pessoa ganha, maior a alíquota do IR. Aparentemente, portanto, o sistema é mais duro com os ricos e garante a Justiça tributária.
Mas as aparências enganam. O problema do sistema brasileiro é que as pessoas físicas pagam muito mais IR do que empresários e empresas. Isso acontece não porque a carga tributária das empresas seja baixa. É o IR dos assalariados que é ainda maior. O base para o cálculo do Imposto de Renda para os trabalhadores brasileiros é praticamente todos os rendimentos recebidos enquanto a alíquota para as pessoas jurídicas incide apenas sobre o lucro líquido (já descontadas, portanto, as despesas com a fabricação de produtos ou a oferta de bens, diversas obrigações financeiras como o pagamento de juros e custos com marketing ou administrativos).
Dessa forma, ainda que a alíquota de IR mais CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) das empresas alcance 32% enquanto o IR das pessoas físicas nunca supere 27,5%, é sobre os trabalhadores que recaem os maiores encargos.
Um estudo do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) mostra que a alíquota efetiva de IR paga pelas pessoas físicas alcança 9,2% da renda anual. A alíquota não é igual para todos os brasileiros. De acordo com o Sindifisco, quem recebia entre 10 e 15 salários mínimos arcava com uma alíquota efetiva de 6,6%, de 15 a 20 era de 10,6%, de 20 a 30 chegava a 14,2% e acima de 30 mínimos o IR comia 21,45% dos rendimentos totais.
O levantamento foi realizado há cinco anos e não pode ser atualizado porque a Receita Federal deixou de divulgar os dados necessários para o cálculo. “Esses números devem ter mudado bastante a partir de 2009, quando houve um aumento no número de alíquotas do IRPF de dois para quatro. Mas o estudo serve para mostrar que, entre pessoas físicas, a progressividade do sistema funciona”, diz Alvaro Luchiezi Jr., do Departamento de Estudos Técnicos do Sindifisco. A principal crítica ao sistema é que ele seria ainda mais justo se houvesse ao menos 10 alíquotas de IR, que subiriam progressivamente de acordo com a renda.
Para especialistas, no entanto, a grande injustiça do sistema ocorre quando se compara o peso do IR entre pessoas físicas e empresas. Não é possível estabelecer uma alíquota efetiva de IR sobre o faturamento das pessoas jurídicas uma vez que o imposto é cobrado somente sobre o lucro.
Uma forma de verificar como o IR das empresas é menor é olhar para aquelas que recolhem tributos pelo Simples, um sistema simplificado de pagamento de impostos para pequenos negócios.
No setor de serviços, por exemplo, uma empresa que fatura até 120.000 reais vai pagar 4,5% das receitas em tributos pelo Simples. Já para empresas com faturamento de 120.000 a 240.000 reais, a alíquota chega para 6,54%. Os percentuais crescem paulatinamente até chegar a 16,85% para as empresas com receitas entre 2,28 milhões e 2,4 milhões de reais.
Não são apenas os percentuais cobrados que são menores que os das pessoas físicas. É importante notar que as empresas que recolhem tributos pelo Simples já estarão quitando todas suas obrigações tributárias. Já os trabalhadores ainda terão de arcar com outros impostos diretos e indiretos cobrados sobre a compra e a posse de bens ou a contratação de serviços.
Outra sutileza interessante é que, se a pessoa física que é proprietária de uma empresa quiser retirar dividendos para si mesmo do caixa da companhia, a transferência desses recursos da pessoa jurídica para a pessoa física não será tributada. “O recebimento de dividendos entra na declaração de IR do empresário como um rendimento isento e não-tributável”, diz Felipe Lückmann Fabro, tributarista do Gasparino Advogados, um escritório especializado em planejamento financeiro.
A tributação dos dividendos é um ponto bastante polêmico no mundo empresarial. Muitos especialistas acreditam que seria justo que o empresário pagasse impostos sobre o dinheiro que recebe da empresa de sua propriedade, uma vez que a carga sobre as firmas é menor que sobre as pessoas físicas.
Outros contadores e advogados alertam que haveria uma bitributação, uma vez que a companhia já recolheu os impostos devidos ao governo durante todo o ciclo produtivo. Além disso, a empresa leva vantagem sobre a pessoa física quando se olha para o Imposto de Renda isoladamente. Considerando outros impostos, como IPI, ICMS, ISS e contribuições sociais ou incidentes sobre a folha de pagamento, a balança pode mudar de lado.
Basta imaginar que um empregado que ganha um salário mensal de 10.000 reais, por exemplo, custa 20.000 reais para a empresa devido ao excesso de tributos incidentes sobre a folha de pagamento. Sobretaxar ainda mais as empresas em favor das pessoas físicas poderia desestimular o empreendendorismo.
Planejamento tributário
A percepção de que as empresas pagam menos impostos do que as pessoas físicas no Brasil leva muita gente a abrir uma firma apenas com a intenção de pagar menos impostos. Um bom exemplo é o das pessoas que possuem alguns imóveis e vivem da renda do aluguel. Enquanto as pessoas físicas pagam um Imposto de Renda correspondente a até 27,5% de todas as receitas obtidas com os aluguéis, uma holding que concentre esses imóveis poderia sofrer uma tributação equivalente a 13% ou 14%, diz Fabro, do Gasparino Advogados.
Nem sempre essa operação é interessante. A alíquota efetiva sobre uma holding imobiliária varia de acordo com o volume de receitas. Muitos municípios praticamente já bloqueiam esse tipo de operação com a cobrança do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na transferência do imóvel para uma empresa com o mesmo dono quando a principal fonte de recursos dessa firma são os aluguéis. “O custo do ITBI e da escritura pode chegar a 5% do valor de um imóvel e muitas vezes inviabilizar o negócio”, diz Fabro.
Pessoas que já estão pensando na sucessão, entretanto, têm outra vantagem na opção pela constituição de uma holding imobiliária. Quando o dono da empresa morre, o imóvel continua a fazer parte do patrimônio da empresa e não é necessário inclui-lo no inventário. Também não é preciso pagar o Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre o valor do imóvel. Em alguns casos, esse imposto permite que o governo fique com 7% de tudo que alguém acumulou durante a vida.
São Paulo – Nos últimos meses, as declarações do bilionário Warren Buffett de que o sistema tributário americano era injusto causaram grande polêmica. O investidor fez as contas e chegou à conclusão que o governo ficava com 17% de seus ganhos enquanto seus funcionários, na média, pagavam impostos equivalentes a 36%. A distorção era gerada pelo fato de a renda dos investimentos ser taxada com uma alíquota menor, o que beneficia diretamente quem já detém o capital – ou seja, os mais ricos.
Ainda que no Brasil o governo não forneça dados suficientes para que seja realizado um estudo que mostre a alíquota efetiva de impostos que são pagos por cada classe, existem diversos indícios de que as pessoas físicas são proporcionalmente muito mais tributadas que as empresas.
A distorção aparece pouco porque a Receita Federal estipulou quatro alíquotas para a cobrança do Imposto de Renda Pessoa Física no Brasil: 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. Estão isentos apenas os rendimentos mensais inferiores a 1.499,16 reais. Acima desse valor, quanto mais uma pessoa ganha, maior a alíquota do IR. Aparentemente, portanto, o sistema é mais duro com os ricos e garante a Justiça tributária.
Mas as aparências enganam. O problema do sistema brasileiro é que as pessoas físicas pagam muito mais IR do que empresários e empresas. Isso acontece não porque a carga tributária das empresas seja baixa. É o IR dos assalariados que é ainda maior. O base para o cálculo do Imposto de Renda para os trabalhadores brasileiros é praticamente todos os rendimentos recebidos enquanto a alíquota para as pessoas jurídicas incide apenas sobre o lucro líquido (já descontadas, portanto, as despesas com a fabricação de produtos ou a oferta de bens, diversas obrigações financeiras como o pagamento de juros e custos com marketing ou administrativos).
Dessa forma, ainda que a alíquota de IR mais CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) das empresas alcance 32% enquanto o IR das pessoas físicas nunca supere 27,5%, é sobre os trabalhadores que recaem os maiores encargos.
Um estudo do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) mostra que a alíquota efetiva de IR paga pelas pessoas físicas alcança 9,2% da renda anual. A alíquota não é igual para todos os brasileiros. De acordo com o Sindifisco, quem recebia entre 10 e 15 salários mínimos arcava com uma alíquota efetiva de 6,6%, de 15 a 20 era de 10,6%, de 20 a 30 chegava a 14,2% e acima de 30 mínimos o IR comia 21,45% dos rendimentos totais.
O levantamento foi realizado há cinco anos e não pode ser atualizado porque a Receita Federal deixou de divulgar os dados necessários para o cálculo. “Esses números devem ter mudado bastante a partir de 2009, quando houve um aumento no número de alíquotas do IRPF de dois para quatro. Mas o estudo serve para mostrar que, entre pessoas físicas, a progressividade do sistema funciona”, diz Alvaro Luchiezi Jr., do Departamento de Estudos Técnicos do Sindifisco. A principal crítica ao sistema é que ele seria ainda mais justo se houvesse ao menos 10 alíquotas de IR, que subiriam progressivamente de acordo com a renda.
Para especialistas, no entanto, a grande injustiça do sistema ocorre quando se compara o peso do IR entre pessoas físicas e empresas. Não é possível estabelecer uma alíquota efetiva de IR sobre o faturamento das pessoas jurídicas uma vez que o imposto é cobrado somente sobre o lucro.
Uma forma de verificar como o IR das empresas é menor é olhar para aquelas que recolhem tributos pelo Simples, um sistema simplificado de pagamento de impostos para pequenos negócios.
No setor de serviços, por exemplo, uma empresa que fatura até 120.000 reais vai pagar 4,5% das receitas em tributos pelo Simples. Já para empresas com faturamento de 120.000 a 240.000 reais, a alíquota chega para 6,54%. Os percentuais crescem paulatinamente até chegar a 16,85% para as empresas com receitas entre 2,28 milhões e 2,4 milhões de reais.
Não são apenas os percentuais cobrados que são menores que os das pessoas físicas. É importante notar que as empresas que recolhem tributos pelo Simples já estarão quitando todas suas obrigações tributárias. Já os trabalhadores ainda terão de arcar com outros impostos diretos e indiretos cobrados sobre a compra e a posse de bens ou a contratação de serviços.
Outra sutileza interessante é que, se a pessoa física que é proprietária de uma empresa quiser retirar dividendos para si mesmo do caixa da companhia, a transferência desses recursos da pessoa jurídica para a pessoa física não será tributada. “O recebimento de dividendos entra na declaração de IR do empresário como um rendimento isento e não-tributável”, diz Felipe Lückmann Fabro, tributarista do Gasparino Advogados, um escritório especializado em planejamento financeiro.
A tributação dos dividendos é um ponto bastante polêmico no mundo empresarial. Muitos especialistas acreditam que seria justo que o empresário pagasse impostos sobre o dinheiro que recebe da empresa de sua propriedade, uma vez que a carga sobre as firmas é menor que sobre as pessoas físicas.
Outros contadores e advogados alertam que haveria uma bitributação, uma vez que a companhia já recolheu os impostos devidos ao governo durante todo o ciclo produtivo. Além disso, a empresa leva vantagem sobre a pessoa física quando se olha para o Imposto de Renda isoladamente. Considerando outros impostos, como IPI, ICMS, ISS e contribuições sociais ou incidentes sobre a folha de pagamento, a balança pode mudar de lado.
Basta imaginar que um empregado que ganha um salário mensal de 10.000 reais, por exemplo, custa 20.000 reais para a empresa devido ao excesso de tributos incidentes sobre a folha de pagamento. Sobretaxar ainda mais as empresas em favor das pessoas físicas poderia desestimular o empreendendorismo.
Planejamento tributário
A percepção de que as empresas pagam menos impostos do que as pessoas físicas no Brasil leva muita gente a abrir uma firma apenas com a intenção de pagar menos impostos. Um bom exemplo é o das pessoas que possuem alguns imóveis e vivem da renda do aluguel. Enquanto as pessoas físicas pagam um Imposto de Renda correspondente a até 27,5% de todas as receitas obtidas com os aluguéis, uma holding que concentre esses imóveis poderia sofrer uma tributação equivalente a 13% ou 14%, diz Fabro, do Gasparino Advogados.
Nem sempre essa operação é interessante. A alíquota efetiva sobre uma holding imobiliária varia de acordo com o volume de receitas. Muitos municípios praticamente já bloqueiam esse tipo de operação com a cobrança do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na transferência do imóvel para uma empresa com o mesmo dono quando a principal fonte de recursos dessa firma são os aluguéis. “O custo do ITBI e da escritura pode chegar a 5% do valor de um imóvel e muitas vezes inviabilizar o negócio”, diz Fabro.
Pessoas que já estão pensando na sucessão, entretanto, têm outra vantagem na opção pela constituição de uma holding imobiliária. Quando o dono da empresa morre, o imóvel continua a fazer parte do patrimônio da empresa e não é necessário inclui-lo no inventário. Também não é preciso pagar o Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre o valor do imóvel. Em alguns casos, esse imposto permite que o governo fique com 7% de tudo que alguém acumulou durante a vida.